Acórdão n.º 39/2011, de 19 de Maio de 2011, da Subsecção da 1.ª Secção do Tribunal de Contas (proc. n.º 450/2011)

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ACÓRDÃO Nº 39/2011 - 19/05/2011 - 1ª SECÇÃO/SS

PROCESSO Nº 450/2011 - 1ª SECÇÃO

Acordam os Juízes da 1ª Secção do Tribunal de Contas, em Subsecção:

I - RELATÓRIO

A Administração Regional Hidrográfica do Tejo, IP remeteu, para fiscalização prévia, o contrato de empreitada de "Reabilitação da célula de lamas não estabilizadas da ETAR de Alcanena" celebrado em 11 de Março de 2011, entre si e o consórcio formado pelas empresas "Tomás de Oliveira Empreiteiros, SA", "EGEO - Tecnologia e Ambiente, SA" e "SISAV- Sistema Integrado de Tratamento e Eliminação de Resíduos, SA" pelo valor de 3.844.399,53 €, acrescido de IVA.

II - MATÉRIA DE FACTO

Para além do referido acima, relevam para a decisão os seguintes factos, que se dão como assentes:

A) O contrato em apreço foi precedido de concurso público internacional, cujo aviso de abertura foi publicado no Diário da República, II Série, de 30 de Julho de 2010 e no JOUE, nº S 149, de 4 de Agosto de 2010;

B) O preço base do concurso foi de 4.500.000,00 €, acrescido de IVA;

C) Ao concurso apresentaram-se 10 concorrentes, tendo sido excluídos três;

D) O prazo de execução da obra é de 745 dias;

E) A consignação da obra ainda não ocorreu;

F) O critério de adjudicação, de acordo com o Programa do Concurso e o Anúncio do mesmo, é o da proposta economicamente mais vantajosa, e contempla a ponderação dos seguintes factores:

- Preço - 25%;
- Valia técnica da proposta - 75%.

G) Os trabalhos da empreitada, tal como descritos na Memória Descritiva e Justificativa do modo de execução da obra, são essencialmente os seguintes: (1)

- Montagem, exploração e desmobilização de estaleiro;
-
Bombeamento das águas pluviais depositadas sobre a cobertura flutuante;
-
Demolição do muro periférico, remoção da cobertura flutuante e reposição e enchimento com compactação da vala de fixação da tela por terreno local,
-
Bombeamento para a cabeça da ETAR de Alcanena da água excedentária à superfície da célula, incluindo sistema provisório de transporte da água entre a célula e a cabeça da ETAR;
-
Remoção das lamas contida na célula e outros materiais;
-
Desidratação através de Geotube e transporte das lamas desidratadas para a unidade CIRVER SISAV;
-
Reabilitação da célula com remoção das telas e rede de drenagem de lixiviados existentes e enchimento com solos;
-
Implementação de um plano de monitorização da qualidade do ar;
-
Instalação de uma estação meteorológica.

H) No ponto 15.2 do Programa do procedimento, foi exigido aos concorrentes a titularidade de alvará contendo as seguintes habilitações:

i) 6ª subcategoria (saneamento básico) da 2ª categoria (vias de comunicação, Obras de urbanização e Outras infra-estruturas), na classe correspondente ao valor global da proposta;
ii) 9ª subcategoria (Ajardinamentos) da 2ª categoria, em classe correspondente ao valor dos trabalhos especializados que lhe respeite, consoante a parte que a esses trabalhos cabe na proposta;
iii) 11ª subcategoria (Estações de tratamento ambiental) da 4ª categoria (Instalações Eléctricas e Mecânicas) em classe correspondente ao valor dos trabalhos especializados que lhe respeite, consoante a parte que a esses trabalhos cabe na proposta;
iv) 7ª subcategoria (Drenagens e tratamento de taludes) da 5ª categoria (outros trabalhos) em classe correspondente ao valor dos trabalhos especializados que lhe respeite, consoante a parte que a esses trabalhos cabe na proposta.

I) A empresa "SISAV - Sistema Integrado de Tratamento e Eliminação de Resíduos, SA" não possui alvará que a habilite a actuar no sector da construção;

J) Nas cláusulas 2ª e 3ª do contrato de consórcio externo, celebrado entre as empresas indicadas no ponto I (Relatório), deste acórdão foi estabelecido, para a empresa referida na alínea anterior, uma participação de 54%, para desenvolver as seguintes obrigações:

a) Estabilização das lamas;
b) Monitorização da qualidade das águas subterrâneas, das águas superficiais e do ar;
c) Fornecimento e montagem da estação meteorológica automática.

