Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 12 de Agosto de 2011 (proc. 7691/11)

Imprimir

Sumário:

1. A falta de indicação de termos ou condições na proposta sobre aspectos de execução do contrato subtraídos à concorrência regulados no caderno de encargos não é causa determinante de exclusão do procedimento por a situação não se subsumir na hipótese do artº 70º nº 2 b) CCP.
2. A previsão do artº 70º nº 2 b) CCP apenas se aplica a termos ou condições da proposta que expressamente estejam em desconformidade com as cláusulas do caderno de encargos que lhes digam respeito.

 

Texto Integral:

A...- A..., SA, com os sinais nos autos, inconformada com o acórdão proferido no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra dele vem recorrer, concluindo como segue:

1. Não tem aplicação ao caso em apreço o regime do preço anormalmente baixo.
2. Existem outras causas que determinam a exclusão de uma proposta, com fundamento no preço apresentado, ainda que este não seja anormalmente baixo.
3. Constitui entendimento jurisprudencial pacífico o de que o preço proposto tem que ser suficiente para suportar os custos inerentes à prestação dos serviços objecto do concurso (v.g. salários, subsídios, segurança social, seguros...), sob pena de exclusão da proposta (Acórdãos do TCA Sul de 02-06-2005, processo 00748/05 e do TCA Norte de 19-07-2007, processo 03162/06.0BEPRT).
4. Resulta do disposto nos Artºs. 11.7 e 15.1 do Programa do Concurso e nos Artºs. 9° n.° 4 e 13° do Caderno de Encargos que os concorrentes devem propor a colocação de um empregado de bar para prestar o serviço de bar no horário das 18h30 às 20h30, estimando-se que, no total do contrato (2 anos) o bar estará aberto 800 horas e devem ainda propor o preço/hora para o serviço de bar, sendo este preço um dos factores de avaliação das suas propostas (cfr. Art.° 14.3 do Programa do Concurso).
5. Se o preço proposto não é suficiente para suportar os encargos legais mínimos obrigatórios com 800 horas de serviço de um trabalhador com a categoria profissional de empregado de bar, tal como exigido pelo Caderno de Encargos, das duas uma:
- Ou o concorrente não vai cumprir o quadro de pessoal exigido pelo Artigo 13.° do Caderno de Encargos, ou o horário de funcionamento do bar estabelecido no Artigo 9.4 do Caderno de Encargos, violando este aspecto da execução do contrato não submetido à concorrência pelo Caderno de Encargos, o que constitui a causa de exclusão da proposta prevista no Art.° 70° n.° 2 al. b) do CCP;
- Ou o concorrente não suporta os encargos legais obrigatórios mínimos com o quadro de pessoal que irá afectar à prestação dos serviços, incumprindo a legislação laboral, o que constitui a causa de exclusão da proposta prevista no Art.° 70° n.° 2 al. f) do CCP.
6. Atenta a retribuição mensal mínima para os trabalhadores com a categoria profissional de Empregado de Bar, fixada no CCT celebrado entre a B...e a C...para o ano de 2009 (BTE, 1a série, n.° 25, de 8 de Julho de 2009), de 536,40€, a retribuição horária mínima é de 3,09€ (artigo 271 ° do Código do Trabalho).
7. Acrescendo a tal valor os encargos com a segurança social (cf. Art.° 3° n.° 2 do DL 199/99 de 8/6 - 3,09€ x 23,75% = 1,2375€), o preço/hora do serviço de bar terá que corresponder, no mínimo, a 3,82€ para permitir suportar os encargos legais obrigatórios mínimos.
8. Ao apresentar o preço de 800,00€ para o serviço de bar, o que corresponde a l € por hora (800€ / 800 horas de serviço), a IÇA propôs um preço insuficiente para fazer face aos encargos legais obrigatórios mínimos com o empregado de bar afecto a esse serviço
9. Pelo que a sua proposta deveria ter sido excluída, nos termos do artigo 70.° n.°2 als. b) e f) do CCP.
10. O Caderno de Encargos tem natureza regulamentar (Acórdãos do STA de 19/03/2003, processo n.° 0492/03, e de 14-01-2004, processo n.° 01383/03 e Acórdão do TC A Sul de 17-01-2008, processo n.° 03301/07) pelo que devem ser excluídas as propostas que apresentem atributos que violem os parâmetros base fixados neste ou que apresentem quaisquer termos ou condições que violem aspectos da execução do contrato a celebrar não submetidos à concorrência (artigo 70.° n.°2 al. b) do CCP).
11. Impõe o Artigo 8.° do Caderno de Encargos que o adjudicatário garanta software necessário aos pagamentos através de cartão de pré-carregamento, sendo esta, pois, uma prestação a que os concorrentes se devem obrigar.
12. Resulta da citada disposição que os concorrentes, nas suas propostas, devem indicar concretamente o software que irão utilizar, suas características e especificações, de forma a que o júri do concurso possa verificar se o software proposto cumpre ou não com as exigências constantes do Caderno de Encargos nomeadamente, se permite ou não o carregamento prévio pelos utilizadores dos cartões de código de barras, a gestão/controlo dos consumos dos utentes e a entrega ao D..., em suporte informático exportável para Excel, de uma listagem de consumos de refeições de formandos a quem o D...forneça a refeição completa gratuitamente.
13. Não basta a declaração genérica de aceitação do Caderno de Encargos feita pelo concorrente.
14. O concorrente tem que demonstrar na sua proposta que o software que irá utilizar permite atingir o fim pretendido pela entidade adjudicante.
15. Sendo a proposta da H...totalmente omissa quanto ao software a utilizar, a entidade adjudicante está impedida de verificar se este cumpre ou não as exigências do Artigo 8.° do Caderno de Encargos.
16. Assim, a proposta da H...devia ter sido excluída nos termos do disposto no Art.° 70° n.° 2 als. b) e c) do CCP.
17. Ao decidir como decidiu violou o douto Acórdão recorrido os artigos 8.° n.°4, 9.° n.°3 e 13.° do Caderno de Encargos e os artigos 70.° n.°2 al. b), c), f) e 97.° do CCP.
18. Deverá, pois, o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, a decisão recorrida ser substituída por outra que considere a acção procedente e, em consequência, anule o acto de adjudicação e o contrato celebrado, condene o Réu a excluir a proposta da H...e a adjudicar à A...o serviço objecto do identificado Concurso, com o que se fará Justiça.

