Acórdão n.º 25/2010, de 7 de Outubro de 2010, do Plenário da 1.ª Secção do Tribunal de Contas (proc. n.º 1861/2009)

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ACÓRDÃO Nº 25/2010 - 07/OuT./2010 - 1ª SECÇÃO/PL

RECURSO ORDINÁRIO Nº 36/2009

(PROCESSO Nº 1861/2009 - 1.ª SECÇÃO)

  

I. RELATÓRIO

1.O Hospital do Litoral Alentejano, abreviadamente, HLA, pessoa colectiva de direito público, com sede em Monte de Gilbardinho, Santiago do Cacém, inconformado com o teor do Acórdão n.º 167/2009, de 20.11, e que recusou o visto ao denominado "Protocolo n.º DCS/2105/01/2008, celebrado entre aquele Hospital e o Serviço de Utilização Comum dos Hospitais - SUCH", que tem por objecto a "execução da obra de remodelação da instalação de ar condicionado dos serviços de medicina física e de reabilitação, consultas externas, esterilização, oftalmologia e quartos de isolamento", no valor de € 622 518,00, acrescido de IVA, veio do mesmo interpor recurso jurisdicional, concluindo como segue:
(...)
A) O acórdão recorrido negou a concessão de visto ao protocolo n.º DCS/2105/01/2008 celebrado entre o ora recorrente e o Serviço de Utilização Comum dos Hospitais - SUCH por considerar que deveria ter sido precedido de concurso público, facto que não se verificou, verificando-se, assim, nulidade no procedimento de contratação, fundamentadora de recusa de visto pelo Tribunal de Contas;
B) Porém, a contratação em causa encontra-se dispensada de observância  de procedimento concursal, porque integrada na previsão do disposto no artigo 5º nº 2 do Código dos Contratos Públicos (CCP) aprovado pelo Decreto-Lei nº 18/2008 de 29 de Janeiro;
C) Na verdade, ora recorrente, adjudicante, tem a natureza de pessoa colectivade Direito Público integrada no SPA (cfr. supra 3 deste recurso);
D)O adjudicatário tem a natureza de uma associação de Direito privado e utilidade pública administrativa;
E) Entre o adjudicante e restantes associados de Direito público e instituições de utilidade pública e  o SUCH existe uma relação de controlo análogo ao exercido sobre os seus próprios serviços, convergindo ambos na prossecução do interesse público e sob tutela do Ministério da Saúde, sendo que,
F) O essencial da actividade do  adjudicatário SUCH consiste na autosatisfação das necessidades dos seus associados, entre os quais se encontra o ora recorrente, adjudicante, e não no exercício de actividade económica lucrativa sujeita à concorrência e livre funcionamento do mercado,
G)O protocolo objecto de apreciação pelo acórdão recorrido foi celebrado no âmbito da actividade cooperativa do SUCH, para auto-satisfação das necessidades do seu associado HLA, encontrando-se abrangido pelo disposto no artigo 5º nº 2 do CCP, pelo que,
H) Não está sujeito a procedimento prévio de concurso público, não se verificando a nulidade consistente na sua omissão,
I) Devendo conceder-se o respectivo visto pelo Tribunal de Contas por se não descortinar qualquer ilegalidade procedimental;
J) Ao decidir em sentido contrário, o douto acórdão recorrido violou, por errode interpretação, os artigos 1º nº 2, 2º nºs 1 e 2, 5º nº 2, 19º e 32 nº 2 al a) do CCP, 133 nº 1 do Código de Procedimento Administrativo e artº 44 nº 3 da Lei nº 98/97 de 26 de Agosto, devendo ser revogado com todas as legais consequências."
A final, e peticionando, o recorrente requer seja dado provimento ao recurso e, em consequência, seja revogado o Acórdão recorrido, permitindo-se, assim, a manutenção do Protocolo n.º DCS/2105/01/2008, e nos precisos termos em que foi celebrado com o Serviço de Utilização Comum dos Hospitais - SUCH.

2.O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto, em douto Parecer, pronunciou-se no sentido da adesão aos fundamentos do Acórdão recorrido, advogando, a final, a improcedência do recurso.

3.Foram colhidos os vistos legais.


II. FUNDAMENTAÇÃO
  

Ao longo do Acórdão recorrido considerou-se estabelecida, com relevância para a análise em curso, a factualidade inserta no intróito deste Acórdão e ainda  a seguinte:
(...)
1.Por deliberação tomada em 6  de Maio de 2009, o Conselho de Administração do Hospital, determinou adjudicar, por ajuste directo, ao  SUCH, as obras de remodelação das instalações técnicas especiais de aquecimento, ventilação e ar condicionado dos Serviços de Consulta Externa, Medicina  Física e Reabilitação, Esterilização, quartos de isolamento e oftalmologia do Hospital do Litoral Alentejano;
2.Nessa deliberação, o Conselho de Administração justificou a adopção do procedimento por ajuste directo, do seguinte modo:
"... O Hospital do Litoral Alentejano é associado de pleno direito do Serviços de Utilização Comum dos Hospitais (SUCH);
O SUCH possui a natureza originária de pessoa colectiva de utilidade pública administrativa tendo por objectivo a prestação de serviços aos seus associados com vista a um funcionamento mais ágil e eficiente destes e em regime material de entreajuda num plano materialmente cooperativo.
A actuação do SUCH, no exercício da prestação de serviços aos seus associados, em regime de cooperação e entreajuda e sem apelo a recursos exteriores, mostra-se excluída dos pressupostos de aplicação do regime jurídico dos diplomas legais que visam salvaguardar os princípios da concorrência e da imparcialidade bem como garantir a igualdade de tratamento dos operadores que pretendam contratar com a Administração.
A actividade do SUCH é condicionada, estatutariamente, em primeira linha, à auto-satisfação das necessidades dos associados, pelo que no relacionamento entre ambos, no caso concreto, entre o mesmo e o Hospital do Litoral Alentejano, não vigora a concorrência não tendo a actuação do SUCH por fim principal o lucro.
Em consonância com o exposto, deve aplicar-se à prestação de serviços pelo SUCH ao Hospital, seu associado o regime da denominada contratação "in house" prevista no artº 5º do CCP...".

3.O contrato foi assinado em 6 de Maio de 2009;

4.Nos termos do nº1, da sua cláusula primeira, o Protocolo tem por objecto a "execução das obras necessárias para a Remodelação da Instalação de Ar Condicionado dos Serviços de Medicina Física e Reabilitação, Consultas Externas, Esterilização, Oftalmologia e Quartos de Isolamento, com base no projecto aprovado pelo HLA, as quais decorrerão de modo faseado";

5.Entre outros, a execução das obras referidas na alínea anterior, compreende os seguintes trabalhos: 

I - Reforço da climatização:
- Produção de frio e rede geral
- Consultas externas
- Medicina física e reabilitação
- Esterilização
- Quartos de isolamento
- Oftalmologia 

II - Gestão Técnica centralizada que abarca:
- Produção de Frio e Rede Geral
- Consultas Externas
- Medicina Física e Reabilitação
- Esterilização
- Oftalmologia 

REFORÇO DE CLIMATIZAÇÃO

Produção de Frio e Rede Geral

I - Instalação Nova - a executar

Fornecimento e montagem de equipamentos

1.Grupo Chiller..........................................