K) Dos alvarás de construção das empresas "Tomás de Oliveira, Empreiteiros, SA" e "EGEO - Tecnologia e Ambiente, SA" consta que as mesmas são detentoras das seguintes classes, nas subcategorias e categorias exigidas:

 

Subcategoria

Categoria

Classe

Valor dos trabalhos correspondentes à classe da habilitação contida no alvará(2)

(euros)

 

 

Tomás Oliveira Empreiteiros, SA

EGEO - Tecnologia e Ambiente, SA

 

6.ª - Saneamento básico

2.ª

9

-

Acima de 16 600 000

9.ª - Ajardinamentos

2.ª

9

-

Acima de 16 600 000

11.ª - Estações de tratamento ambiental

4.ª

1

2

Até 332 000

7.ª - Drenagens e tratamento de taludes

5.ª

9

-

Acima de 16 600 000

  

L) Da proposta adjudicatária resulta que a empreitada aqui em causa se resume à realização das seguintes actividades:

Designação dos trabalhos

Valor

(euros)

Preço total do capítulo

(euros)

%

 

A. Estaleiro

 

 

489.410,42

  

12,73

 

1. Estaleiro

 

456.978,42

 

 

 

 

 

2. Plano de segurança e saúde

 

20.000,00

 

 

 

 

 

3. Plano de gestão de resíduos de construção e demolição

 

3.920,00

 

 

 

4. Identificação da obra

 

2.912,00

 

 

 

5. Telas finais

 

5.600,00

 

 

 

B. Reabilitação da célula de lama

 

  

 

  

3.283.400,57

  

85,41

 

1. Trabalhos preparatórios

 

411.322,47

 

 

1.1 Demolições

64.709,77

 

 

1.2 Remoção da cobertura flutuante

14.628,00

 

 

1.3 Bombagem e encaminhamento das águas depositadas na superfície da lagoa

331.984,70

 

 

 

2. Homogeneização, desidratação e estabilização das lamas

 

2.587.118,10

 

 

2.1 Operação de remoção das lamas depositadas no interior da lagoa

199.558,10

 

 

2.2 Homogeneização, desidratação e estabilização química das lamas

358.650,00

 

 

Item B.2.2.1 Homogeneização e desidratação das lamas a tratar, (...)

357.300,00

 

 

2.3 Transporte e tratamento de lamas

2.028.910,00

 

 

  

3. Enchimento da célula e recuperação paisagística

  

284.960,00

 

 

3.1 Remoção das telas de fundo e da rede de drenagem de lixiviados existentes

20.000,00

 

 

3.2 Enchimento da célula

264.960,00

 

 

 

C. Implementação do plano de monitorização da qualidade das águas subterrâneas e superficiais

 

  

  

7.894,00

  

  

0,21

 

1. Monitorização das águas subterrâneas

 

6.439,50

 

 

 

2. Monitorização das águas superficiais

 

1.454,50

 

 

 

D. Implementação do plano de monitorização da qualidade do ar

 

  

  

50.135,00

  

  

1,30

 

1. Monitorização da qualidade do ar

 

  

50.135,00

 

 

 

 

E. Estação meteorológica automática

13.559,54

0,35

 

1. Construção civil

 

2.364,54

 

 

 

2. Equipamentos

 

11.195,00

 

 

TOTAL DA PROPOSTA

3.844.399,53

100,00

 

M) Uma vez que da lista de preços unitários da proposta adjudicatária constam trabalhos de "homogeneização e desidratação de lamas a tratar", foi questionada a ARHT, IP sobre como considerava legalmente possível a admissão do consórcio adjudicatário e a adjudicação, tendo em conta o disposto na Portaria nº 1371/2008 de 2 de Dezembro, bem como o facto de as empresas "Tomás de Oliveira, Empreiteiros, SA" e "EGEO -Tecnologia e Ambiente, SA" possuírem alvarás, apenas, nas classes 1 e 2, respectivamente, na 11ª subcategoria, da 4ª categoria, tendo a mesma entidade respondido o seguinte, em síntese:
"... Relativamente aos trabalhos de "homogeneização e desidratação de lamas a tratar", com um valor de 357.300,00 €, informa-se que a homogeneização e desidratação das lamas configura, nesta parte dos trabalhos, uma actividade equivalente à da exploração/operação de uma Estação de Tratamento Águas Residuais, no que respeita ao tratamento da sua fase sólida, e que a construção necessária e a usar para este fim são instalações e equipamentos provisórios e amovíveis, a retirar no final, não sendo incorporados em obra.
Desta forma, da totalidade do valor indicado na proposta para o artigo B 2.2.1 - 357.300,00€, apenas parte do valor - 107.595,99€, é atribuído pelo adjudicatário como trabalhos de construção propriamente dita, necessária ao processo da homogeneização e desidratação das lamas. Assim, o adjudicatário possui alvará suficiente, bem como autorização de valor suficiente para a realização dos trabalhos de construção a executar".