O D...- D..., ora Recorrido, contra-alegou como segue:
1. Quanto à conclusão de que o preço é anormalmente baixo, observa-se que "o facto da proposta da contra-interessada H...apresentar um preço baixo num dos factores (repete-se, o qual não pode ser qualificado, nos termos legais, como anormalmente baixo), não significa que o contrato celebrado com a adjudicatária implique a violação de vinculações legais ou regulamentares aplicáveis, ou seja que a adjudicatária depois de celebrado o contrato não suporte a retribuição mínima legalmente garantida ao empregado de bar afecto a esse serviço e os correspondentes encargos com a segurança social." "Cabe salientar que a jurisprudência invocada pela Autora não é transponível para o presente caso porquanto diz respeito a concursos em que as peças concursais previam a instrução da proposta com notas justificativas do preço, nas quais os concorrentes deveriam indicar os encargos como pessoal, o que não se verifica no presente caso."
2. Como se refere na sentença recorrida, não se pode concluir que da apresentação de um baixo "Preço/hora" do serviço de bar em horário nocturno na proposta da ICA, decorre necessariamente a violação (pelo contrato celebrado com base na proposta) de vinculações legais ou regulamentares aplicáveis, tal como não pode por essa via sancionar a apresentação de um preço baixo que o legislador não pretendeu sancionar, pois apenas prevê a exclusão da proposta quando o preço total é anormalmente baixo.
3. Face ao exposto, deve improceder a alegação de que a proposta da contra-interessada H...é ilegal porque violadora da remuneração mínima fixada para o empregado de bar na Convenção Colectiva de Trabalho aplicável e dos princípios da igualdade e da concorrência.
4. Quanto ao facto de a H...não ter indicado o software que irá utilizar, impedindo a entidade adjudicante e verificar se o software que a mesma irá utilizar cumpre ou não as exigências constantes do artigo 8.° do Caderno de Encargos, observa-se o seguinte:
5. Como se refere na sentença recorrida: "Estabelece o n.° 4 do artigo 8º do Caderno de Encargos do concurso em apreço, peça do procedimento que contém as cláusulas a incluir no contrato a celebrar (nº 1 do artº 42° do Código dos Contratos Públicos) que os funcionários do adjudicatário devem possuir formação profissional que permita o funcionamento conforme o ponto seguinte: O adjudicatário deverá garantir o software necessário ao carregamento prévio pelos utilizadores dos cartões de código de barras, e à gestão/controlo consumos dos utentes. O software deverá, ainda, permitir a entrega ao D..., em suporte informático exportável para Excel, de uma listagem de consumos de refeições de formandos a quem o D...forneça a refeição completa gratuitamente (alínea C) dos factos provados).
6. Face à natureza da peça procedimental em que se encontra e ao teor da norma podemos concluir que a exigência referente ao software contida no n.° 4 do artigo 8º do Caderno de Encargos, se dirige ao adjudicatário e não ao concorrente.
7. Isto é, como decorre do Programa do Concurso, ao concorrente era apenas exigível que instruísse a sua proposta com a declaração de aceitação do conteúdo do caderno de encargos (alínea 8) dos factos provados e alínea a), n.° 1 do artigo 57° do Código dos Contratos Públicos), obrigando-se, assim, a celebrar contrato como uma cláusula com o conteúdo do n.° 4 do artigo 8° do Caderno de Encargos.
8. Das peças procedimentais não decorre a obrigação do concorrente especificar qual o software que irá utilizar, pelo que improcede a alegação de que a proposta da H...apresenta atributos que violam os parâmetros base fixados no caderno de encargos ou que seja impossível a avaliação da proposta em virtude da forma de apresentação de um dos respectivos atributos."
9. Nestes termos, deve negar-se provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida, com custas pela recorrente.

Com substituição legal de vistos pela entrega das competentes cópias aos Exmos. Desembargadores Adjuntos, vem para decisão em conferência - artºs. 36º nºs. 1 e 2 CPTA e 707º nº 2 CPC, ex vi artº 140º CPTA.