100.000,00

2.Grupos electrobombas.......... ...................

3.500,00

3.Redes de tubagens.................................

53.342,00

4.Instalação eléctrica..................................

2.500,00

II- Instalação existente

Desmontagem, alteração e/ou modificação instalações

 

1. Alteração rede hidráulica central térmica

 

3.000,00

2.Remoção para local a definir

500,00

III- Trabalhos gerais

24.947,00

Total

187.789,00

 

REFORÇO DE CLIMATIZAÇÂO

Consultas externas

I - Instalação nova - a executar

Fornecimento e montagem de equipamentos

1. Unidades de tratamento de ar

8.500,00

2. Ventiloconvectores

13.923,00

3. Ventiladores extracção

1.200,00

4. Rede de distribuição ar

21.109,00

5. Redes de Tubagens

10.637,00

6. Instalação eléctrica

3.000,00

II - Instalação existente

Desmontagem e alteração e/ou modificação instalações

1. Desmontagem rede hidráulica e aerólica

5.000,00

2. Desmontagem instalação eléctrica

1.250,00

3. Limpeza interior condutas

1.000,00

4. Remoção dos equipamentos a desmontar

1.000,00

III - Trabalhos Gerais

1.Ensaios, arranque, afinações, telas finais instalação.

1.000,00

2. Estruturas metálicas apoio equipamentos

1.500,00

3. Apoio de construção civil

12.507,00

Total

81.626,00

 

REFORÇO DE CLIMATIZAÇÂO

Medicina física e de reabilitação

I - Instalação nova - a executar

Fornecimento e montagem de equipamentos

1. Unidades de tratamento de ar

8.500,00

2. Ventiloconvectores

10.292,00

3. Ventiladores extracção

1.500,00

4. Rede de distribuição ar

8.780,00

5. Redes de Tubagens

10.635,00

6. Instalação eléctrica

2.200,00

II - Instalação existente

Desmontagem e alteração e/ou modificação instalações

1. Desmontagem rede hidráulica e aerólica

1.000,00

2. Desmontagem instalação eléctrica

400,00

3. Limpeza interior condutas

1000,00

4. Remoção dos equipamentos a desmontar

500,00

III - Trabalhos Gerais

1.Ensaios, arranque, afinações, telas finais instalação.

1000,00

2. Estruturas metálicas apoio equipamentos

-

3. Apoio de construção civil

9.369,00

Total

55.426,00

 

REFORÇO DE CLIMATIZAÇÃO

Esterilização

I - Instalação nova - a executar

Fornecimento e montagem de equipamentos

1. Unidades de tratamento de ar

8.500,00

2. Ventiloconvectores

1320,00

3. Ventiladores extracção

3.200,00

4. Humidificadores

4000,00

5. Rede de distribuição ar

20.992,00

6. Redes de Tubagens

9.201,00

7. Rede eléctrica

1.700,00

II - Instalação existente

Desmontagem e alteração e/ou modificação instalações

1. Desmontagem rede hidráulica e aerólica

2500,00

2. Desmontagem instalação eléctrica

1000,00

3. Limpeza interior condutas

300,00

4. Remoção dos equipamentos a desmontar

1000,00

III - Trabalhos Gerais

1.Ensaios, arranque, afinações, telas finais instalação.

1000,00

2. Estruturas metálicas apoio equipamentos

incluido

3. Apoio de construção civil

6.106,00

Total

60.819,00

 

6.Estipula, por seu lado, o nº2 da mesma cláusula que  "para a execução dos trabalhos previstos no ponto anterior, o SUCH fica desde já autorizado arecorrer a meios disponibilizados por empresas da especialidade";
7.O prazo de execução dos trabalhos é de 210 dias, a contar da data da consignação de obra (nº1, da cláusula 4ª);
8.Nos termos do nº1, da cláusula 11ª, do Protocolo, o pagamento dos trabalhos farse-á da seguinte forma: 

1 - 30% do preço, com a celebração do Protocolo.
2  - O remanescente, através da apresentação, por parte do  SUCH, de autos de medição, elaborados com observância do disposto nos artigos 387º e seguintes do Código dos Contratos Públicos.

9.Os novos Estatutos do  SUCH foram publicados no Diário da República, 2ª Série, (Parte Especial), de 29 de Dezembro de 2006, tendo, no entender, do próprio SUCH, reforçado a sua natureza associativa e privada;
10.Nos termos do artigo 2º, n.º 1, desses Estatutos, o SUCH tem por objecto tomar a seu cargo iniciativas susceptíveis de contribuir para o funcionamento mais ágil e eficiente dos seus Associados, designadamente, prestando-lhes assistência técnica no domínio das instalações e equipamentos, assegurando a exploração ou a gestão de instalações técnicas e áreas industriais, incluindo lavandarias, centrais e transportes e constituindo unidades de serviços partilhados.
11.Por seu turno, o artigo 6º dos Estatutos do SUCH estabelece:
"... 1. Podem ser associados do SUCH as entidades, públicas ou privadas, que integrem o sistema de saúde português, bem como todas as instituições particulares de solidariedade social ou outras pessoas colectivas de utilidade pública administrativa que desenvolvam actividades de promoção e protecção da saúde.
2. Podem ser associados do SUCH serviços pertencentes ao Ministério da Saúde ou dele dependentes...".

12.Em 31de Dezembro de 2008, o  SUCH tinha 95 associados, entre  os quais se contam entidades do Sector Público Administrativo, Institutos Públicos, Entidades Públicas Empresariais, Instituições Particulares de Solidariedade Social, Pessoas Colectivas de Direito Privado e Utilidade Pública Administrativa, uma Cooperativa (CESPU) e um Hospital Privado (Hospital dos Lusíadas).
13.O Hospital do Litoral Alentejano é um desses 95 associados.
14.Nos termos do artigo 7º dos Estatutos do SUCH, são direitos dos associados:

"...1. a) Usufruir dos serviços prestados pelo SUCH nos termos que forem regulamentados;
b) Eleger os membros não nomeados dos órgãos sociais do SUCH;
c) Apresentar todas as propostas que julguem de interesse para a melhor prossecução dos fins do SUCH;
d) Reclamar perante o Conselho de Administração dos actos que considerem lesivos dos seus interesses;
e) Recorrer para a Assembleia-Geral dos actos do Conselho de Administração que julguem irregulares;
f) Examinar, na sede do SUCH, o orçamento e o relatório e contas.
2. Os associados podem apresentar à Assembleia-Geral propostas para a constituição da Mesa da Assembleia-Geral, do Conselho Fiscal e da Comissão de Vencimentos.".