N) Foi questionada ainda a ARHT,IP sobre como considerava legalmente possível a adjudicação, face à circunstância de um dos membros do consórcio adjudicatário (a empresa "SISAV - Sistema Integrado de Tratamento e Eliminação de Resíduos, SA") não possuir alvará de construção que o habilite a actuar no sector da construção, e ao facto de, no contrato de consórcio externo (cláusulas 2ª e 3ª), ter sido estabelecido, para esta empresa, uma participação de 54% para desenvolver as obrigações indicadas na alínea I).
Na sua resposta, a ARHT, IP referiu o seguinte, em síntese:
"... Relativamente à questão colocada na alínea b), dispõe o n.° 1 do artigo 26.0 do Decreto-Lei n.° 12/2004, de 9 de Janeiro, que "Para a realização de obras, as empresas de construção podem organizar-se, entre si ou com empresas que se dediquem a actividade diversa, em consórcios ou em qualquer das modalidades jurídicas de agrupamento de empresas admitidas e reguladas pelo quadro legal vigente, desde que as primeiras satisfaçam, todas elas, as disposições legais relativas ao exercício da actividade".
Em conformidade com o disposto no n.° 1 e 2 do artigo 26.° do Decreto-Lei 12/2004, de 9 de Janeiro, não existe impedimento legal, para que uma empresa que integre um consórcio para a realização de obras, se possa dedicar a actividade diversa da construção, desde que as restantes empresas desse consórcio, preencham as condições referidas.
Do agrupamento adjudicatário - Tomás de Oliveira - Empreiteiros, S.A. / EGEO - Tecnologia e Ambiente, S.A. / SISAV - Sistema Integrado de Tratamento e Eliminação de Resíduos, S.A., a empresa Tomás de Oliveira, Empreiteiros, S.A., detém habilitação que cobre o valor total da obra e que respeita ao tipo de trabalhos mais expressivo, enquanto a EGEO - Tecnologia e Ambiente, S.A. possui habilitação que cobre a parte da obra que se propõe executar...".

O) Questionada, também, a AHRT, IP para informar a razão pela qual o consórcio adjudicatário não apresentou a declaração prevista nos artigos 60º, nº4 e 81º, nº5, al. a), do CCP, com a indicação dos preços parciais dos trabalhos que cada um dos seus membros se propões executar correspondentes às habilitações contidas nos alvarás ou nos títulos de registo ou nas declarações emitidas pelo Instituto da Construção e do Imobiliário, IP, para efeitos da verificação da conformidade desses preços com a classe daquelas habilitações, veio a citada entidade dizer o seguinte, em síntese:
"... Nos termos do disposto nos n.° 4 e 5 do artigo 60.° do CCP, o Concorrente devia indicar na proposta (destacado nosso) os preços parciais dos trabalhos que se propõe executar correspondentes às habilitações contidas nos alvarás ou nos títulos de registo ou nas declarações emitidas pelo Instituto da Construção e do Imobiliário, I.P., nos termos do disposto na alínea a) do n.° 5 do artigo 81.° do CCP, para efeitos de verificação da conformidade desses preços com a classe daquelas habilitações. Esta disposição é aplicável aos agrupamentos concorrentes, devendo estes, para o efeito, indicar na proposta os preços parciais dos trabalhos que cada um dos seus membros se propõe executar.
De acordo com a disposição acima mencionada, todos os concorrentes deveriam fazer na sua proposta, uma indicação dos preços parciais dos trabalhos que se propõe executar correspondentes às habilitações contidas nos alvarás ou nos títulos de registo ou nas declarações emitidas pelo Instituto da Construção e do Imobiliário, nos termos do disposto na alínea a) do n.° 5 do artigo 81.° do CCP, para efeitos de verificação da conformidade desses preços com a classe daquelas habilitações.
A referida indicação visa comprovar as "habilitações" do concorrente, necessárias à execução da "actividade de construção", habilitações que apenas são legalmente exigíveis na fase de pós adjudicação, nos termos do artigo 81.° do CCP.
Nenhum interesse da concorrência, do concurso ou da administração, ficou prejudicado pela falta da indicação a que alude o n.° 4 e 5 do artigo 60.° do CCP, uma vez que o fim visado pela referida disposição legal foi aferido na fase de pós adjudicação, quando o concorrente teve que fazer prova das respectivas habilitações, nos termos do artigo 81.° do CCP.
Em sede de pós adjudicação, o concorrente adjudicatário veio comprovar possuir as habilitações necessárias para executar a empreitada, como resulta dos documentos de adjudicação entregues pelo adjudicatário, após a notificação da decisão de adjudicação, os quais se encontram juntos ao processo administrativo.»