Em 1ª Instância foi fixada a seguinte factualidade:
A. Através do Anúncio de Procedimento n.° 5275/2009, publicado no Diário da República, II série, n.° 216, de 6 de Novembro de 2009, foi publicitado o Concurso Público n.° CPN/001/2009 para fornecimento de refeições e serviço de bar nas instalações da sede do D... (D...)
B. No Programa do Concurso Público n.° CPN/001/2009, para adjudicação do fornecimento de refeições e serviço de bar nas instalações da sede do D... (D...), pode ler-se, designadamente, o seguinte:
1 .IDENTIFICAÇÃO DO CONCURSO
[...]
1.3. Objecto do Concurso: Adjudicação do Fornecimento de Refeições e Serviço de Bar, para a sede do D...
MODO DE APRESENTAÇÃO DAS PROPOSTAS
11.6. A proposta é constituída pelos seguintes documentos:
11.6.1. Declaração do concorrente de aceitação do conteúdo do caderno de encargos, elaborada em conformidade com o modelo constante do Anexo l ao Programa de Concurso, conforme alínea a), n.° 1 do artigo 57.° do CCP;
11.7. A proposta para além dos demais elementos que o concorrente julgue adequados e oportunos, deverá ser elaborado de acordo com o Anexo V ao Programa do Concurso e especificar:
11.7.1. Preço unitário da refeição, prato completo
11.7.2. Preço hora de atendimento do Bar em horário nocturno
14. ADJUDICAÇÃO
[..]
14.3. O critério de adjudicação é a proposta economicamente mais vantajosa para o D...tendo em atenção os seguintes factores:
o 1 - Preço da refeição completa (PRC) 85%
PB - Preço Base
PP - Preço da Proposta
PRC = 100-[(PP)/PB)x100]
o 2 - Preço/hora do serviço de bar em horário nocturno (PBN) 15%
PB - Preço Base
PP - Preço da Proposta
PBN = 100 - [(PP)/PB) x 100]
Valor global da proposta após ponderação dos factores = 85% x PRC + 15% x PBN
[...]
15. PREÇO BASE
O preço base, é fixado nos termos do n.° 1 do artigo 47.° do CCP, a saber:
15.1. O preço base é de:
15.1.1. Das refeições completas: 153 648,00 € (cento e cinquenta e três mil, seiscentos e quarenta e oito euros) sem IVA.
Considerando que o preço unitário e por refeição completa é de 3,88 € (acresce IVA à taxa de 12%), sendo o número total de refeições prevista, nos termos do artigo 3.° do Caderno de Encargos de 39600 para os 24 meses de duração do contrato.
15.1.2. Preço/hora do serviço de bar em horário nocturno: 4 000,00€ (quatro mil euros) para 800 horas (40 semanas x 2 anos x 2 horas x 5 dias), considerando 5,00€/hora acrescido de IVA à taxa de 20%
Estima-se que no total do contrato (2 anos) seja necessário proceder à abertura durante 800 horas (40 semanas x 2 anos x 2 horas x 5 dias) [...]" - Documento n.° 1 junto à petição inicial;
C. No Caderno de Encargos do Concurso Público nº CPN/001/2009, para adjudicação do fornecimento de refeições e serviço de bar nas instalações da sede do D... (D...), pode ler-se, designadamente, o seguinte:
"[..]
Artigo 1.° - (Início do Fornecimento)
A data de início do fornecimento do serviço de refeições e do serviço de bar é o dia 01 de Janeiro de 2010.
[...]
Artigo 8.° - (Controlo e Pagamento)
Os funcionários do adjudicatário devem possuir formação profissional que permita o funcionamento conforme os pontos seguintes:
[...]
4. O adjudicatário deverá garantir o software necessário ao carregamento prévio pelos utilizadores dos cartões de código de barras, e à gestão/controlo consumos dos utentes.
O software deverá, ainda, permitir a entrega ao D..., em suporte informático exportável para Excel, de uma listagem de consumos de refeições de formandos a quem o D...forneça a refeição completa gratuitamente.
[..]
Artigo 9.° - (Horário de Funcionamento)
[...]
4. Sempre que o número de formandos a frequentar acções em horário pós-laboral seja superior a 40 (o adjudicatário será previamente informado desta situação), o bar abrirá ao público com o horário das 18h30 às 20h30. Estima-se que no total do contrato (2 anos) seja necessário proceder à abertura durante 800 horas (40 semanas x 2 anos x 2 horas x 5 dias).
[...]
Artigo 13.º - (Quadro de Pessoal)
O adjudicatário manterá o seguinte quadro mínimo de pessoal:
1 Encarregado(a)
1 Cozinheiro(a)
1 Preparador(a)
1 Empregado(a) de Refeitório
1 Empregado(a) de Bar. [...]
Artigo 30.° - (Duração do Contrato)
1. O contrato será celebrado desde a data em que entra em vigor até 31 de Dezembro de 2011, prevendo-se o seu início para 01/01/2010. [...] - Documento n.° 1 junto à petição inicial;
D. Apresentaram proposta ao Concurso Público n.° CPN/001/2009 os seguintes concorrente: E...- Sociedade de Restaurantes Públicos e Privados, SA.; F...- G..., Lda.; H...- H..., SA.; A...- A..., SA.; e I... (Portugal) - I..., Lda. - Documento n.° 2 junto à petição inicial;
E. No dia 19 de Novembro de 2009, o júri do concurso reuniu para proceder à abertura das propostas tendo deliberado admitir as propostas da A...- A..., SA e da I... (Portugal) - I..., Lda. e excluir as propostas da E...- Sociedade de Restaurantes Públicos e Privados, SA., da F...- G..., Lda. e da H...- H..., SA - Documento n.° 2 junto à petição inicial;
F. No dia 25 de Novembro de 2009, o júri do concurso deliberou aprovar o "Relatório Preliminar de Análise das Propostas" no qual excluiu da análise a proposta da I... (Portugal) - I..., Lda. e propôs a adjudicação à A...- A..., SA. - Documento n.° 3 junto à petição inicial;
G. No dia 7 de Dezembro de 2009, na sequência de reclamação apresentada pela H...- H..., S.A. contra a sua exclusão, o júri do concurso deliberou admitir a proposta desta concorrente e elaborar novo relatório preliminar a aprovar na próxima reunião do júri - Documento n.° 4 junto à petição inicial;
H. No dia 10 de Dezembro de 2009, o júri do concurso deliberou aprovar o segundo "Relatório Preliminar de Análise das Propostas", no qual classificou em 1° lugar a proposta da H...e em 2° lugar a proposta da A..., propondo a adjudicação à H...- Documento n.° 5 junto à petição inicial;
I. A ora Autora exerceu por escrito o seu direito de audiência prévia, pronunciando-se contra a ordenação proposta pelo júri no segundo relatório preliminar, sustentando que a proposta da H...devia ter sido excluída por apresentar um preço/hora do serviço de bar em horário nocturno manifestamente insuficiente para suportar os encargos legais obrigatórios com o empregado de bar afecto a esse serviço, nomeadamente, a sua retribuição mínima legalmente garantida pela Convenção Colectiva de Trabalho aplicável ao sector e os encargos com a segurança social (taxa social única) e por não indicar o software que irá utilizar conforme exigido pelo artigo 8.° do Caderno de Encargos - Documento n.° 6 junto à petição inicial;
J. No dia 21 de Dezembro de 2009, o júri do concurso reuniu para proceder à análise da reclamação da A..., tendo deliberado que "sendo o Preço/hora do serviço de bar em horário nocturno (PBN) anormalmente baixo (1,00€*800 horas = 800,00€) face ao preço base fixado (5,00€*800 horas = 4 000,00€) - representa 20% do preço total, deverá ser solicitado esclarecimento ao concorrente ICA, nos termos do n.° 3 do artigo 71°, com prazo de 1 dia para resposta" - Documento n.° 7 junto à petição inicial;
K. Em 22 de Dezembro de 2009, a concorrente H...prestou esclarecimento com o seguinte teor:
"1. O Programa do Concurso define o critério de adjudicação no ponto 14. ADJUDICAÇÃO:
14.3. O critério de adjudicação é a proposta economicamente mais vantajosa para o D...tendo em atenção os seguintes factores:
2 - Preço/hora do serviço de bar em horário nocturno (PBN) 15%
PB - Preço Base
PP - Preço da Proposta
PBN = 100-[(PP)/PB)x100]
(.../...)
2. E, o Programa do Concurso define o preço base no ponto 15.PREÇO BASE:
15.1. O preço base é de:
15.1.2. Preço/hora do serviço de bar em horário nocturno: (.../...), considerando 5,00 €/hora acrescido de IVA à taxa de 20 %.
3. Efectivamente, o Programa do Concurso ao definir o preço/hora base máximo do serviço de bar em horário nocturno (5,00 €/hora), permite ao concorrente na sua Proposta apresentar o seu preço/hora, sendo qualquer um aceitável desde que não ultrapasse o nível máximo base definido e indicado (veja-se no ANEXO l EXAME FORMAL DA PROPOSTA no ponto 15.1.2. Preço base da hora do serviço de bar em horário nocturno < 5,00/hora Sim). .
4. Por outro lado, o Código dos Contratos Públicos (CCP) menciona taxativamente no n.° 1 do seu Art.° 71° (Preço anormalmente baixo) que: "... quando o preço base for fixado no caderno de encargos, considera-se que o preço total resultante de uma proposta é anormalmente baixo ..." (negrito e sublinhado nossos).
5. Logo, o preceito normativo invocado não se aplica a um dos "sub-critérios" de adjudicação (no caso: 2 - Preço/hora do serviço de bar em serviço nocturno), mas sim ao "preço total resultante de uma proposta", e como facilmente o Júri poderá verificar, o valor global da nossa proposta até não é o mais baixo."- Documento n.° 7 junto à petição inicial;
L. No dia 22 de Dezembro de 2009, o júri do concurso reuniu para proceder à análise de um parecer de um consultor jurídico e do esclarecimento prestado pela ICA, tendo deliberado julgar improcedente a reclamação apresentada pela A...- Documento n.° 8 junto à petição inicial;
M. No dia 23 de Dezembro de 2009, o júri do concurso deliberou aprovar o "Relatório Final", propondo a adjudicação à H...- Documento n.° 9 junto à petição inicial;
N. No dia 29 de Dezembro de 2009, o Conselho de Administração do D..."deliberou aprovar o Relatório Final e autorizar a adjudicação da prestação de serviços à H...pelo valor de €180.585,60, iniciando-se o contrato a 4 de Janeiro." - Documento n.° 10 junto à petição inicial;
O. Para o "Preço hora do serviço de bar em horário nocturno (PBN), a H...propõe o valor de 800€ por 800 horas - Documento n.° 9 junto à petição inicial;
P. A H...não indica na sua proposta que software vai utilizar - Documento a fls. 348 a 463 do processo administrativo apenso aos autos e admitido por acordo;
Q. No dia 30 de Dezembro de 2009, foi disponibilizado na plataforma electrónica o Relatório Final - Documento a fls. 905 do processo administrativo apenso aos autos;
R. A A...é a adjudicatária do procedimento anterior e prestou os serviços de fornecimento de refeições e serviço de bar nas instalações da sede do D...até ao dia 31 de Dezembro de 2009 - Admitido por acordo;
S. No dia 31 de Dezembro de 2009, a A...procedeu ao levantamento da matéria-prima e do equipamento, de sua propriedade, que se encontravam nas instalações da sede do D...- Admitido por acordo;
T. Tendo cessado a prestação dos serviços no mesmo dia - Admitido por acordo;
U. Em 4 de Janeiro de 2011 foi celebrado o contrato - Documento a fls. 991 a 993 do processo administrativo apenso aos autos;
V. A H...encontra-se desde o dia 4 de Janeiro de 2010 a prestar os serviços de fornecimento de refeições e serviço de bar nas instalações da sede do D...- Admitido por acordo;

