Acórdão n.º 30/2010, de 23 de Novembro de 2010, do Plenário da 1.ª Secção do Tribunal de Contas (proc. n.º 455/2010)

Imprimir

ACÓRDÃO N.º 30 /10 - 23.NOV-1ªS/PL

RECURSO ORDINÁRIO Nº 12/2010-R

(Processo de fiscalização prévia n.º 455/2010)

 

SUMÁRIO

1. A inclusão, no mapa de quantidades, de referências a marcas comerciais específicas viola o disposto no artigo 49.º, n.ºs 12 e 13, do Código dos Contratos Públicos.

2. A proibição da introdução de especificações técnicas discriminatórias nos documentos concursais não visa apenas a protecção directa dos interessados em concorrer ao concurso em causa, obviando a uma eventual restrição do concreto universo concorrencial, mas visa também garantir o funcionamento da concorrência relativamente aos itens afectados, salvaguardando os interesses dos fornecedores dos bens e propiciando a diversificação e optimização das propostas, em defesa dos interesses financeiros da entidade pública.

3. Num concurso para a realização de uma empreitada, e mesmo quando o número de concorrentes seja elevado, a exigência do fornecimento de equipamentos ou materiais de uma determinada marca conduz a uma total falta de concorrência relativamente aos bens em causa e uma total falta de alternativas, quanto aos bens e aos respectivos custos.

4. O facto de o adjudicatário ser autorizado a, no decurso da execução da obra, proceder à substituição dos materiais, é totalmente irrelevante, já que essa substituição não repõe a concorrência que deveria ter ocorrido na escolha das propostas e na formação do preço contratual, antes se fazendo no âmbito de um preço já formado e, portanto, integralmente a favor do adjudicatário.

5. A exigência aos concorrentes da classificação de empreiteiro geral de obras ou construtor geral de edifícios de construção tradicional da classe 7 viola o disposto no n.º 1 do artigo 31.º do Decreto-Lei n.º 12/2004, de 9 de Janeiro, que prescreve a obrigação de, nos concursos de obras públicas, ser exigida uma única subcategoria em classe que cubra o valor global da obra.

6. Este regime visa salvaguardar o mais amplo acesso ao mercado, obstando a que a entidade adjudicante estabeleça requisitos habilitacionais excessivos.

7. Este Tribunal tem entendido que quando são feitas exigências de habilitação técnica superiores às estabelecidas na lei isso conduz à redução do universo de potenciais candidatos, violando-se o princípio da concorrência e verificando-se susceptibilidade de alteração do resultado financeiro, uma vez que se impediu o surgimento de propostas eventualmente mais vantajosas.

8. Não é procedente o argumento do recorrente de que, mesmo tendo formalmente estabelecido requisitos habilitacionais superiores ao devido, isso não conduziu no caso à alteração do universo de potenciais candidatos, uma vez que o universo de candidatos com alvará de empreiteiro geral na classe exigida é idêntico ao universo de candidatos com alvará na subcategoria e classe que deveria ter sido exigida.

9. Essa improcedência deriva de a subcategoria relevante ter sido definida a posteriori, em divergência da posição inicialmente tomada, de a um concurso público de âmbito internacional, como foi o caso, poderem concorrer candidatos nas condições previstas no n.º 5 do artigo 81.º do Código dos Contratos Públicos e de, no caso, ter sido exigido alvará de classe superior à necessária.

10. O valor global da obra só é determinado em rigor quando se toma a decisão de adjudicação. Assim, a exigência de uma classe determinada não deve ser feita nos documentos do concurso. Deve exigir-se tão só classe que cubra o valor global da obra, a qual é reportada ao valor da proposta de cada concorrente e, no momento da adjudicação e celebração do contrato, ao valor adjudicado.

11. O facto de ter agora sido proferido um despacho para garantir o cumprimento futuro de anteriores recomendações dirigidas à entidade não afasta a circunstância de, tendo a mesma sido atempadamente alertada por este Tribunal para as ilegalidades, poder e dever ter prevenido a sua ocorrência no presente procedimento.