P) Sobre a questão indicada na alínea M) e sobre a resposta da entidade adjudicante, aí transcrita, foi colhido parecer técnico a um perito em engenharia deste Tribunal, o qual, sobre essa matéria, se pronunciou pela forma seguinte:
"... Da consulta à lista de preços unitários da proposta adjudicada, constata-se que só o item B.2.2.1 relativo aos trabalhos de "homogeneização, desidratação das lamas a tratar (...) ", apresenta o preço de 357.300,00 euros (3), inserido no capítulo B- Reabilitação da célula da lama no montante de 3.283.400,57 euros (85,41% do valor total da proposta), ultrapassa a classe 2 de habilitação do consórcio adjudicatário (do alvará da empresa EGEO - Tecnologia e Ambiente, SA).
Contudo, os trabalhos desta especialidade - 11.ª subcategoria (Estações de tratamento ambiental) no âmbito da 4ª categoria (Instalações Eléctricas e Mecânicas) - não se limitam apenas ao item B 2.2.1 no montante de 357.300,00 €, uma vez que a participação da empresa EGEO - Tecnologia e Ambiente, SA, nos termos do n.º 10 do programa de procedimento, inclui ainda o transporte das lamas (4)  (que se reporta aos itens B.2.3.1, B.2.3.2 e B.2.3.3), o que demonstra que a sua classe não é suficiente para a realização dos trabalhos da especialidade relativa a estações de tratamento ambiental (11.ª subcategoria da 4.ª categoria).
Ora, a entidade adjudicante vem alegar que o valor a realizar nesta especialidade é de 107.595,00 €, "atribuído pelo adjudicatário como trabalhos de construção propriamente dita, necessária ao processo", o que é dificilmente aceitável, uma vez que não é apresentada, nem demonstrada, a discriminação dos trabalhos envolvidos no item B.2.2.1 (com as diferentes espécies de trabalhos e respectivos preços), de modo a aferir a composição do preço global de 357.300,00 euros, apresentado neste artigo da proposta...".

III - O DIREITO

1. Suscitam-se, no presente processo, duas questões:

a) Uma relativa ao facto de o consórcio adjudicatário não possuir a habilitação necessária à execução da obra posta a concurso, designadamente por uma das empresas integrantes do consórcio não possuir alvará de construção que a autorize a exercer actividade neste sector, e, por outro lado, por duas das outras empresas, integrantes do consórcio, não possuírem o alvará com a classe suficiente, no âmbito da 11ª subcategoria, da 4ª categoria, como era exigido;
b) Uma segunda questão relacionada com o facto de o consórcio adjudicatário não ter apresentado a declaração prevista nos artigos 60º, nºs 4 e 5 e 81º, nº5, al. a), ambos do Código dos Contratos Públicos (CCP).

2. Vejamos, então, a primeira questão, ou seja o facto de o consórcio adjudicatário não possuir a habilitação necessária para a execução da obra posta a concurso, observando o seguinte:
O Programa de Concurso Tipo, aprovado pela Portaria nº 104/2001, de 21 de Fevereiro, estabelece, no seu nº 6.2, e na parte que ora interessa ponderar, o seguinte:

6. Admissão dos concorrentes
.................................................................................
6.2 - O certificado de classificação de empreiteiro de obras públicas previsto na alínea a) do nº 6.1, deve conter:
a1) A classificação como empreiteiro geral de ...(edifícios, estradas, vias férreas, obras de urbanização, obras hidráulicas, instalações eléctricas ou instalações mecânicas, de acordo com o estabeleci- do na Portaria nº 412-I/99 de 4 de Junho) na ... (1ª, 3ª 4ª ou 5ª) categoria, em classe correspondente ao valor da proposta;
ou
a2) A ... subcategoria da ... categoria, a qual tem de ser de classe que cubra o valor global da proposta e integrar-se na categoria em que o tipo da obra se enquadra; (5)
b) A(s)...subcategoria(s) da(s)...categoria(s), na classe correspondente à parte dos trabalhos a que respeite(m), caso o concorrente não recorra à faculdade conferida no n.º 6.3 (indicar as restantês subcategorias necessárias à execução da obra)."
Das disposições acabadas de transcrever resulta que:
-
Deve ser exigida a subcategoria respeitante ao tipo de trabalhos mais expressivo;
-
Esta subcategoria terá de ser de classe que cubra o valor global da proposta.