DO DIREITO

Por deliberação do Conselho de Administração de 28 de Julho de 2009 do D... - D...teve início o procedimento relativo ao concurso público nº CPN/001/2009 para fornecimento de refeições e serviço de bar na sede (alínea A do probatório), conforme ponto 3. do Caderno de Encargos, documentado a fls. 156 dos autos.
O que significa que o procedimento segue o regime do CCP aprovado pelo DL 18/2008 de 29.01 por conjugação do disposto no artº 16º nº 1 deste último com o artº 36º nº 1 do CCP, sendo, pois, este o complexo normativo aplicável às questões trazidas a recurso em matéria de exclusão de proposta por violação de aspectos da execução submetidos à concorrência, traduzidos no preço proposto e na especificidade de apresentação de um dos atributos (software para pagamento por cartão pré-carregado), itens 1a 9 e 10 a 16 das conclusões.

a) custos de pessoal - componente retributiva - retribuição base convencional - princípio da irredutibilidade da retribuição

O modelo de avaliação para determinação da proposta economicamente mais vantajosa no tocante aos aspectos submetidos à concorrência que configurem factores ou subfactores elementares de natureza quantitativa - critério de adjudicação em causa, alíneas C e B do probatório - é definido no programa do concurso mediante expressão matemática que permita a avaliação de todos os factores ou sub-factores quantitativos definidos - vd. artºs. 75 nºs 1 e 2, 132º nº 1 al. n) e 139º nº 3, CCP.
De acordo com este enquadramento, legal e procedimental, cabe apreciar a questão do preço proposto na componente dos encargos derivados dos custos de pessoal com o empregado de bar, na vertente do preço/hora do serviço de bar no horário nocturno das 18,30 às 20,30 h.
O artº 14.3 do Programa do Concurso define a equação de cálculo do preço/hora do serviço de bar em horário nocturno (PBN) e o artº 15 fixa o preço base de 4 000,00 € para esta prestação, valor calculado na previsão de 800 horas de funcionamento nos dois anos do período contratual, bem como o preço base de retribuição horária de 5,00€/hora mais IVA à taxa de 20%.
Dado que o preço constitui um dos aspectos da execução do contrato submetido à concorrência, a fixação do preço base de quatro mil euros para os dois anos de período contratual e de cinco euros/hora, significa três coisas,
(i) que a entidade adjudicante fixou o parâmetro base a que as propostas estão vinculadas na forma de limite máximo,
(ii) que esse limite é o preço máximo que a entidade adjudicante se dispõe a pagar pelas 800 horas de bar em serviço nocturno nos dois anos de período contratual,
(iii) que a concorrência do mercado vai funcionar do preço máximo dos 4 000,00€ e dos 5,00€/hora para baixo - vd. artº 47º nº 1 CCP.
Portanto, o preço/hora de custo de atendimento no bar entre as 18,30 e as 20,30h proposto por cada concorrente, com expressão no total das 800 horas estimadas para os dois anos contratuais, assume a natureza de atributo da proposta (artº 56º nº 2 CCP) correspondente ao factor quantitativo preço do serviço de Bar no horário nocturno das 18,30 e 20,30h a avaliar por aplicação do modelo de avaliação previsto para o critério de adjudicação da proposta economicamente mais vantajosa constante do programa - vd. artºs. 74º nº 1 a) e 75º nºs 1 e 2 e 132º nº 1 al. n), CCP.
De salientar, todavia, que este preço base além do limite máximo fixado em montante certo para o valor/hora de 5,00€ mais IVA a 20%, também tem um limite mínimo legal porque se trata de preço base que reporta exclusivamente ao custo constituído pela retribuição do empregado de bar colocado no período nocturno entre as 18,30 e as 20,30h, já que no Anexo I ao Caderno de Encargos estão discriminados os preços máximos unitários a praticar pelo adjudicatório relativamente aos géneros comestíveis e bebíveis para venda no dito Bar, vd. doc. a fls. 184/186 dos autos.
Limite mínimo legal constituído pelo valor da retribuição horária calculada a partir da retribuição certa mensal - ou retribuição base, na formulação do artº 258º nº 2 do Código do Trabalho - para a categoria laboral de empregado de bar fixada no instrumento de contratação colectiva aplicável, no caso a Convenção Colectiva de Trabalho (CCT) em vigor à data limite para entrega das propostas firmada entre os sectores representativos da partes, no caso, a CCT publicada no BTE nº 25 de 08.07.2009 celebrada entre a B...- Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal e a C...- Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores de Serviços e Outro.
Neste caso, a componente retributiva na vertente de retribuição certa mensal segundo a cláusula 4º nº 1 por reporte ao Anexo I para a referida categoria é de 536,40€, pelo que aplicando a fórmula de cômputo do valor da retribuição horária do artº 271º do CT, (anterior artº 264º), (Rm x 12) : (52 x n), sendo Rm a retribuição certa mensal da categoria e n o número de horas de trabalho semanal, no caso, 40, temos a seguinte equação: (536,40 x 12) : (52x40) = X, sendo X dado pelos 3,09€ de valor da retribuição horária para a citada categoria de empregado de bar, decorrente do valor da retribuição base mensal fixada pelo instrumento de contratação colectiva vigente.