12. A avaliação e decisão da 1.ª instância no sentido de não se usar novamente da faculdade prevista no artigo 44.º, n.º 4, da LOPTC não merece censura e não deve ser alterada.

Lisboa, 23 de Novembro de 2010

Relatora: Helena Abreu Lopes

ACÓRDÃO N.º 30 /10 - 23.NOV-1ªS/PL

RECURSO ORDINÁRIO Nº 12/2010-R

(Processo de fiscalização prévia n.º 455/2010)

 

I. RELATÓRIO

I.1. Pelo Acórdão n.º 21/2010-7.JUN-1.ª S/SS, A 1.ª Secção do Tribunal de Contas recusou o visto ao contrato de empreitada para a construção de um Complexo Desportivo na localidade de Porto Salvo, celebrado em 25 de Março de 2010, entre o Município de Oeiras e a Sociedade de Construções José Coutinho, S.A., pelo valor de € 3.565.316,29.
I.2. A recusa do visto, proferida ao abrigo do disposto na alínea c) do nº 3 do artº 44º da Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas (LOPTC (1)), fundamentou-se:
13. Na inclusão, no mapa de quantidades, de referências a específicas marcas comerciais, em violação do disposto no artigo 49.º, n.ºs 12 e 13, do Código dos Contratos Públicos (2);
14. Na ilegalidade das exigências feitas aos concorrentes em termos de habilitações técnicas, face ao disposto no artigo 31.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 12/2004, de 9 de Janeiro;
15. Na susceptibilidade de essas circunstâncias afectarem negativamente a concorrência e, assim, propiciarem a alteração do resultado financeiro do contrato;
16. Na não verificação dos pressupostos conducentes ao uso da faculdade prevista no artigo 44.º, n.º 4, da LOPTC, tendo em conta que o Município de Oeiras já havia anteriormente sido objecto de recomendações deste Tribunal nas matérias em causa, não lhes tendo dado cumprimento.
I.3. Inconformado com o Acórdão, o Município de Oeiras veio dele interpor recurso, pedindo a revogação do mesmo e a concessão de visto ao contrato.
Em defesa do pretendido apresentou as alegações processadas de fls. 3 a 10 dos autos, que aqui se dão por reproduzidas. As referidas alegações referem, em síntese:

§ Que a referência, no mapa de quantidades, a marcas comerciais desacompanhadas da menção "ou equivalente" deveu-se a um mero lapso por parte dos serviços técnicos da autarquia, não sendo esse facto susceptível de alterar o resultado financeiro do contrato;

§ Que a exigência habilitacional estabelecida no procedimento do concurso, podendo ter beliscado a literalidade das normas aplicáveis, não violou a ratio dos preceitos em causa e não deu azo a factos susceptíveis de alterar o referido resultado financeiro;

§ Que o Presidente da Câmara proferiu, em 21 de Junho de 2010, um Despacho ordenando aos responsáveis pela instrução de processos de empreitada e fornecimentos que acatem as recomendações do Tribunal de Contas na matéria, o que "impedirá in futurum o cometimento de semelhantes infracções passíveis de censura do Tribunal".

I.4. O Procurador-Geral Adjunto junto do Tribunal de Contas emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento e de que deve manter-se a decisão recorrida.
I.5. Corridos os demais vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
 

II. FUNDAMENTAÇÃO  

II.1. DOS FACTOS

A matéria de facto dada como assente na decisão recorrida não foi objecto de qualquer impugnação pelo recorrente, pelo que agora se confirma e se dá como integralmente reproduzida.