2. 1. No que diz respeito ao Programa de Concurso e aos documentos de habilitação que devem ser apresentados pelos adjudicatários nos procedimentos de formação de quaisquer contratos, importa observar o disposto nos artigos 132º, nº1, al. f) e 81º, nºs 2, 5, al. a), 6 e 8, do Código dos Contratos Públicos (CCP), aprovado pelo DL nº 18/2008 de 29 de Janeiro.
Dispõe o artigo 132º, nº1, al. f), do CCP o seguinte:

Artigo 132º
Programa do Concurso
1 - O programa do concurso público deve indicar:
........................................................................
f) Os documentos de habilitação, directamente relacionados com o objecto do contrato a celebrar, a apresentar nos termos do disposto no nº6, do artigo 81º; (6)
........................................................................

Por seu lado, o artigo 81º, do CCP, nos seus nºs 2, 5, al. a), 6 e 8, estipula:

Artigo 81º
Documentos de habilitação
.............................................................................
2 - No caso de se tratar de um procedimento de formação de um contrato de empreitada ou de concessão de obras públicas, o adjudicatário, para além dos documentos referidos no numero anterior, deve também apresentar os alvarás ou os títulos de registo emitidos pelo Instituto da Construção e do Imobiliário, I.P., contendo as habilitações adequadas e necessárias à execução da obra a realizar ou, no caso de o contrato respeitar a um lote funcionalmente não autónomo, as habilitações adequadas e necessárias à execução dos trabalhos inerentes à totalidade dos lotes que constituem a obra. (7)
5 - O adjudicatário, ou um subcontratado referido no n.º 3, nacional de Estado signatário do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu ou do Acordo sobre Contratos Públicos da Organização Mundial de Comércio que não seja titular do alvará ou do título de registo referi- dos nos n.os 2 ou 3, consoante o caso, ou do certificado referido no número anterior deve apresentar, em substituição desses documentos:
a) No caso de se tratar de um procedimento de formação de um contrato de empreitada ou de concessão de obras públicas, uma declaração, emitida pelo Instituto da Construção e do Imobiliário, I. P., comprovativa de que pode executar a prestação objecto do contrato a celebrar por preencher os requisitos que lhe permitiriam ser titular de um alvará ou de um título de registo contendo as habilitações adequadas à execução da obra a realizar;
b) ..................................................................
6 - Independentemente do objecto do contrato a celebrar, o adjudicatário deve ainda apresentar os documentos de habilitação que o programa do procedimento exija, nomeadamente, no caso de se tratar de um procedimento de formação de um contrato de aquisição de serviços, quaisquer documentos comprovativos da titularidade das habilitações legalmente exigidas para a prestação dos serviços em causa.
...............................................................................
8 - O órgão competente para a decisão de contratar pode sempre solicitar ao adjudicatário, ainda que tal conste do programa do procedimento, a apresentação de quaisquer documentos comprovativos da titularidade das habilitações legalmente exigidas para a execução das prestações objecto do contrato a celebrar, fixando-lhe prazo para o efeito.

Por outro lado, e no que se refere às classes das habilitações contidas nos alvarás de construção e aos correspondentes valores dos trabalhos, há que observar o que dispõe a Portaria nº 21/2010 de 11 de Janeiro, (8) em vigor à data em que foi aberto o procedimento que antecedeu o presente contrato.
Na verdade, o artigo 1º, desta Portaria, estabelece que, à classe 2, corresponde trabalhos com um valor até 332.000 €, e que, à classe 3, correspondem trabalhos com um valor até 664.000 €.

2. 2. Como se mostra da matéria de facto dada por assente na alínea H) do probatório, no ponto 15.2 do Programa do procedimento, foi exigida, entre outras, a 11ª subcategoria, da 4ª categoria, em classe correspondente ao valor dos trabalhos especializados que lhe respeite, consoante a parte que a esses trabalhos cabe na proposta.

2.2.1. Como resulta da matéria de facto dada por assente na alínea I) do probatório, a empresa "SISAV - Sistema Integrado de Tratamento e Eliminação de Resíduos, SA" não possui alvará que a habilite a actuar no sector da construção.
Por outro lado, e como também resulta da matéria factual dada por assente na alínea J) do probatório, nas cláusulas 2ª e 3ª do contrato de consórcio externo celebrado entre as empresas mencionadas no Relatório, do presente acórdão, ficou estabelecido, para a empresa "SISAV, SA" uma participação de 54%, no desenvolvimento das tarefas indicadas nesta alínea J).
Esta situação tem um relevo negativo acentuado, uma vez que se aceitou como válida uma proposta de um consórcio em que um dos membros - que tem uma parte importante dos trabalhos a seu cargo - não está autorizado a exercer actividade no sector da construção.
Para além disso, não estando um dos membros do consórcio adjudicatário, validamente credenciado pelo Instituto da Construção e do Imobiliário, IP para exercer a actividade de construção, com a aceitação de uma proposta nessas condições estaria aberta a possibilidade de o exercício dessa actividade ser efectuado sem estar sujeito a regras e a taxas e sem necessidade de obtenção de alvarás ou licenças.