15.Nos termos do artigo 10º dos Estatutos do SUCH, são órgãos deste, a Assembleia Geral, o Conselho de Administração e o Conselho Fiscal.
16.De acordo com o artigo 12º, dos mesmos Estatutos, a Assembleia-Geral é constituída por representantes de todos os associados.
17.Por força do artigo 15º, ainda dos Estatutos, compete à Assembleia-Geral:

- Eleger e destituir os membros não nomeados dos órgãos do SUCH;
- Apreciar e aprovar os planos estratégicos e de actividades;
- Apreciar e aprovar o relatório e contas do exercício anual;
- Pronunciar-se sobre a gestão do SUCH;
- Deliberar, por maioria de três quartos dos associados presentes, sobre alterações aos estatutos;
- Deliberar, por maioria de três quartos do número total de associados, sobre a dissolução do SUCH;
- Deliberar, por proposta do Conselho de Administração, sobre a realização de empréstimos e a aquisição, alienação ou oneração de bens imóveis;
- Deliberar, segundo proposta do Conselho de Administração, sobre a participação do  SUCH noutras pessoas colectivas, nomeadamente, subscrição de participações, quotas ou acções na sua constituição, aquisição de participações, quotas ou acções em pessoas colectivas já constituídas ou adesão a associações constituídas ou a constituir;
- Conhecer dos recursos interpostos da recusa de admissão como associados do SUCH;
- Pronunciar-se sobre as questões que lhe sejam apresentadas nos termos regulamentares;
- Aprovar o regulamento de quotização proposto pelo Conselho de Administração.

18. O número de votos de cada associado na Assembleia-Geral é determinado pelo valor percentual dos serviços adquiridos relativamente à facturação total do SUCH(cfr. artigo 14.º, n.º 6 dos Estatutos).
19. Nos termos do artigo 16º dos Estatutos, o Conselho de Administração do SUCH é composto por um Presidente, um Vice-Presidente e três Vogais. O Presidente e o Vice-Presidente são nomeados pelo Ministro da Saúde e os três Vogais são eleitos em Assembleia-Geral.
20. De acordo com o artigo 17º, ainda dos Estatutos, o Conselho de Administração assegura a gestão da associação, mediante o plano de actividades e o orçamento aprovado pela Assembleia-Geral.
21. O Conselho Fiscal, composto por três membros, é eleito em Assembleia-Geral (cfr. artigo 22º).
22.A intervenção do Ministro da Saúde traduz-se em:

- Nomear o Presidente e o Vice-Presidente do Conselho de Administração (artigo 16.º, n.º 2);
- Exercer a tutela sobre o SUCH (artigo 4.º);
- Homologar as alterações aos Estatutos aprovadas em Assembleia-Geral (artigo 15.º, n.º 2);
- Homologar a dissolução do SUCH, aprovada em Assembleia-Geral (artigo 15.º, n.º 2);
- Homologar a contracção de empréstimos que impliquem um nível de endividamento líquido igual ou superior a 75% dos capitais próprios apurados no exercício do ano transacto (artigo 15.º, n.º 3).

23. O artigo 2º, n.º 2, dos Estatutos estabelece, por sua vez, que, para além de ser um instrumento de auto-satisfação das necessidades dos seus associados, o  SUCH pode ainda, no regime de concorrência e de mercado, desenvolver actividades em todas as áreas de apoio das instituições e serviços que integram o sistema de saúde português, sejam ou não seus associados. O n.º 4 refere, ainda, que o SUCH pode alargar as suas actividades a instituições públicas ou privadas, nacionais ou estrangeiras, desde que não resulte qualquer prejuízo para os associados e haja vantagem no plano económico e em matéria de enriquecimento e valorização tecnológica;
24. A fls. 29 e segs. do 2º volume do presente processo, constam umas listagens de clientes e de facturação, relativamente a diversas áreas de negócio do  SUCH (Energia, Manutenção, Projectos e Obras, Segurança e Controlo Técnico, Limpeza Hospitalar, Resíduos e Nutrição), registando-se aí, como clientes, entidades privadas, como, por exemplo, British Hospital Lisbon XXI, S.A., Clínica de Montes Claros, Lda., Clínica Particular de Barcelos, Lda., Controlvet Segurança Alimentar, DALKIA- Energia e Serviços, S.A., Farma APS- Produtos Farmacêuticos, S.A., Ferticentro- Centro de Estudos de Fertilidade, S.A., IMAGRAN- Lab. de Imagiologia da Marinha Grande, Imalis- Meios Diagnósticos de Imagiologia de Leiria, Lda., Intercir- Centro Cirúrgico de Coimbra, Lda., SECIL- Companhia Geral de Cal e Cimento, S.A., Sociedade da Água do Luso, SOMINCOR- Sociedade Mineira de Neves Corvo, S.A.,  AICCOPN- Assoc. Indust. Const. Civil e Obras Públicas, Ensinave- Educação e Ensino Superior Alto Ave, Lda., Abbott Laboratórios, Lda., Codan Portugal Instrumentos Médicos, S.A., Serunion Restaurantes de Portugal, S.A., HPP Saúde- Hospital Privado de Santa Maria de Faro, Hospital Particular de Viana do Castelo, Lda., ACOS- Laboratório Veterinário de Beja, Ginásio Clube Português, Sociedade de Construções Soares da Costa, S.A., Tecnovia AçoresSociedade de Empreitadas, S.A., SAMS, Clínica CUF Torres Vedras, S.A., Dr. Joaquim Chaves Laboratório de Análises Clínicas, S.A., Eurest Portugal  - Soc. Europeia de Restaurantes, Lda., Ambitral Transporte de Resíduos, Lda., entre muitos outros, em que se incluem farmácias, clínicas, laboratórios clínicos, laboratórios farmacêuticos, lares, etc.
25.A fls. 29 do 2º volume do processo, constam dados relativos ao volume de negócios do  SUCH, em 2008, e respectiva facturação, onde se mostra que, em 2008, foram facturados a entidades não associadas do  SUCH, 21.614.562,09 €, representando 24,6% da facturação.
26. Dos mesmos dados, resulta que a facturação a entidades privadas, no referido ano de 2008, foi de 7.484.990,73 €, representando 8,52% do total.
27. O artigo 2º, nº 3, dos Estatutos do  SUCH estipula que as unidades de serviços partilhados, constituídas pelo  SUCH, podem ser constituídas sob a forma de unidades orgânicas do mesmo  SUCH ou sob a forma de pessoas colectivas, integradas pelo SUCH e pelos seus associados e/ou por terceiras entidades.
28. O artigo 3º dos mesmos Estatutos, determina que, sempre que tal se mostre de interesse para a prossecução do seu objecto, o SUCH pode instituir ou participar na constituição de associações, sociedades ou pessoas colectivas de outra natureza, bem como adquirir ou alienar participações sociais.
29. No ponto IV.2.10, do Relatório de Gestão e Contas de 2008 do SUCH, junto a fls. 92 e segs. do 2º volume do processo, refere-se:
"... Tendo presente a publicação do novo Código dos Contratos Públicos - CCP, através do Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de Janeiro, que veio unitariamente estabelecer a disciplina aplicável à formação dos contratos públicos, assumiu particular importância o enquadramento geral das relações entre os SUCH e os seus Associados públicos face às  normas aplicáveis, no ordenamento jurídico nacional e comunitário, em matéria de contratação pública.
Em sede de aprofundamento destas matérias jurídicas, e tendo por base uma interpretação teleológica conforme às normas comunitárias, considerase possível reconduzir as relações estabelecidas entre o SUCH e os seus associados públicos à figura das relações in house, com a consequente exclusão dos acordos celebrados no âmbito dessa relação jurídica da esfera de aplicação das regras sobre contratação pública, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 5.º do CCP.
Embora, desde sempre se tenha entendido e, portanto, defendido, que o SUCH, como organismo de direito privado não está sujeito à disciplina da contratação pública, a verdade é que, também desde sempre, se tem propugnado pelo respeito rigoroso dos princípios da boa fé, transparência, publicidade, igualdade e concorrência na formação dos contratos a celebrar pelo SUCH...".