II.2. DAS ESPECIFICAÇÕES TÉCNICAS

Como resulta da factualidade dada como assente na 1.ª instância e é reconhecido pelo recorrente, o mapa de quantidades do procedimento realizado continha a referência a específicas marcas comerciais, desacompanhadas da expressão "ou equivalente", num conjunto de artigos que representavam 1,87% do valor do contrato.
Essa referência obrigava os potenciais concorrentes a fornecer os referidos materiais nas concretas marcas indicadas.
Como também se estabeleceu no acórdão recorrido, e igualmente é aceite pelo recorrente, essas exigências constituem uma violação do disposto no artigo 49.º, n.ºs 12 e 13, do Código dos Contratos Públicos.
Com estes normativos, e na linha do também estabelecido na legislação comunitária (3), pretendeu o legislador impedir que nos processos de contratação pública sejam estabelecidas especificações técnicas discriminatórias, e, por essa via, favorecidos ou desfavorecidos determinados operadores económicos ou determinados produtos, ofendendo-se o princípio da concorrência e o objectivo primário de realização do mercado único de bens e serviços no espaço europeu.
Deve, a este respeito, sublinhar-se que a proibição da introdução de especificações técnicas discriminatórias nos documentos concursais não visa apenas a protecção directa dos interessados em concorrer ao concurso em causa, obviando a uma eventual restrição do concreto universo concorrencial, mas visa também garantir o funcionamento da concorrência relativamente aos itens afectados, salvaguardando os interesses dos fornecedores dos bens e propiciando a diversificação e optimização das propostas, em defesa dos interesses financeiros da entidade pública.
O recorrente veio invocar nesta matéria:

§ Que a especificação das marcas nos itens identificados correspondeu a um mero lapso por parte dos serviços técnicos da autarquia;

§ Que, porque o caderno de encargos não tem a faculdade de alterar a lei, os concorrentes ao procedimento não estavam, apesar desse lapso, impedidos de apresentar preços para equipamentos equivalentes aos referidos no mapa de quantidades;

§ Que, pela mesma razão, a autarquia não podia impedir o adjudicatário de, durante o decurso da empreitada, colocar em obra equipamentos equivalentes aos indicados no mapa de quantidades;

§ Que a autarquia se comprometeu a transmitir ao empreiteiro orientações escritas no sentido de não estar obrigado ao fornecimento das marcas designadas;

§ Que não foram apresentadas, pelos concorrentes ou pelo adjudicatário, quaisquer reclamações ou pedidos de esclarecimento a respeito dos referidos artigos do mapa de quantidades;

§ Que a especificação das marcas em nada favorece alguns dos concorrentes em detrimento de outros, pois todos os concorrentes estão em "pé de igualdade";

§ Que o teor do preceito constante no artigo 49.º, n.º 13, do Código dos Contratos Públicos, incluído em normas anteriores equivalentes, há muito que se encontra inculcado nos empreiteiros de obras públicas;

§ Que o reduzido valor da totalidade dos artigos em apreço relativamente ao valor da empreitada não permitia, de per si, a alteração do resultado financeiro do contrato;

§ Que, por isso, não se verifica a violação da ratio do artigo 49.º, n.º 13, do Código dos Contratos Públicos, nem se verificou alteração, ou susceptibilidade de alteração do resultado financeiro do contrato.