No procedimento em causa foi adjudicada a proposta apresentada pela Contra-Interessada H...- H..., SA cujo valor constante quanto ao preço/hora do serviço de bar em horário nocturno das 18,30 às 20,30h é de 1€ (um euro), o que manifestamente não tem suporte legal por duas ordens de razões.
Em primeiro lugar, face à consagração do princípio da irredutibilidade da retribuição no artº 129º nº1d) do CT, (anterior artº 122º d)), normativo que apenas excepciona do âmbito de imperatividade garantística da prestação contratual por banda do trabalhador "os casos previstos neste Código e nos instrumentos de regulação colectiva de trabalho" o que significa, repete-se, confinar as excepções às hipóteses expressamente contempladas no Código do Trabalho e nos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho.
Nesta matéria, como nos diz a doutrina em análise comparativa com o regime do artº 21º da LCT, "(..) Por outras palavras: deixou de ser lícita a diminuição da retribuição, que não resulte de modificações contratuais, por mero acordo das partes. (..)" (1) , bem como "(..) decorre da norma a sua índole convénio-dispositiva, nos termos e para os efeitos do artº 5º do CT: assim, não pode ser reduzida a retribuição por contrato de trabalho, salvo nos casos previstos na lei. (..)", isto é, na medida em que limita a redução da retribuição ao domínio negocial que tenha por fonte a contratação colectiva, o artº 122º d) CT integra-se no campo das "(..) normas que não podem ser afastadas pelos contratos de trabalho, mas podem ser afastadas por convenção colectiva de trabalho. (..)"(2)
É neste quadro jurídico-laboral que toma sentido e cumpre interpretar o artº 18º do Caderno de Encargos que, sob a epígrafe de Legislação Laboral, dispõe como segue:
"(..)
1. O adjudicatário deve respeitar toda a legislação em vigor, a parte que lhe for aplicável, devendo nomeadamente observar as prescrições legais sobre sanidade, salários mínimos, horários de trabalho, segurança e responsabilidade por acidentes de trabalho, sendo o único responsável por quaisquer determinações ou sanções que lhe sejam impostas por entidades oficiais.
2. No cumprimento do estabelecido no número anterior, o adjudicatário obriga-se a afixar no local de trabalho os mapas de horário de trabalho.
3. O adjudicatário obriga-se a enviar ao D..., periódicamente, comprovação da apresentação das folhas de remuneração entregues na Segurança Social, onde constem todos os trabalhadores envolvidos, bem como o pagamento das respectivas contribuições para aquele organismo.
4. A comprovação a que se refere o número anterior, iniciar-se-á com a entrega ao D...da fotocópia da 1ª folha de remuneração após o início da prestação do serviço onde constem todos os trabalhadores que executam as funções e tarefas contratadas, a sua identificação e número de beneficiário do Regime Geral da Segurança Social, repetindo-se com uma periodicidade trimestral. (..)"
Para além de referir a evidência de obrigatoriedade de cumprimento da legislação laboral no que respeita ao pessoal que o adjudicatário venha a contratar no limite do quadro mínimo fixado no respectivo artº 13º, o art 18º do Caderno de Encargos também dispõe expressamente sobre a aplicabilidade do CCP no que não se mostre expressamente regulado e se relacione com o presente concurso, vd. fls. 161 dos autos.
De modo que ao caso trazido a recurso interessa o disposto no CCP quanto a quaisquer requisitos (atributos, termos e condições) da proposta que, em via de análise, se revelem em desconformidade com a lei e com as peças do procedimento e cuja consequência se subsuma num impedimento à sua admissão, em matéria de causas de exclusão de propostas no quadro de previsão do artº 70º nº 2 CCP.

b) preço base unitário; violação de parâmetro vinculativo; causa de exclusão de proposta - artº 70º nº 2 als. b) e f) CCP;

E chegamos ao segundo bloco de razões de ilegalidade assacadas à aceitação da proposta de preço/hora de 1 (um) € relativamente ao serviço de bar em horário nocturno das 18,30 às 20,30h.
Na circunstância cabe dizer que também não tem apoio legal o enquadramento feito pelo júri do concurso a propósito do pedido de esclarecimento à Contra-Interessada H...sobre o preço/hora de 1,00€ para o serviço de bar em horário nocturno das 18,30 às 20,30h, integrando a matéria no regime do preço anormalmente baixo do artº 71º nº 1 a) CCP.
Uma vez fixado o preço base no caderno de encargos - e não no programa do concurso -, tem-se como preço anormalmente baixo o que resulte num valor inferior em 50%, ou mais, relativamente ao preço base total determinado, cfr. artº 71º nº 1 b) CCP para os contratos que não sejam de empreitada de obras públicas.
Neste enquadramento normativo, o preço base fixado no caderno de encargos significa que a entidade adjudicante determinou o limite máximo "que se dispõe a pagar pela execução de todas as prestações" objecto do contrato, razão pela qual configura caso de exclusão a proposta que apresente um preço total anormalmente baixo e "cujos esclarecimentos justificativos não tenham sido apresentados" pelo concorrente no documento que obrigatoriamente terá de apresentar para o efeito, vd. regime conjugado dos artºs 70º nº 2 e), 146º nº 2 o), 71º nº 1 b) e 47º nº 1 a), todos do CCP.
O mesmo é dizer que o conceito normativo de preço anormalmente baixo e consequente regime do artº 71º CCP não tem aplicação no quadro dos preços apresentados por reporte a preços base unitários. 