III. O DIREITO  

Como bem decorre do Acórdão n.º 167/2009, proferido em 20.11.2009 e o âmbito da 1.ªS/SS, a decisão de recusa do visto ao Protocolo celebrado entre o Hospital do Litoral Alentejano [actualmente, Hospital do Litoral Alentejano, E.P.E., por força do Decreto-Lei n.º 30372009, de 22.10], ora recorrente, e o Serviço de Utilização Comum dos Hospitais  [abreviadamente,  SUCH], radica básica e essencialmente, no seguinte:

§ A relação estabelecida entre o SUCH e os seus associados públicos, onde se inclui o recorrente, não traduz uma relação meramente interna equiparável à existente entre a entidade adjudicante e os serviços;
§ Não ocorre, pois, a excepção prevista no art.º 5.º, n.º 2, do Código dos Contratos Públicos, a qual determina a inaplicabilidade do regime consagrado neste diploma legal sempre que, por um lado, a entidade adjudicante exerça sobre uma outra entidade co-contratante um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços e, por outro, que esta última entidade desenvolva o essencial da sua actividade em benefício de uma ou várias entidades adjudicantes que exerçam sobre ela o controlo análogo;
§ Equiparando-se o presente Protocolo a um contrato público de aquisição de serviços, sendo aplicável "in casu", o Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º18/2008, de 29.01, e não se verificando a excepção a que alude o art.º 5.º, daquele diploma legal, impunha-se, no âmbito da presente aquisição de serviços, o recurso ao concurso público ou concurso limitado por prévia qualificação, com publicitação no Jornal Oficial da União Europeia;
§ A ausência de concurso, claramente obrigatório e também elemento essencial de adjudicação, gera a nulidade do contrato [vd. art.º 283.º, n.º 1, do C.C.P.] que, por sua vez, constitui fundamento de recusa do visto [vd. art.º 44.º, n.º 3,al. a), da LOPTC]. 

Por seu turno, a entidade recorrente impugna o decidido, sustentando, no essencial, a sua influência determinante sobre o SUCH, quer em termos estratégicos, quer ainda sobre as decisões que lhe respeitem e que venham a ser tomadas no âmbito do SUCH. Ou seja, e indo ao encontro do teor das alegações produzidas  e juntas pelo  Hospital do Litoral Alentejano, este exerceria sobre o SUCH um controlo análogo ao exercido sobre os seus próprios serviços, facto que, "in casu", determinaria a inaplicabilidade da disciplina contida no Código dos Contratos Públicos [vd. art.º 5.º, n.º 2, al. a)]. Logo, e em conformidade, insubsistiria razão para a recusa do visto.
Sumariada a matéria sob controvérsia, passaremos a evidenciar as questões relevantes que daí emergem e que requerem análise, as quais, desde já, se enunciam:

§ Protocolo submetido a visto e respectiva natureza;
§ Entidades intervenientes - Hospital do Litoral Alentejano e SUCH - e respectiva natureza jurídica.
§ Contratação "in House". [IN] Verificação dos requisitos fixados no art.º 5.º, n.º 2, do Código dos Contratos Públicos.
§ O caso em apreço.
§ Pareceres emitidos pelo Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República. 

1. Do Protocolo

O Protocolo sob apreciação  celebrado entre o Hospital do Litoral Alentejano [doravante,  HLA] e o Serviço de Utilização Comum dos Hospitais  [doravante, SUCH] tem por objecto  [vd. cláusula primeira, n.º 1] e execução das obras necessárias para a remodelação da instalação de ar condicionado dos serviços de Medicina Física e Reabilitação, Consultas Externas, Esterilização, Oftalmologia e Quartos de Isolamento.
Ainda segundo a cláusula 11.ª, do referido Protocolo, o SUCH terá direito ao pagamento do preço dos trabalhos a efectuar e pela forma aí regulada.
É, assim, inequívoco que o acordo em apreço assume carácter sinalagmático e obrigacional.
O Protocolo sob análise radica ainda  num encontro de vontades entre duas pessoas jurídicas distintas que, entre si, não mantêm alguma relação hierárquica.
Aqui chegados, já é seguro afirmar que o presente Protocolo se assume como um verdadeiro contrato.

1.1
Questionar-se-á:

§ Como caracterizar e identificar o referido contrato?

No encontro da resposta à interrogativa formulada, importa, desde já, sublinhar que o contrato acima referenciado é integrado por múltiplas e diversas prestações abrigáveis a vários contratos típicos. Depara-se-nos, assim,  uma verdadeira unicidade contratual suportada num único procedimento.
Para além disso, ao prever prestações próprias de diferentes contratos típicos, o presente contrato [Protocolo] assume-se como um verdadeiro contrato misto, atente a sua clara integração na definição que, a propósito, consta do art.º 32.º, do Código dos Contratos Públicos, e ainda da Directiva n.º 2004/18/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31.03., que aquele diploma legal incorporou.
E, perseguindo ainda a enunciada caracterização do Protocolo ou contrato misto em apreço, recorta-se na aludida Directiva, e com relevância, o seguinte:

§ Nos termos do art.º 1.º, n.º 2, al. b), da referida Directiva, Contratos de empreitada de obras públicas "são contratos públicos que têm por objecto, quer a execução, quer conjuntamente a concepção e execução, quer ainda a realização, por qualquer meio, de trabalhos relacionados com uma das actividades na acepção do Anexo I ou de uma obra satisfaça as necessidades especificadas pela entidade adjudicante" (1);
§ Ainda no citado art.º 1.º, n.º 2, al. c), da Directiva em causa, " Contratos públicos de fornecimento são contratos públicos, que não os abrangidos pela alínea b), tendo por objecto a compra, a locação financeira, a locação ou a locação-venda, com ou sem opção de compra, de produtos".

Na referida alínea c), consigna-se também que é considerado "contrato público de fornecimento, o contrato público que tenha por objecto o fornecimento de produtos e, a título acessório, operações de montagem e instalação".