Ora, importa reter que, considerando as especificações feitas às marcas nos itens identificados, e precisamente por, ao contrário de outros, estes itens não conterem a referência "do tipo (...) ou equivalente", o comportamento normal dos concorrentes é o de cumprir a exigência, apresentando, para aqueles itens, propostas daquelas marcas ou modelos.
Até porque certamente preferem afastar o risco de ver as suas propostas eventualmente excluídas por incumprimento do caderno de encargos.
Assim, mesmo que podendo impugnar ou afastar as exigências discriminatórias feitas, os concorrentes preferem, com um elevado grau de probabilidade, responder às especificações técnicas tal como elas estão formuladas.
Só assim não será quando não tenham acesso aos materiais exigidos, o que não se verifica em situações como aquela que está em apreciação.
Donde resulta que, numa empreitada, e por muitos que sejam os concorrentes ao concurso, provavelmente todos eles proporão o equipamento das marcas especificadas e todos eles estarão, nessa medida, e como o recorrente referiu, "em pé de igualdade".
No entanto, o que se verificará, mesmo nessa situação, é uma total falta de concorrência relativamente aos bens em causa e uma total falta de alternativas, quanto aos bens e aos respectivos custos.
Nesse contexto, não temos agora maneira de saber se no caso de o equipamento ou materiais terem sido descritos de outra forma teriam surgido soluções técnicas mais adequadas ou mais económicas.
Deste modo facilmente se conclui que as especificações técnicas efectuadas excluíram qualquer concorrência e tiveram um efectivo efeito discriminatório, não sendo de todo possível afirmar-se que o resultado financeiro da adjudicação não sofreria modificação se elas não tivessem sido estabelecidas.
E o facto de o adjudicatário ser autorizado a, no decurso da execução da obra, proceder à substituição dos materiais, é totalmente irrelevante para o caso, já que essa substituição não repõe a concorrência que deveria ter ocorrido na escolha das propostas e na formação do preço contratual, antes se fazendo no âmbito de um preço já formado e, portanto, integralmente a favor do adjudicatário.
Em conclusão, mesmo que estejamos perante lapsos, a verdade é que se produziu um efeito discriminatório proibido tanto pela lei nacional como pela comunitária e que existe susceptibilidade de essa circunstância ter afectado o resultado financeiro do procedimento.
Acresce que a 1.ª Secção deste Tribunal tem inúmera jurisprudência concluindo pela ilegalidade da prática referida, nomeadamente os Acórdãos n.ºs 48/04 e 123/05 e a Decisão n.º 754/06, os quais incidiram sobre contratos da Câmara Municipal de Oeiras, em que se suscitava idêntica questão.
Nas referidas decisões, o Tribunal de Contas caracterizou as situações como ilegais e recomendou especificamente a esta autarquia que, em futuros processos, observasse rigorosamente o disposto na lei.
Todas estas recomendações foram formuladas e comunicadas à entidade em data anterior à do lançamento do procedimento em apreciação.
O Município de Oeiras havia, pois, sido atempadamente alertado para a necessidade de dar cumprimento ao disposto nas normas legais relativas às especificações técnicas e, desse modo, podia e devia ter evitado essas ilegalidades, acolhendo no procedimento em causa as recomendações que o Tribunal lhe havia dirigido naquelas decisões.
Entendeu, por isso, a 1.ª instância não haver fundamento para voltar a usar da faculdade a que se refere o n.º 4 do artigo 44.º da LOPTC.
Nenhuma censura merece essa avaliação e decisão.
Informa a autarquia que foi agora emitido um despacho para garantir o cumprimento futuro das referidas recomendações.
Embora não interfira com o juízo já emitido, afigura-se-nos tal procedimento como adequado e prudente.