2.2.2. No que concerne às empresas "Tomás de Oliveira, Empreiteiros, SA" e "EGEO - Tecnologia e Ambiente, SA", - que também fazem parte do consórcio adjudicatário - verifica-se que estas empresas possuem as classes 1 e 2, respectivamente, na 11ª subcategoria da 4ª categoria, como consta da alínea K) do probatório.
Ora, no que concerne aos trabalhos relativos à 11ª subcategoria da 4ª categoria, (trabalhos relativos a estações de tratamento ambiental) e de acordo com a lista de preços unitários da proposta adjudicatária, (vide a matéria de facto da alínea L) do probatório) o item B.2.2.1, relativo aos "trabalhos de homogeneização, desidratação das lamas a tratar ..." apresenta um preço de 357.300,00 €.
Logo, face a este valor de 357.300,00 €, e tendo em conta o disposto no artigo 1º da dita Portaria, seria a classe 3, aquela que seria a adequada para esses trabalhos e não as classes 1 e 2, que eram as classes contidas nos alvarás detidos pelas empresas "Tomás de Oliveira, Empreiteiros, SA" e "EGEO - Tecnologia e Ambiente, SA", respectivamente.
Por isso, pode afirmar-se que, como consta da matéria de facto dada por assente, o consórcio adjudicatário não possui as habilitações exigidas pelo Programa de Concurso, designadamente quanto posse do alvará exigido (caso da empresa "SISAV, SA") e quanto à classe do alvará, necessária para o valor dos trabalhos correspondentes à 11ª subcategoria, da 4ª categoria - trabalhos correspondentes à estação de tratamento ambiental - como é o caso das empresas "Tomás de Oliveira, Empreiteiros, SA" e "EGEO, SA".
Esta ilegalidade, para além de ter consequenciado um alargamento do universo dos potenciais concorrentes ao concurso, que precedeu a celebração do presente contrato, permitiu a candidatura de empresas que não dispunham das habilitações legalmente necessárias para a realização da obra aqui em causa.
Ora, a circunstância de o adjudicatário não possuir as habilitações necessárias conduz a que este não assegure que a obra seja realizada nas condições técnicas adequadas, o que pode redundar em elevado prejuízo - dos pontos de vista técnico e financeiro - para a entidade adjudicante.
Foi, assim, violado o disposto, conjugadamente, no artigo 1º da Portaria nº 21/2010 de 11 de Janeiro e ainda no artigo 81º, nºs 2, 5º, al. a), 6 e 8 do CCP.

3. Vejamos, de seguida, a questão de não ter sido apresentada, pelo consórcio adjudicatário, a declaração prevista nos artigos 60º, nºs 4 e 5 e 81º, nº5, al. a), ambos do CCP.
Vimos atrás o teor do artigo 81º, nº5, al. a) do CCP.
Vejamos, de seguida, o que dispõe o artigo 60º do CCP nos seus nºs 4 e 5:

Artigo 60º
Indicação do preço
...........................................................................
4 - No caso de se tratar de procedimento de formação de contrato de empreitada ou de concessão de obras públicas, o comcorrente deve indicar na proposta os preços parciais dos trabalhos que se propõe executar correspondentes às habilitações contidas nos alvarás ou nos títulos de registo ou nas declarações emitidas pelo Instituto da Construção e do Imobiliário, IP, nos termos do disposto na alínea a) do nº5, do artigo 81, para efeitos da verificação da conformidade desses preços com a classe daquelas habilitações.
5 - O disposto no número anterior é aplicável aos agrupamentos concorrentes, devendo estes, para o efeito, indicar na proposta os preços parciais dos trabalhos que cada um dos seus membros se propõe executar.

No que respeita à omissão da apresentação da declaração prevista nos nºs 4 e 5 deste artigo 60º do CCP, estamos perante uma violação de lei que impede a verificação completa da conformidade que deve verificar-se entre o valor dos preços parciais do trabalhos a executar e a classe da habilitação exigível.
Trata-se, no fundo, de uma exigência que está intimamente relacionada com a questão tratada no ponto anterior (III. 2. 2.), onde se concluiu que o consórcio adjudicatário não possuía habilitações suficientes para a realização de todos os trabalhos da empreitada, a que se reporta o contrato aqui em causa, e que, por essa circunstância, não reunia condições técnicas adequadas para essa finalidade, o que pode redundar em elevados prejuízos para a entidade adjudicante.