Tendo presente o teor do presente Protocolo e, mais particularmente, o seu objecto [execuções de obras de remodelação de ar condicionado] e confrontando-o com a normação citada e constante daquela Directiva, é indubitável que os trabalhos que aquele encerra conduzem à definição  do presente contrato como um verdadeiro contrato de empreitada de obras públicas que, claramente e no caso  "sub judice", ainda se revela oneroso.
Resta, pois, afastada a eventual caracterização e identificação do Protocolo como contrato público de fornecimento [a factualidade disponível não se contem no art.º 1.º, n.º 2, al. b), da Directiva n.º 2004/18/CE] e ainda como contrato público de serviços, atento o disposto no art.º 1.º, n.º 2, al. d), da Directiva em apreço.                                              
O contrato de empreitada de obras públicas [materializado no Protocolo] reveste-se ainda de natureza administrativa, pois a relação orgânica do Hospital do Litoral Alentejano com o Ministério da Saúde, a particularidade de aquele ser uma entidade adjudicante [vd. art.º 3.º, da Lei n.º 3/2004, de 15.01 e art.º 2.º, n.º 1, al. d), do C.C.P.], a circunstância do objecto do Protocolo em causa se traduzir em prestações atinentes ao funcionamento e gestão de um serviço público e, por último, a circunstância de se verificar uma inclusão de tais contratos na categoria de contratos administrativos  [vd. taxatividade legal expressa nos art.os1.º, n.º 6, als. a) e c), e 278.º, do C.C.P.], constituem factores que, inevitavelmente, conferem bondade à sustentada qualificação jurídico-contratual.
O presente Protocolo configura, pois e ainda, um contrato público, que se submete à disciplina contida no Código dos Contratos Públicos e bem assim à legislação comunitária aplicável neste domínio. 

2. O SUCH e o Hospital do Litoral Alentejano

Respectiva natureza jurídica e relação institucional.

2.1.
O SUCH é, à luz dos Estatutos publicados na II Série do Diário da República em 29.12.2006, uma pessoa colectiva de utilidade pública administrativa e tem por objecto o funcionamento mais ágil e suficiente dos seus associados através de assistência técnica no domínio do equipamento e instalações, promoção de acções no âmbito da investigação e desenvolvimento tecnológico,  constituição de unidades de serviços partilhados destinadas a assegurar aos seus associados serviços de apoio à prestação dos cuidados de saúde [aqui se incluindo a gestão integrada de recursos humanos, administrativa e financeira], para além de outras atribuições inscritas no art.º 2.º dos mencionados Estatutos, que aqui se dão por inteiramente reproduzidos.
O SUCH, ainda de acordo com o art.º 2.º, n.º 2, dos Estatutos, para além do instrumento de auto-satisfação das necessidades dos seus associados,  pode, ainda no regime de concorrência e de mercado, desenvolver actividades em todas as áreas de apoio das instituições e serviços que integram o sistema de saúde português, sejam ou não seus associados.
O SUCH pode ainda alargar as suas actividades a instituições públicas ou privadas, nacionais ou estrangeiras, desde que verificados os pressupostos indicados nos Estatutos, e melhor elencados sob as alíneas. a) e b) acima desenvolvidas.
Podem ser associados do  SUCH as entidades, públicas ou privadas, que integrem o sistema de saúde português, bem como todas as instituições particulares de solidariedade social ou outras pessoas colectivas de utilidade pública administrativa que desenvolvam actividades de promoção e protecção da saúde [vd. art.º 6.º, n.º 1, dos Estatutos].
Acresce que, ainda nos termos do art.º 2.º, n.º 3, dos Estatutos,  as unidades de serviços partilhadas constituídas pelo  SUCH podem assumir a forma de unidades orgânicas do SUCH ou de pessoas colectivas integradas pelo SUCH e pelos seus associados e/ou por terceiras entidades.
Ainda nos termos do art.º 3.º, dos Estatutos, sempre que tal se mostre de interesse para a prossecução do seu objecto, o SUCH pode instituir ou participar na constituição de associações, sociedades ou pessoas colectivas de outra natureza, bem como adquirir e alienar participações sociais.
A tutela sobre o  SUCH é exercida pelo Ministro da Saúde, sendo que, como também resulta dos Estatutos, cabe a este a nomeação do Presidente e Vice Presidente do Conselho de Administração, a homologação das alterações aos Estatutos aprovadas em Assembleia-Geral, a homologação da dissolução do SUCH, também aprovada em Assembleia-Geral e, por fim, homologa a contracção de empréstimos que impliquem um nível de endividamento líquido igual ou superior a 75% dos capitais próprios apurados no exercício do ano transacto [vd. art.º 15.º].
Confrontando os Estatutos aprovados em 1996 com os Estatutos ora em vigor e reportados a 2006, mostra-se claro o enfraquecimento crescente dos poderes tutelares e de controlo do Estado, reforçando-se, ao invés, a natureza privada e associativa dos SUCH.
Assim, a consideração da componente estatutária que define a constituição, natureza e fins do  SUCH, e ainda no apelo à melhor doutrina convocável na matéria sob análise, é possível concluir, com relevância, o seguinte:

§ O SUCH, sendo uma pessoa colectiva de utilidade pública administrativa, deve ser considerada pessoa colectiva de direito privado, como, de resto, vem sendo entendido pela doutrina dominante, não integrando a Administração Pública, mas colaborando com esta; (2)
§ Estatutariamente, nada impede que figurem entidades privadas como associadas do SUCH;
§ O SUCH, enquanto associação, poderá constituir unidades de serviços partilhados, as quais poderão assumir a forma de pessoas colectivas integradas pelo SUCH e pelos seus associados e/ou terceiras pessoas. 

A evidenciação das particularidades referidas e que assentam nos Estatutos que regem o  SUCH, visa, tão-só, a melhor apreensão das razões que sustentam o entendimento que expressaremos quanto à sujeição ou não às regras da contratação pública de contratos e protocolos em que o  SUCH figure como celebrante, sempre na esteira do disposto no art.º 5.º, n.º 2, do Código dos Contratos Públicos.

2.2.
O Hospital do Litoral Alentejano [abreviadamente, HLA] é, segundo o Decreto--Lei n.º 172/2003, de 01.08, um estabelecimento público dotado de personalidade jurídica, autonomia administrativa, financeira e patrimonial.
Tal como se desenvolve no domínio do acórdão recorrido, aquele Hospital, por força do art.º 3.º, da Lei n.º 3/2004 (3), de 15.01, tem a natureza de instituto público, sendo, como também já se afirmou acima, uma entidade adjudicante.                                                
Presentemente, e em razão do Decreto-Lei n.º 303/2009, de 22.10, o Hospital do Litoral Alentejano passou a constituir uma entidade pública empresarial [EPE], com a designação "Hospital do Litoral Alentejano, EPE, cujos estatutos constam do Anexo II ao Decreto-Lei n.º 233/2005, de 29.12, e com as especificidades inscritas no Anexo ao Decreto-Lei n.º 303/2009.
Esta entidade pública empresarial sucedeu ao HLA em todos os direitos e obrigações [vd. art.º 2.º, do Decreto-Lei n.º 303/2009].
Resta, assim, caracterizada a entidade recorrente, seja no tocante à sua  natureza jurídica, seja ainda no respeitante à sua missão e atribuições.
Caracterização essa que constitui o pressuposto referencial da abordagem que, de seguida, implementaremos e que incidirá sobre o conceito denominado "contratação "in house" ". 