II.3. DAS HABILITAÇÕES TÉCNICAS EXIGIDAS

Conforme consta do ponto I.9 do Acórdão recorrido, a entidade adjudicante exigiu aos concorrentes a classificação de empreiteiro geral de obras ou construtor geral de edifícios de construção tradicional da classe 7, para além da titularidade de diversas subcategorias para o valor dos respectivos trabalhos especializados.
O mesmo acórdão estabeleceu que essa exigência infringiu o disposto no n.º 1 do artigo 31.º do Decreto-Lei n.º 12/2004, que prescreve a obrigação de, nos concursos de obras públicas, ser exigida uma única subcategoria em classe que cubra o valor global da obra.
O recorrente não contesta a interpretação feita pelo Tribunal do disposto naquela norma legal, aceitando, portanto, que se verificou a ilegalidade identificada.
Vem, no entanto, invocar que se os requisitos de habilitação técnica tivessem sido definidos nos termos previstos na norma e descritos pelo Tribunal no acórdão em recurso (exigindo-se apenas a subcategoria referente ao tipo de trabalhos mais expressivo) tal não alteraria o universo de concorrentes e, consequentemente, o resultado financeiro do procedimento.
Para o efeito, o recorrente define como preponderantes na execução do objecto do contrato de empreitada em causa os trabalhos incluídos na 1.ª subcategoria da 1.ª categoria, correspondente às "Estruturas e Elementos de Betão".
Refira-se que este entendimento não é coincidente com o que foi transcrito no ponto I.9 do acórdão recorrido. Nessa sede, a autarquia considerou que a 2.ª subcategoria da 5.ª categoria correspondia ao maior volume de trabalhos e que as vertentes primordiais para a execução da obra eram, não as infra-estruturas, mas sim a qualidade de execução de balneários, dos pavimentos em relva sintética e a iluminação exterior especializada.
Mas, partindo agora da definição da 1.ª subcategoria da 1.ª categoria como a preponderante para a obra em causa, alega o Município de Oeiras que se "tivesse exigido no procedimento como habilitação a classe 7 (classe mínima que cobre o valor total da empreitada) na 1.ª subcategoria da 1.ª categoria, o número de concorrentes teria sido o mesmo. Porquanto, das quarenta e nove empresas legalmente habilitadas pelo INCI, que são detentoras da classe mínima de 7, na referida subcategoria, são detentores de alvará com classe 7 ou superior na classificação de empreiteiro geral, com excepção da empresa Construtora do Tâmega Madeira, sendo certo que a empresa mãe a Construtora do Tâmega com sede no continente é detentora de alvará com classe 9 na classificação de empreiteiro geral. Este facto pode ser comprovado pela consulta do site do INCI, in www.inci.pt)". "Assim sendo, é inequívoco que tal exigência estabelecida no procedimento do concurso é materialmente impossível de alterar o resultado financeiro do contrato de empreitada, e, por conseguinte, não se subsume na previsão do artigo 44.º, n.º 3, alínea c), da Lei n.º 98/97, de 26 de Agosto".
A lei e a jurisprudência do Tribunal de Contas nesta matéria apontam para que as entidades adjudicantes não possam limitar o acesso aos concursos públicos de empreitada aos detentores do alvará de empreiteiro geral, devendo tão só exigir a posse de alvará referente a uma única subcategoria, para o valor global da obra, a qual deve respeitar ao tipo de trabalhos mais expressivo.
Este regime visa salvaguardar o mais amplo acesso ao mercado, obstando a que a entidade adjudicante estabeleça requisitos habilitacionais excessivos.
Este Tribunal tem entendido que quando são feitas exigências de habilitação técnica superiores às estabelecidas na lei isso conduz à redução do universo de potenciais candidatos, violando-se o princípio da concorrência e verificando-se susceptibilidade de alteração do resultado financeiro, uma vez que se impediu o surgimento de propostas eventualmente mais vantajosas.
O recorrente entende que, mesmo tendo formalmente estabelecido requisitos habilitacionais superiores ao devido, isso não conduziu no caso à alteração do universo de potenciais candidatos, uma vez que o universo de candidatos com alvará de empreiteiro geral na classe exigida é idêntico ao universo de candidatos com alvará na subcategoria e classe que deveria ter sido exigida.
Este argumento, aparentemente relevante, de o risco de alteração do resultado financeiro estar, na prática, afastado neste caso, não é, no entanto, procedente.
Em primeiro lugar, o argumento baseia-se na definição a posteriori da subcategoria relevante.
É certo que cabe à entidade adjudicante defini-la dentro dos parâmetros legais, sendo esse um poder discricionário seu. No entanto, essa definição deve ser feita ab initio e basear-se em elementos objectivamente verificáveis.
Ora, tendo em atenção que a identificação da subcategoria relevante agora feita difere daquela que foi defendida em 1.ª instância, não está seguramente determinado qual teria sido a opção efectuada em termos de exigência habilitacional.
Em segundo lugar, não é possível assegurar que o universo de potenciais concorrentes corresponde apenas ao universo das empresas constantes do site do INCI, já que, em especial no quadro de um concurso público de âmbito internacional, como foi o caso, podem concorrer candidatos nas condições previstas no n.º 5 do artigo 81.º do Código dos Contratos Públicos.
Por último, o raciocínio apresentado pelo recorrente assenta na exigibilidade do alvará correspondente à classe 7 enquanto "classe mínima que cobre o valor total da empreitada", sendo apenas válido para as autorizações dessa classe.
Ora, nos termos da Portaria n.º 137/2008, de 2 de Dezembro, em vigor desde 1 de Fevereiro de 2009 (4), a classe 7 dos alvarás é exigida para obras até ao valor de € 10.624.000,00, enquanto a classe 6 é adequada à realização de obras até ao montante de € 5.312.000,00.
Recordando que o contrato foi celebrado pelo valor de € 3.565.316,29, fácil é concluir que a classe 6 era suficiente para a execução da obra, não sendo exigível a classe 7 como mínima.
Certamente que a autarquia exigiu a classe 7 por ter fixado um preço base de €5.521.395,04, mas, conforme já lhe foi referido no Acórdão n.º 28/2010-13.JUL-1.ªS/SS, o valor global da obra só é determinado em rigor quando se toma a decisão de adjudicação.
Assim, a exigência de uma classe determinada não deve ser feita nos documentos do concurso. Deve exigir-se tão só classe que cubra o valor global da obra, a qual é reportada ao valor da proposta de cada concorrente e, no momento da adjudicação e celebração do contrato, ao valor adjudicado.
No caso, a obra veio a ser adjudicada por um valor para o qual era suficiente a classe 6.
Tendo sido exigida a classe 7, também pela via da classe as habilitações técnicas foram definidas de forma excessiva.
Assim sendo, e porque para a obra em causa eram suficientes alvarás da classe 6, não pode dar-se como válido o argumento de que, na prática, não haveria alteração do universo concorrencial caso as habilitações tivessem sido correctamente fixadas.
Em consequência, mantém-se a validade do juízo formulado em 1.ª instância.
Também em matéria de habilitações técnicas o Município de Oeiras havia sido destinatário de recomendações formuladas anteriormente ao lançamento do procedimento, no Acórdão n.º 360/2006 e na Decisão n.º 749/2008.
Razão por que, também nesta matéria, não se vê fundamento para alterar a decisão proferida no acórdão recorrido no sentido de não fazer uso da faculdade prevista no artigo 44.º, n.º 4, da LOPTC. 