4. Vejamos, finalmente, as consequências decorrentes da violação do disposto nos mencionados artigos 60º, nºs 4 e 5 e 81º, nºs 2, 5, al. a), 6 e 8, do Código dos Contratos Públicos, atrás salientada.
Sem prejuízo do que se afirmará no ponto seguinte, diremos, no que se refere estas violações de lei, que, não estando em causa nenhuma situação subsumível ao disposto na alíneas b) do nº 3 do art.º 44.º da Lei n.º 98/97, a questão que se coloca é a de saber se, para aquelas ilegalidades, se verifica algum dos fundamentos de recusa de visto estabelecidos na alínea a), ou na alínea c), do referido preceito, e, nesta última hipótese, se é caso de se "conceder visto e fazer recomendações (...) no sentido de suprir no futuro tais ilegalidades".
A invalidade dos actos administrativos e, designadamente, a matéria da nulidade dos mesmos actos, é tratada nas secções III e IV, do Capítulo II, da Parte IV do Código do Procedimento Administrativo (CPA), mais precisamente nos artigos 133º (actos nulos), 134º (regime da nulidade), 137º (ratificação, reforma e conversão) e 139º, nº1, al. a) (revogação).
Ora, pode dizer-se que, em abstracto, um acto administrativo ferido de ilegalidade decorrente da violação dos artigos 60º, nºs 4 e 5 e 81º, nº5, al. a), ambos do CCP, não está previsto no elenco dos actos para os quais o artigo 133º, do CPA comina a nulidade, como forma de invalidade, porquanto:
- O acto ferido do vício resultante das referidas violações de lei, não está previsto no nº 2 do artigo 133º do Código do Procedimento Administrativo (CPA); (9)
- Não existe qualquer outro dispositivo legal que, para aquele vício, comine expressamente essa forma de invalidade (vide nº 1 do artigo 133º do CPA);
- Um acto de adjudicação de uma empreitada, que apenas sofra do vício resultante da violação dos mencionados normativos, contém todos os seus elementos essenciais, considerando-se "elementos essenciais" todos os elementos cuja falta se consubstancie num vício do acto que, por ser de tal modo grave, torne inaceitável a produção dos respectivos efeitos jurídicos, aferindo-se essa gravidade em função da ratio que preside àquele acto de adjudicação (vide artigo 133º, n.º 1, 1.ª parte, do CPA). (10)

Assim, não sendo as mencionadas ilegalidades, pelos motivos expostos, geradoras de nulidade, só podem as mesmas ser geradoras de anulabilidade, tal como se dispõe no artigo 135º do mesmo CPA.
Ora, afastados que estão os fundamentos previstos nas alíneas a) e b) do nº 3 do art.º 44 da Lei 98/97, e tendo nós dado por assente que as citadas violações de lei ocorridas, são geradoras de anulabilidade, importa, agora, analisar se as mesmas são enquadráveis no disposto na alínea c) do nº 3 do mesmo normativo.
A resposta a esta questão, só pode ser positiva:
No caso presente estamos perante ilegalidades que podem ter por consequência a alteração do resultado financeiro do contrato, dada a possibilidade de a obra não ser realizada em termos tecnicamente adequados e ainda a eventualidade de, por esse facto, virem a produzir-se elevados prejuízos para a entidade adjudicante.
De acordo com o artigo 44º, nº3, al. c) da Lei nº 98/97 de 26 de Agosto, constitui fundamento de recusa de visto, a desconformidade dos actos, contratos e demais instrumentos geradores de despesa, ou representativos de responsabilidades, que implique ilegalidade que altere ou possa alterar o resultado financeiro do contrato, submetido a fiscalização prévia do Tribunal de Contas.

4. 1. Todavia, as consequências jurídicas destas ilegalidades não ficam por aqui.