3. Da contratação "in house".

Sujeição do Protocolo ao Regime da Contratação Pública

3.1.
Sob a epígrafe "contratação excluída", o art.º 5.º, do C.C.P., dispõe:
"(...)
2. A parte II do presente Código também não é aplicável à formação dos contratos, independentemente do seu objecto, a celebrar pelas entidades adjudicantes com uma outra entidade, desde que:
a) A entidade adjudicante exerça sobre a actividade desta, isoladamente ou em conjunto com outras entidades adjudicantes, um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços; e
b) Esta entidade desenvolva o essencial da sua actividade em benefício de uma ou de várias entidades adjudicantes que exerçam sobre ela o controlo análogo referido na alínea anterior.(...)".

Ou seja, e indo ao encontro da normação contida no transcrito preceito, a verificação, necessariamente, cumulativa dos pressupostos ali [als. a) e b)] enunciados dispensa a entidade adjudicante da submissão às regras da Contratação Pública, a que se reporta a Parte II, do C.C.P., e que constam do art.º 16.º e seguintes, deste mesmo diploma legal.
Como é sabido, e a melhor doutrina (4) também o assinala, a questão das relações "in house", sob o impulso das instâncias comunitárias  [entre outras, o Tribunal de Justiça da Comunidade Europeia, abreviadamente, T.J.C.E.], tem vindo a erguerse como temática de abundante e intensa análise, a que não será alheia "a tensão latente entre a liberdade de auto-organização administrativa e a liberdade de mercado", inerente às relações  "in house". Na explicitação do afirmado, diremos que, em regra, a Administração, sempre que necessite de bens ou serviços deverá dirigir-se ao mercado, cumprindo, assim, as normas - art.os12.º, 43.º, 49.º e 86.º -do Tratado C.E. e atinentes à salvaguarda de uma dinâmica concorrencial de mercado e, decorrentemente, dos princípios da igualdade e transparência.
Daí que, e abreviadamente, dizemos que a disciplina contida no citado art.º 5.º, n.º 2, do C.C.P., traduz uma clara excepção ao ordenamento geral aplicável. Donde decorre, ainda, uma maior exigência de análise da questão em causa.

3.2.
Requisitos da relação "in house".

Segundo jurisprudência do T.J.C.E. [vd. o denominado processo  "TECKAL" , com o n.º C-107/98] verifica-se a relação  "in house", legitimadora do não apelo ao procedimento pré-contratual de natureza concursal para fornecimento de bens ou serviços, por parte da entidade adjudicante, sempre que a entidade adjudicatária, embora distinta daquela no plano formal, não seja da mesma autónoma no âmbito decisório.
Por outro lado, e ainda de acordo com o referido Tribunal de Justiça, a verificação da relação "in house" subordina-se à ocorrência, de modo cumulativo e permanente, dos seguintes requisitos:

§ Exercício, pela entidade adjudicante e sobre a adjudicatária, de um controlo análogo ao exercido por aquela sobre os seus próprios serviços; e que
§ A entidade adjudicatária realize o essencial da sua actividade para a entidade adjudicante que a controla.

Tais pressupostos [da relação "in house"] constam também do mencionado art.º 5.º, n.º 2, als. a) e b), do Código dos Contratos Públicos aprovado pelo DecretoLei n.º 18/2008, de 29.01, normação essa que, como já sublinhámos,  constitui uma  derrogação excepcional das regras da contratação pública e, naturalmente, devem ser objecto de interpretação restritiva(5), em preservação do princípio da concorrência.
O Código de Contratos Públicos não densifica o conteúdo daqueles requisitos, o que obriga a um esforço de interpretação casuístico, em que concorrerão a factualidade pertinente e, ainda, a legislação e jurisprudência comunitárias ajustáveis.

3.2.1.
Do controlo análogo.

Tal  como refere Bernardo Azevedo (6), a existência de uma posição de sujeição ou de subordinação da entidade adjudicatária em relação à entidade adjudicante, retirando àquela autonomia decisória e submetendo-a à orientação desta última, já denuncia a substanciação do conceito "controlo análogo" constante do art.º 5.º, n.º 2, do C.C.P.
No entanto, e ainda na peugada daquele autor, a relação de "controlo análogo", estabelecida entre a entidade adjudicante e uma outra dela distinta formalmente, exige o designado poder de "indirizzo" [expressão de R. Perin/D.Casalini] ou um adstringente poder de direcção  [vd. R. Ursi] sobre a entidade submetida ao seu poder de controlo, um poder que, ainda nas palavras de Bernardo Azevedo, viabilize o exercício de uma influência determinante no âmbito da estratégia e decisão da organização  "in house". Só, deste modo, é sustentável que a entidade controlada [e também adjudicatária] se assuma como uma estrutura interna da entidade adjudicante, erguendo-se, afinal, e na expressão de S. Columbari, como uma simples relação de  "delegação inter-orgânica". Ou seja, e convocando aqui o juízo formulado no aresto recorrido, "a entidade adjudicatária comportar-se-á como mero instrumento de concretização da vontade do adjudicante, não tendo autonomia real, nem vontade negocial própria.
E, a propósito, adianta, também, Pedro Gonçalves (7) que na "relação" sob análise, a entidade dominada ou adjudicatária não goza "de uma margem de autonomia decisória sobre aspectos relevantes da sua vida, relacionados, por exemplo, com a estratégia concorrencial a seguir, as actividades a desenvolver, endividamentos a contrair ...", estando a entidade adjudicante, por sua vez, em condições de fixar a orientação geral da empresa, atribuindo-lhe o capital de dotação, assegurando a cobertura de eventuais custos sociais, verificando o resultado da gestão e exercendo supervisão estratégica".
Explicitado o conceito legal de "controlo análogo", vejamos agora e, "in casu", se entre a entidade adjudicante e ora recorrente [Hospital do Litoral Alentejano] e a entidade adjudicatária [SUCH] ocorre a denominada relação  "in house", legitimadora da não aplicação das regras da contratação  pública à formação de contratos a celebrar pela primeira. Tal exercício determinará, naturalmente, a consideração da factualidade dada como provada no domínio do acórdão sob recurso e bem assim o enquadramento normativo, doutrinário e jurisprudencial do conceito "controlo análogo", ou, mais latamente, da expressão "relação in house".