III. DECISÃO

Assim, pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes da 1ª Secção do Tribunal de Contas, em Plenário, em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida e mantendo a recusa do visto ao contrato em questão.
São devidos emolumentos nos termos da al. b) do n.º 1 do artº 16° do Regime Jurídico dos Emolumentos do Tribunal de Contas, anexo ao Decreto-Lei nº 66/96, de 31 de Maio.  
Lisboa, 23 de Novembro de 2010

Os Juízes Conselheiros, - (Helena Abreu Lopes) - (António Santos Carvalho) -  (Manuel Mota Botelho) 

O Procurador-Geral Adjunto - (Jorge Leal) 


(1) Lei nº 98/97, de 26 de Agosto, com as alterações introduzidas pelas Leis nºs 87-B/98, de 31 de Dezembro, 1/2001, de 4 de Janeiro, 55-B/2004, de 30 de Dezembro, 48/2006, de 29 de Agosto, 35/2007, de 13 de Agosto, e 3-B/2010, de 28 de Abril.
(2) Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de Janeiro, rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 18-A/2008, de 28 de Março, e alterado pela Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro, pelo Decreto-Lei n.º 223/2009, de 11 de Setembro, pelo Decreto-Lei n.º 278/2009, de 2 de Outubro, e pela Lei n.º 3/2010, de 27 de Abril.
(3) Cfr. artigo 23.º, n.º 8, da Directiva 2004/18/CE.
(4) Tal como consta do ponto I.1 do acórdão recorrido, o concurso foi aberto em Março de 2009, a adjudicação foi feita em Fevereiro de 2010 e o contrato outorgado em Março de 2010.