A este propósito cabe precisar dois pontos - primeiro: dentre os documentos constitutivos obrigatórios da proposta e consequente apresentação obrigatória, figura o documento justificativo do preço anormalmente baixo proposto "quando esse preço resulte, directa ou indirectamente das peças do procedimento" cfr. artº 57º nº 1 d) CCP. (3)
O que significa que o dever de solicitação de esclarecimentos a cargo do órgão competente para a decisão de contratar, pressuposto integrativo do poder de exclusão das propostas nesta matéria do preço anormalmente baixo estatuído no artº 71º nº 3 CCP, rege na circunstância de não haver preço base fixado no caderno de encargos.
Segundo: caso a entidade adjudicante apresente preços base unitários, seja para além do preço base total ou apenas aqueles, como é o caso do procedimento presente nos autos em que há dois blocos de preços base unitários, o referente à Refeição Completa (153.468,00€) e o referente ao Serviço de Bar em Horário Nocturno (4.000,00€ e 5,00€/hora), tal significa que "(..) há tantos parâmetros vinculativos da concorrência quanto os preços base unitários, pelo que a violação de qualquer um deles constitui causa de exclusão das propostas - mesmo que os outros dela constantes, ficando abaixo do respectivo preço unitário, permitissem compensar a carestia daquele. (..)" (4)
É o caso na proposta apresentada pela contra-interessada adjudicatária H...- H..., SA que compensa o valor mais alto apresentado para o preço da refeição completa face ao proposto pela ora Recorrente através da apresentação do preço/hora de 1€ (um euro) relativamente ao serviço de bar em horário nocturno das 18,30 às 20,30h, se verificarmos o 2º Relatório Preliminar e o Relatório Final do júri concursal, levados ao probatório nas alíneas H e M - vd. fls. 239 e 263 dos autos.
Se assim não fosse, se a contra-interessada adjudicatária H...- H..., SA apresentasse para o serviço de atendimento de Bar o valor de retribuição/hora legal acrescido dos custos inerentes pela TSA (taxa social única), o valor do contrato por si oferecido (artº 17º CCP) e consequente preço contratual a pagar pela entidade adjudicante (artº 97º nº 1 CCP), seria superior ao da co-concorrente, ora Recorrente.
Simplesmente, pelas razões de direito expostas supra, a inobservância para menos do limite mínimo legal de retribuição viola princípio da irredutibilidade da retribuição com assento no artº 129º nº1d) do CT e constitui nos termos do artº 70º nº 2 al. f), CCP causa de exclusão de proposta por violação de legislação laboral aplicável ao contrato e de natureza vinculativa, prevista no próprio procedimento, no artº 18º do Caderno de Encargos e sobre cujo cumprimento a entidade adjudicante avocou o controlo expresso, quer no tocante ao valor retributivo quer na vertente das obrigações parafiscais, a partir do momento que inclui nas peças do procedimento através do artº 18º nºs. 3 e 4 do CE, acima transcritos.
E mais.
Na medida em que os preços base unitários, o referente à Refeição Completa (153.468,00€) e o referente ao Serviço de Bar em Horário Nocturno (4.000,00€ e 5,00€/hora) estão configurados segundo limites máximos e mínimos que constituem os parâmetros base dentro dos quais se faz a concorrência, cfr. artº 42º nº.s 3 e 4, CCP - características que definem um atributo das propostas, configurado pelos preços unitários apresentados por cada concorrente com correspondência necessária na fórmula matemática do modelo de avaliação, ou seja, nos factores de adjudicação do critério definido no procedimento -, a apresentação de proposta em violação do limite mínimo legal do parâmetro base de um dos preços base unitários, na circunstância, o limite mínimo legal de retribuição base CCT publicada no BTE nº 25 de 08.07.2009 celebrada entre a B...e a C...quanto ao preço/hora , constitui fundamento material de exclusão por a situação se subsumir no artº 70º nº 2 alínea b), CCP.
Do exposto resulta que assiste razão à ora Recorrente nas questões suscitadas nos itens 1 a 9 das conclusões de recurso.

c) termos ou condições regulados no caderno de encargos; omissão de inclusão na proposta;

Conforme levado ao probatório na alínea C, no tocante ao software dispõe o artº 8º do Caderno de Encargos - "(..) 4. O adjudicatário deverá garantir o software necessário ao carregamento prévio pelos utilizadores dos cartões de código de barras, e à gestão/controlo consumos dos utentes. // O software deverá, ainda, permitir a entrega ao D..., em suporte informático exportável para Excel, de uma listagem de consumos de refeições de formandos a quem o D...forneça a refeição completa gratuitamente. (..)".
Com fundamento no documento constante de fls. 348 a 463 do processo administrativo apenso aos autos e admitido por acordo das partes foi levado ao probatório na alínea P que "A H...não indica na sua proposta que software vai utilizar."
Por sua vez, o Relatório Final do júri referido na alínea M do probatório com fundamento no doc. nº 9 junto a fls. 257 a 264 dos autos, o mapa comparativo das propostas apresentadas pelas ora Recorrente e Contra-Interessada H...sob a denominação de "Verificação dos requisitos do Caderno de Encargos", consigna quanto ao artº 8º do Caderno de Encargos, na coluna referente à H...a expressão "Não Refere" e na coluna da ora Recorrente A..."Sim, com software próprio".
Sobre esta questão cumpre saber se a falta de concretização na proposta apresentada pela contra-interessada adjudicatária do software a utilizar configura uma situação subsumível na previsão do artº 70º nº 2 alíneas b) e c), CCP como sustenta a ora Recorrente.
Para o efeito, se o artº 8º do CE importar à análise e avaliação das propostas por correspondência com os factores e/ou sub-factores do concreto modelo de avaliação determinado em função do critério de adjudicação, estaremos perante uma cláusula do caderno de encargos respeitante a aspectos do contrato submetidos à concorrência, ou seja, no domínio do que o Código denomina de atributos das propostas, com ou sem fixação de limites quantitativos ou de qualidade - os denominados parâmetros base - que, também estes, devem corresponder a factores e/ou subfactores do critério de adjudicação.
No caso concreto, o modelo de avaliação e respectiva expressão matemática do critério de adjudicação da proposta economicamente mais vantajosa, artºs. 74º nº 1 b) e 75º nº 1, CCP, levado ao probatório na alínea B, nada mais refere em sede de factores que não seja o preço da refeição completa e o preço/hora do serviço de Bar em horário nocturno, razão pela qual se tem por assente que a matéria do artº 8º do Caderno de Encargos quanto ao software é um aspecto da execução do contrato não submetido à concorrência e, por conseguinte, os aspectos da execução do contrato discriminados no artº 8º do CE inserem-se no domínio dos termos ou condições regulados no caderno de encargos.
Como modos de configuração destes aspectos a lei prevê a descrição em termos fixos ou por reporte a limites qualitativos ou quantitativos de mínimos ou máximos, de observância vinculada sob cominação de exclusão da proposta - vd. artºs. 42º nºs. 5/6 e 70º nº 2 al. b), CCP - e a que devem dar resposta no exacto modo de apresentação que a entidade adjudicante tenha determinado no programa de concurso, isto é, a apresentar no contexto da própria proposta ou em documento autónomo de apresentação obrigatória porque constitutivo daquela, vd. artº 57º nº 1 al. c) CCP.