Efectivamente, há que não perder de vista o disposto no artigo 86º, nº1, als. a) e b), do Código dos Contratos Públicos, de acordo com o qual a adjudicação caduca se, por facto que lhe seja imputável, o adjudicatário não apresentar os documentos de habilitação no prazo fixado no programa do procedimento, ou no prazo fixado pelo órgão competente para a decisão de contratar. (11)
Ora, no caso vertente, o consórcio adjudicatário não apresentou documento comprovativo de que o alvará, de que é titular, possui a classe 3, no que respeita à 11ª subcategoria, da 4ª categoria, como era necessário no caso presente, atento o valor dos trabalhos correspondentes, e o que era exigido no ponto 15.2 do Programa do Procedimento e pela Portaria nº 21/2010 de 11 de Janeiro e, por outro lado, um dos membros do mesmo nem sequer possui alvará que o habilite a exercer actividade no sector da construção.
Nestas circunstâncias, a adjudicação decidida pelo órgão competente para a decisão de contratar, - e notificada ao adjudicatário nos termos do artigo 77º, nº2, do CCP -, caduca por força do disposto no mencionado artigo 86º, nº1, al. b) do mesmo Código.
Além disso, tal facto é imputável ao consórcio adjudicatário, uma vez que não procurou reunir os requisitos habilitacionais necessários e suficientes para cumprir as exigências formuladas no Programa de Concurso.
Por sua vez, caducando a adjudicação, estamos perante a ausência de um acto de adjudicação validamente praticado.
A falta de um acto de adjudicação válido, determina, por seu turno, a nulidade do contrato, por força do disposto, conjugadamente nos artigos 133º, nº1 do CPA e 283º, nº1 e 284º, nº2, do CCP:
Efectivamente, dispõe o artigo 133º, nº1, do CPA:

Artigo 133º
Actos nulos
1 - São nulos os actos a que falte qualquer dios elementos essenciais ou para ou para os quais a lei comine expressamente essa forma de invalidade.
.......................................................................

Por outro lado, estipulam os artigos 283º, nº1 e 284º, nº2, do CCP:

Artigo 283º
Invalidade consequente de actos procedimentais inválidos
1 - Os contratos são nulos se a nulidade do acto procedimental em que tenha assentado a sua celebração tenha sido judicialmente declarada ou possa ainda sê-lo.
.............................................................................

Artigo 284º
Invalidade própria dos contratos
1 - .........................................................................
2 - Os contratos são, todavia, nulos quando se verifique algum dos Fundamentos previstos no artigo 133º do Código do Procedimento Administrativo ou quando o respectivo vício determine a nulidade por aplicação dos princípios gerais de direito administrativo.
3 - ...........................................................................

Ora, a nulidade é, por seu lado, fundamento de recusa de visto, nos termos do artigo 44º, nº3, al. a) da Lei nº 98/97 de 26 de Agosto.

IV - DECISÃO

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os Juízes da 1ª Secção do Tribunal de Contas, em Subsecção, em recusar o visto ao presente contrato.
São devidos emolumentos (artigo 5º, nº 3 do Regime Jurídico anexo ao Decreto-Lei n.º 66/96, de 31 de Maio).
Lisboa, 19 de Maio de 2011. 

Os Juízes Conselheiros
(António M. Santos Soares, relator)
(João Figueiredo)
(Alberto Fernandes Brás)

Fui presente
O Procurador-Geral Adjunto
(Jorge Leal) 


(1) Vide fols. 15/64 da proposta. 
(2) Valores das classes das habilitações para 2011 dos alvarás de construção, ao abrigo da Portaria n.º 57/2011, de 28 de Janeiro (entrou em vigor em 01.02.2011). 
(3) Com base na quantidade estimada de 30.000 m3., uma vez que as naturezas de trabalhos incluídas nos capítulos B e E1 são avaliadas por série de preços (fl. 27 do processo de esclarecimentos prestados pelo dono da obra). 
(4) Inserido no capítulo B.2.3 Transporte e tratamento de lamas da lista de preços unitários. 
(5) Esta alínea aplica-se quando a obra não envolva de forma principal a execução de trabalhos enquadráveis nas subcategorias determinantes para a classificação como empreiteiro geral ou quando, podendo ser exigível a classificação como empreiteiro geral, o dono da obra não a exija. 
(6) A redacção desta alínea - que era a que vigorava à data da adjudicação, no caso presente - veio a ser alterada pelo DL nº 278/2009 de 2 de Outubro. 
(7) Itálico nosso. 
(8) Esta Portaria revogou a Portaria nº 1371/2008 de 2 de Dezembro e veio a ser revogada pela Portaria nº 57/2011 de 28 de Janeiro. 
(9) Anote-se, contudo, que a enumeração é meramente exemplificativa. 
(10) Vide, entre outros, os Acórdãos do Tribunal de Contas n.º 30/05-15NOV-1.ª S/PL, e nº 135/07 - 27. NOV.07-1ª S/SS. 
(11) Este, no caso previsto no nº8, do artigo 81º do CCP.
No mesmo sentido decidiu este Tribunal no seu Acórdão nº 145/09 de 8 de Setembro de 2009, in Proc.nº 1312/09.