3.2.2.
Conforme se refere em II. 14., deste acórdão, a entidade adjudicante [HLA] é um dos 95 associados do SUCH, onde  pontificam ainda entidades públicas empresariais, outros institutos públicos, pessoas colectivas de direito privado e utilidade pública administrativa,  cooperativa [CESPU],  instituições particulares de solidariedade social e sociedades anónimas. Ou seja, entre os associados do SUCH figuram entidades públicas e privadas.
E, conforme decorre dos Estatutos do SUCH [vd. art.os7.º, 10.º, 12.º, 14.º, 15.º, 16.º, 17.º...] e acima evidenciámos aquando da caracterização desta entidade, tais associados, públicos e privados, integram a Assembleia-Geral, apreciam e aprovam os planos estratégicos e de actividades do SUCH, pronunciam-se sobre a gestão deste, aprovam o relatório e contas anuais, elegem a sua mesa, designam a maioria dos membros do conselho de administração, indicam a totalidade dos membros do conselho fiscal, deliberam sobre a aquisição, alienação e oneração de bens imóveis e sobre a contracção de empréstimos, para além de decidirem dos recursos interpostos pelos associados de decisões irregulares tomadas pelo Conselho de Administração.
Assim, e sublinhando, mostra-se indubitável que os Estatutos do SUCH admitem associados de natureza privada  [e existem, de facto], os quais detêm os poderes acima referenciados.
E tais poderes, pela sua preponderância que os Estatutos lhes conferem, detêm aptidão para influenciar a actividade do SUCH, estratégica e gestionáriamente.

3.2.3.
Na materialização da referida previsão estatutária [associação ao  SUCH de entes de natureza privada], e tal como se acentua no acórdão recorrido, o SUCH, certamente no sentido de consolidar  a sua capacidade competitiva em diversos segmentos do mercado, passou a deter participações sociais nas entidades empresariais seguintes:

§ SUCH Dalkia, Serviços Hospitalares [criada em 1996, trata-se de um Agrupamento Complementar de Empresas [ACE], sendo 50% propriedade do SUCH e os restantes 50% da Dalkia - Empresa de Serviços, Condução e Manutenção de Instalações Eléctricas, S.A., e tendo por objecto social a produção de energia eléctrica e a gestão de actividades de apoio na área da manutenção de equipamentos e exploração de lavandarias];

§ Coimbravita - Agência de Desenvolvimento Regional, S.A., criada em Julho de 2000 e onde o SUCH detém uma participação de 3,69%, tendo por finalidade a promoção de acções tendentes à criação de emprego e melhoria do ambiente no distrito de Coimbra nas áreas dos Serviços, Indústria e Comércio, mas sempre relacionadas com o sector da saúde;

§ EAS - Empresa de Ambiente na Saúde, criada em Maio de 2001 e totalmente detida pelo SUCH, ocupa-se do tratamento de resíduos hospitalares.

§ Em Maio de 2008 constituiu-se em EAS, Unipessoal, Lda., possuindo ainda uma participação social de 64,53% no capital da empresa "Valor Hospital, S.A.";

§ Coimbra Inovação Parque - Parque de Inovação em Ciência, Tecnologia, Saúde, S.A., constituída em Fevereiro de 2004 e onde o SUCH detém 2% do capital, tendo por objecto a implementação, gestão e administração de parques empresariais, científicos e tecnológicos;

§ Somos Compras, ACE, constituída em Abril de 2007, onde o SUCH detém a participação na percentagem de 86%, mas também integrada pelo Centro Hospitalar de Lisboa Central, EPE, Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, EPE, e o Hospital de Santa Maria, EPE, e ainda, até Março 2009, pela "SGG - Serviços de Gestão, S.A.", uma empresa do universo da "Deloitte Touche Tohmatsu";

§ Somos Pessoas, ACE, constituída em Junho de 2007, em que o SUCH detém uma participação de 95%, mas também integrada pela empresa "Capgemini, S.A.", na percentagem de 5%, disponibilizando serviços partilhados na área de gestão dos recursos humanos;

§ Somos Contas, ACE, constituída em Junho de 2007, em que o SUCH detém uma participação de 95%, também integrada pela empresa "Accenture", Consultores de Gestão, S.A., na percentagem de 5%, disponibilizando serviços partilhados no âmbito da gestão financeira;

§ Somos Ambiente, ACE, constituída em Julho de 2008, aí figurando o SUCH com uma participação de 80%, participando ainda um parceiro especializado e um outro tecnológico, destinando-se, de modo principal, à construção e exploração de um centro integrado de valorização energética, reciclagem e tratamento de resíduos.

E, repercutindo já uma complexa organização empresarial, facto que as participações e empresas várias já denunciam, o Relatório de Gestão e Contas referente a 2008 confirma tal asserção, ao adiantar que, neste mesmo ano, teve lugar o arranque das operações dos ACE, a externalização dos processos transaccionais e a definição da estratégia de empresarialização das áreas, sendo que o SUCH se consolidou como gestor e parceiro de contratos.
É, assim, seguro concluir que o SUCH vem adoptando uma estratégia claramente empresarial e de mercado [a propósito, 9,82% da facturação relativa a 2008 respeita a entidades não associadas do SUCH], onde se incluem negócios com empresas privadas que assumem carácter claramente mercantil.  Logo, bem distante de uma actividade traduzida em mera cooperação e inter-ajuda e de "colocação em comum de meios para a obtenção de vantagens comuns, dentro do mesmo circulo pessoal dos associados" (8) ou de se perfilar como um mero instrumento dos seus associados para a auto-satisfação dos suas necessidades.
Com adequada propriedade, e sem prejuízo do exercício de análise que segue, não é temerário afirmar, desde já, que se nos depara um real contrato celebrado entre entes colectivos distintos, sendo que a entidade adjudicatária configura um modelo empresarial que tende a autonomizá-la, formal e decisoriamente.

3.2.4.
Para além do enquadramento normativo, doutrinário e jurisprudencial [do T.J.C.E.]que definem e melhor explicitam o conceito de  "relação in house" e, mais particularmente, do requisito - controlo análogo - que o enforma, importará saber se a participação, ainda que minoritária, de uma empresa privada no capital de uma sociedade a que se associa a entidade adjudicante, permitirá, ou não, por parte desta, um controlo análogo ao exercido sobre os seus serviços.
O encontro da resposta não dispensará, obviamente, o apelo à jurisprudência comunitária.
Tal como refere Bernardo Azevedo (9), " não basta, para poder afirmar esta ideia de dependência decisória da organização "in house" por relação à entidade adjudicante, que esta última, no caso de sociedades participadas, ainda que integralmente, por capitais públicos, detenha a maioria do capital social, uma vez que o exercício, em sede de assembleia-geral, dos direitos de accionista, nos termos da Lei Comercial, pode não se afigurar suficiente para garantir um controlo efectivo sobre as escolhas mais relevantes da entidade controlada".
Exige-se, pois, o denominado equilíbrio de "governance" que assegure a efectiva e determinante influência do ente público sobre as opções de gestão da sociedade (10).                                               
Também o Tribunal de Justiça [vd. acórdãos proferidos nos processos C-26/03 [Stadt Halle], c-410/04 (ANAV)] vem sustentando que a participação, embora minoritária, de uma empresa privada no capital de uma sociedade no qual também participa a entidade adjudicante "exclui, de qualquer forma, que esta última exerça sobre aquela sociedade um controlo análogo ao exercido sobre  os seus próprios serviços" (11).