Este efeito jurídico sancionatório consagrado no artº 70º nº 2 b) CCP decorrente da inobservância de aspectos de execução do contrato subtraídos à concorrência mas descritos e, portanto, regulados no caderno de encargos, é explicável em via de coerência com a natureza jurídica que esta peça do procedimento assume no modo de formação dos preceitos negociais que vão exteriorizar o comportamento negocial declarativo das partes, nos termos gerais da teoria do negócio jurídico.
De facto, o caderno de encargo constitui, sempre, parte integrante do contrato, a par dos esclarecimentos e rectificações a ele respeitantes e dos esclarecimentos prestados pelo adjudicatário sobre a proposta adjudicada, cfr. artº 96º nº 2 als. b), c) e e), CCP.
O que significa que os termos ou condições são irrelevantes apenas do ponto de vista adjudicatório, mas não do ponto de vista do interesse público presente no objecto do contrato.
Citando, "(..) Sabemos já que o atributo é algo adjudicatóriamente relevante e que o termo ou condição é adjudicatóriamente irrelevante e sabemos também que, apesar disso, ambos versam sobre aspectos tidos por relevantes para os interesses ou objectivos prosseguidos pela entidade adjudicante com o contrato em causa, pois, se não fosse assim, não se teria ela preocupado e pronunciado sobre os mesmos no caderno de encargos - donde qualificarmo-los como termos ou condições procedimentais .(..)" da proposta. (5)
No tocante a estes aspectos da execução do contrato não submetidos à concorrência "(..) previstos no caderno de encargos a que o concorrente se limita a aderir (por estarem estritamente definidos no caderno de encargos, não há qualquer actividade concretizadora por parte do concorrente) ou cuja concretização não é relevada ao nível adjudicatório (não há aí uma disputa entre os concorrentes). Trata-se, portanto, de uma distinção que, mais do que atender à existência/inexistência de um labor do concorrente na concretização do projecto contratual contido no caderno de encargos, olha para a relevância/irrelevância dessa concretização para efeitos de escolha da melhor proposta. (..)" (6)
Como dito, em razão desta relevância para o interesse público presente no objecto do contrato é cominada a exclusão das propostas que "apresentem quaisquer termos ou condições que violem aspectos da execução do contrato a celebrar por aquele [o caderno de encargos] não submetidos à concorrência" - vd. artº 70º nº 2 b) CCP.
A expressão legal em matéria de termos e condições é "apresentem", ou seja, prevê-se a existência formal do elemento externo da declaração negocial por parte do concorrente, sobre o qual incide a análise do júri que revele a apresentação de termos ou condições da proposta em infracção ao clausulado no caderno de encargos.
Diversamente da previsão em matéria de atributos, cujo âmbito de exclusão abarca tanto as propostas que "não apresentem algum dos atributos" como as que "apresentem atributos que violem os parâmetros base fixados no caderno de encargos", vd. artº 70º nº 2 als. a) e b) CCP, ou seja, caracterizando a ilicitude da proposta em matéria de atributos tanto por acção como por omissão.
Nesta circunstância salienta a doutrina que "(..) Estranhamente a alínea a) do artº 70º refere-se apenas à falta de apresentação de um atributo, já não à falta de um termo ou condição, o que nos leva a interrogarmo-nos sobre se efectivamente só a falta de atributos é causa desta exclusão. (..)
Assim, na falta de uma indicação das peças do procedimento quanto à consequência a imputar a tal facto, uma de três.
Ou se entende que estamos perante um lapso do legislador, aplicando-se por analogia o regime da alínea a) do artº 70º/2; ou se considera que a proposta é automaticamente integrada pela especificação que conste como limite máximo ou mínimo, do caderno de encargos (..); ou se admite que, por não se tratar de algo que tenha sido submetido à concorrência, a omissão poderá ser suprida em sede de esclarecimentos da proposta (cuja admissibilidade parece resultar do artº 72º/2 do CCP) ou então mais tarde, em sede de ajustamentos ao contrato.
Parece-nos, à primeira vista, que a solução de exclusão da proposta é de afastar - ou então, estaria a imputar-se ao legislador "erros de palmatória" na redacção e sistematização da lei, por isso que, tendo distinguido no nº 1 do artº 70º os atributos dos termos e condições, logo na alínea a) do respectivo nº 2 referiu-se duas vezes apenas a atributos (uma directamente outra por remissão para a alínea b) do artº 57º/1), e na alínea b) já voltou a referir-se também aos termos e condições, o que, para o intérprete, significaria que as propostas nas quais faltem termos ou condições não são excluídas, salvo se as próprias peças do procedimento que se lhes referirem assim o determinarem.
Trata-se, porém, de uma solução pouco racional.
É que dela resulta que, se um concorrente pura e simplesmente ignorar as exigências procedimentais quanto aos termos e condições das propostas, a sua mantém-se [porque a hipótese não se subsume na alínea a) do artº 70º/2], mas, se porventura não ignorar a apresentar um termo ou condição em violação dos limites máximos ou mínimos do caderno de encargos, a sua proposta já é excluída [por a situação se subsumir na alínea b) do artº 70º/2].
De qualquer forma, a verdade é que sempre foi esta a solução constante das várias versões que foram sendo conhecidas do CCP, pelo que parece não se tratar de um lapso, mas de uma solução conscientemente querida.
Assim, se não houver regra específica no programa de procedimento sobre esta hipótese, aplica-se a segunda solução acima alinhada ou, na sua impossibilidade, a terceira. (..)" ((7))

No caso trazido a recurso a questão prende-se com a falta de termos ou condições na proposta apresentada pela contra-interessada adjudicatária H...- H..., SA, que não se pronunciou sobre os aspectos da execução do contrato regulados no artº 8º do CE pois, embora subtraídos à concorrência, pelas razões já referidas não são inócuos do ponto de vista da execução do contrato atentos os interesses da entidade adjudicante, ora Recorrida.
Efectivamente, interpretando o artº 8º do CE segundo o critério estatuído no artº 238º nº 1 CC para os negócios formais, o sentido útil que do respectivo texto se retira na economia do contrato do ponto de vista dos interesses da entidade adjudicante pretende é garantir do software dois resultados, a saber,
(i) o adjudicatário deverá garantir o software necessário ao carregamento prévio pelos utilizadores dos cartões de código de barras, e à gestão/controlo consumos dos utentes.
(ii) o software deverá, ainda, permitir a entrega ao D..., em suporte informático exportável para Excel, de uma listagem de consumos de refeições de formandos a quem o D...forneça a refeição completa gratuitamente.
Consequentemente, vincular os concorrentes a que o software, tenha ele a modalidade que tiver, sirva para obter esses dois resultados.
Tendo presentes os desenvolvimentos doutrinários transcritos, configura-se problemático admitir a inocuidade jurídica de uma tal falta de explicitação de aspectos da execução do contrato nas hipóteses em que o caderno de encargos regule a matéria dos termos ou condições por referência expressa a limites mínimos ou máximos, que são barreiras de observância estrita sob pena de exclusão, cfr. artºs 42º nº 5, 70º nº 2 b) e 146º nº 2 b) ex vi 57º nº 1 c), CCP, ou por referência a especificações técnicas atento o disposto no artº 49º na remissão expressa do artº 70º nº 2 b) in fine, CCP.
Tanto mais que o caderno de encargos é o modo de formação dos preceitos negociais contratualmente exteriorizados, como também já se referiu, na medida em que será sempre parte integrante do contrato a celebrar, a par dos esclarecimentos e rectificações a ele respeitantes e dos esclarecimentos prestados pelo adjudicatário sobre a proposta adjudicada, cfr. artº 96º nº 2 als. b), c) e e), CCP.
Todavia, na medida em que afastamos a existência de lacuna, seguindo o entendimento doutrinário transcrito supra, conclui-se que à situação dos autos não é aplicável a previsão do artº 70º nº 2 b) e c) do CCP de exclusão de propostas por apresentação de termos ou condições que violem aspectos da execução do contrato não submetidos à concorrência no caderno de encargos, nem por impossibilidade de avaliação.

Neste sentido, a falta de indicação de termos ou condições na proposta da contra-interessada adjudicatária H...- H..., SA, sobre aspectos de execução do contrato subtraídos à concorrência regulados no artº 8º do CE não é causa determinante de exclusão do procedimento por a situação não se subsumir na hipótese do artº 70º nº 2 b) CCP, prevista apenas para termos ou condições da proposta que violem a regulação do caderno de encargos, isto é, termos ou condições da proposta que expressamente estejam em desconformidade com as cláusulas do caderno de encargos que lhes digam respeito, situação em que "(..) é irrelevante o facto de o concorrente ter subscrito a declaração de aceitação do conteúdo do caderno de encargos do anexo I ao CCP ou o facto de, nos termos do artº 96º/ 5, o caderno de encargos prevalecer sobre a proposta quando haja divergência entre eles: se um atributo violar os parâmetros base ou se um termo ou condição violar um limite máximo ou mínimo, a proposta deve ser excluída, não servindo aquela declaração ou prevalência para a legitimar. (..)" ((8))
Pelo que vem dito, o enquadramento legal é distinto na circunstância de a proposta omitir qualquer referência expressa em matéria de aspectos da execução do contrato subtraídos à concorrência e regulados no caderno de encargos.
Tanto assim que a omissão pode ser suprida em sede de esclarecimentos, no âmbito de previsão do artº 72º nº 2 CCP, esclarecimentos que em caso de adjudicação também transitam para o contrato a celebrar cfr. artº 96º nº 2 e) CCP, ou em sede de ajustamentos ao contrato sobre termos ou condições nos termos do artº 99º nº 1 CCP desde que tais ajustamentos não violem "aspectos da execução do contrato a celebrar por aquele [o caderno de encargos] não submetidos à concorrência" conforme disposto no artº 99º nº 2 al. a) do CCP.
O facto de a lei permitir a sanação da omissão da proposta em matéria de termos ou condições na fase da celebração do contrato pela via dos ajustamentos significa que proposta que se apresente em falta sobre aspectos subtraídos à concorrência regulados no caderno de encargos não impossibilita as operações do júri na avaliação objectiva da proposta, nem em si mesma considerada nem no domínio da comparabilidade objectiva com as restantes propostas apresentadas.

De modo que a situação trazida a recurso não é subsumível na previsão do artº 70º nº 2 c), CCP donde se conclui pela improcedência das questões suscitadas nos itens 11 a 16 das conclusões de recurso.

d) invalidade derivada do contrato; desconsideração da anulabilidade contratual consequente - artº 283º nºs 2 e 4 CCP;

Conforme exposto supra, a proposta da contra-interessada adjudicatária H...- H..., SA apresentou um preço base unitário referente ao serviço de bar em horário nocturno entre as 18,30 e as 20,30h no valor de preço/hora 1€ (um euro) em violação do limite mínimo legal de retribuição base CCT publicada no BTE nº 25 de 08.07.2009 celebrada entre a B...e a C...quanto ao preço/hora , computado em 3,09€ para a retribuição horária da citada categoria de empregado de bar, em desconformidade com o disposto no artº 129º nº 1 d) do CT que apenas permite a redução da retribuição em sede de regulação colectiva de trabalho e casos previsto no citado Código, para além de, naturalmente, expressa previsão legal em complexo normativo específico.
A desconformidade deste atributo da proposta com o limite mínimo, imperativo por disposição expressa de lei geral, é subsumível nas causas de exclusão previstas nas alíneas b) e f) no do nº 2 do artº 70º CCP, o que inquina o acto de adjudicação - deliberação de 29.12.2009 do Conselho de Administração da ora Recorrente - acto administrativo constitutivo de direitos, de vício de violação de lei por erro de direito sobre os pressupostos, reportado a cláusula essencial do caderno de encargos expressa no preço base unitário referente ao Serviço de Bar em Horário Nocturno - que na circunstância foi patenteado no programa do concurso - traduzido no factor integrante da expressão matemática do modelo de avaliação, o que o torna anulável, nos termos do artº 135º CPA.
O que significa que o carácter consequente do vício do contrato celebrado, tornando este anulável nos termos do artº 283º nº 2 CCP.
Decorre do probatório que a contra-interessada adjudicatária H...- H..., SA desde 04.01.2010 que presta os serviços de fornecimento de refeições e serviço de bar nas instalações da entidade adjudicante e que a vigência do contrato cessa em 31.12.2011 - alíneas C e V do probatório.
O que significa, ponderando os interesses públicos e privados em presença, que em função do termo ad quem para o período de vigência contratual, a declaração de anulação do contrato se mostra desproporcionada o que se projecta na descaracterização da invalidade do contrato, que se declara, nos termos do artº 283º nº 4, 1ª parte, CCP.

Termos em que acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso
Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em,
A. na procedência do recurso revogar a sentença proferida e conceder parcial provimento ao recurso;
B. anular o acto de adjudicação de 29.12.2009 pelo qual foi aceite a proposta apresentada pelo concorrente e adjudicatário H...- H..., SA no Concurso Público nº CPN/001/2009 para fornecimento de refeições e serviço de bar nas instalações da sede do D... (D...);
C. ao abrigo do disposto no artº 283º nº 4, 1ª parte, CCP, desconsiderar, por desproporcionalidade, a anulabilidade consequencial do referido contrato cuja vigência termina em 31.12.2011.
Custas a cargo da Entidade Recorrida.
Lisboa, 12.AGO.2011

(Cristina dos Santos)
(Carlos Araújo)
(Joaquim Condesso)


1- Pedro R. Martinez, L. Miguel Monteiro, Joana Vasconcelos, P. Madeira de Brito, Guilherme Dray, L. Gonçalves da Silva, Código do Trabalho - Anotado, Almedina/2007, pág.292.
2- M. Rosário Palma Ramalho, Direito do Trabalho, Parte I - Dogmática Geral, Almedina/2005, pág.216.
3-Mário Esteves de Oliveira et alii, Código dos Contratos Públicos e legislação complementar - guias de leitura e aplicação, Almedina/2008, págs. 640/641 e 790; Margarida Olazabal Cabral, O concurso público no Código dos Contratos Públicos - Estudos de Contratação Pública, I - CEDIPRE, Coimbra Editora/2008, págs. 201/203; Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos e outros procedimentos de contratação pública, Almedina/2011, pág. 944.
4- Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos ..., pág. 638.
5- Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos ..., pág. 588.
6- Luís Verde de Sousa, A negociação nos procedimentos de adjudicação - uma análise do Código dos Contratos Públicos, Almedina/2010, pág.186.
7- Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos..., págs. 931/933 nota (217) e 364, 589,590.
8- Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos..., pág. 934.