E no desenvolvimento da orientação ali firmada, aí se sustenta, com relevância, o seguinte:

§ Uma entidade pública, adjudicante, estabelece uma relação com os seus próprios serviços, que se rege por mecanismos tendentes à prossecução do interesse público; ao invés, a participação de capital privado numa empresa persegue objectivos de natureza diversa, por radicar em interesses diferentes.

§ A atribuição, sem concurso, de um contrato público a uma empresa de economia mista colide com o objectivo da livre concorrência, pois permite a uma empresa privada com capital nessa empresa uma vantagem no confronto com eventuais concorrentes.

Tal como se afirma no acórdão recorrido e também já sublinhámos acima, ao SUCH, estatutariamente, é cometida a possibilidade de ter [e tem, efectivamente!] associados privados e de ser ainda detentor de participações em entidades privadas, o que também se verifica. Ou seja, e como bem se decidiu noutro lugar [vd. ac. N.º 4/2010, 1.ª S/SS], o  SUCH, para além de entidade em si, abrange também um universo de entidades, que, ao abrigo do art.º 2.º dos respectivos Estatutos, são passíveis de constituição e certamente beneficiários de decisões de adjudicação dirigidas ao  SUCH, sem procedimento cumpridor do princípio da concorrência. E estas, públicas e/ou privadas, detêm poderes para influenciar a actividade do SUCH, estratégica e gestionáriamente [vd. 3.2.2.].
Ora, na esteira da doutrina e jurisprudência citadas a propósito da melhor dilucidação do conceito "controlo análogo" a que se reporta o art.º 5.º, n.º 2, do Código de Contratos Públicos, e como facilmente se intui, entre as entidades públicas adjudicantes associadas do SUCH e as demais entidades terceiras, intervenientes e beneficiárias de decisões de cariz adjudicatório, não ocorre um controlo análogo ao exercido sobre os seus próprios serviços.
E, ainda na explicitação e confirmação do afirmado, e sempre com referência ao regime estatutário do SUCH, adiantamos o seguinte:

§ O regime estatutário do SUCH não assegura a subordinação exclusiva da respectiva gestão a objectivos de interesse público, sendo que as relações contratuais estabelecidas entre aquela entidade e demais associados não se traduzem na mera partilha e utilização de bens comuns [forma de autosatisfação de necessidades colectivas], mas envolve, indirectamente, a contratação de entidades terceiras [onde se incluem empresas privadas] que, assim, se posicionam, de modo privilegiado, no confronto com outros concorrentes;

§ As competências atribuídas ao SUCH, onde se incluem as iniciativas tendentes ao funcionamento mais ágil e eficiente dos seus associados [vd. art.º 2.º, dos Estatutos], decorrem do respectivo objecto social e não de alguma determinação da entidade adjudicante [Hospital do Litoral Alentejano];

§ O SUCH possui autonomia decisória, implementando as suas actividades, independentemente da solicitação da adjudicante;

§ A circunstância do SUCH não ser uma Sociedade Comercial, mas uma associação em que os seus membros contribuem com uma quota, contribuições, dotações e subsídios [cfr. art.º 24.º, dos Estatutos], não impede que alguns destes últimos, de natureza privada e não perseguindo interesses exclusivamente altruísticos, influenciem a actividade e gestão do SUCH;

§ Neste contexto, e ainda que o substrato associativo do SUCH seja, maioritariamente, composto por entidades adjudicantes, a inevitável consideração dos interesses inerentes à componente privada que o [SUCH] integra, sempre nos impediria de admitir que o SUCH depende, operacional e tecnologicamente, apenas das referidas entidades adjudicantes; E esta ausência de exclusividade retira a verificação de um absoluto controlo da entidade adjudicante [Hospital do Litoral Alentejano] sobre a entidade adjudicatária que, para o preenchimento do requisito do "controlo análogo" [e não igual] não se basta com a suficiência.

§ "In casu", e na hipótese da participação privada se revelar irrelevante e, porventura, meramente beneficiária da actividade do SUCH, sempre questionaríamos os ACE constituídos pelo SUCH, os quais, sendo entidades prestadoras de serviços, integradas por parceiros privados, forçariam à violação do princípio da concorrência quando ocorressem procedimentos de adjudicação directa ao SUCH.

3.2.5.
Não se questiona a possibilidade de qualquer entidade pública, no desempenho das suas tarefas, actuar sem recurso a entidades externas, assim autosatisfazendo as suas necessidades.
Admite-se que a Administração constitua  entes instrumentais  [vd. serviços partilhados] tendentes ao bom desempenho das suas incumbências, ainda que mediante estratégia empresarial e com recurso a entidades privadas.
Porém, já não se admite que se associem entidades privadas à satisfação de necessidades públicas sem que se salvaguardem os procedimentos inerentes ao princípio da concorrência, com a subsequente violação do princípio da igualdade de tratamento dos operadores económicos que pretendam contratar com a Administração e evidente subtracção da celebração de contratos públicos às regras que disciplinam a contratação pública.

3.2.6.
Assim, e concluindo, o Hospital do Litoral Alentejano, ora recorrente, não exerce, por si ou conjuntamente com as demais entidades públicas associadas, sobre o SUCH, um controlo análogo ao exercido sobre os serviços que integra. Dito de outro modo, entre o SUCH e o Hospital do Litoral Alentejano não ocorre uma relação "interna" equiparável a existente entre a entidade adjudicante e os serviços que a compõem.

3.2.7.
Da destinação essencial da actividade

Previamente, diremos que a abordagem do requisito acima enunciado e constante do art.º 5.º, n.º 2, al. b), do Código dos Contratos Públicos, perfila-se como desnecessária e, quiçá, inútil, pois, de um lado, o acórdão recorrido não o desenvolve ou aprecia e, do outro, porque a inaplicabilidade das regras da contratação pública a que se reporta o citado art.º 5.º, n.º 2, do C.C.P., exige, cumulativamente, a verificação dos requisitos referidos em a) e b), do n.º 2,desta mesma norma, ["logo, concluindo-se pela inverificação do requisito "controlo análogo", prescindir-se-ia, naturalmente, da apreciação do requisito "destinação essencial" da actividade"].
No entanto, e apesar do exposto, não deixaremos de atentar, ainda que abreviadamente, no requisito  "destinação essencial da actividade", previsto no mencionado art.º 5.º, n.º2, al. b), do Código de Contratos Públicos.

3.2.7.1.
O art.º 5.º, n. º2, als. a) e b), do C.C.P., dispõe que as regras da contratação pública  [parte II] também não são aplicáveis desde que, verificado o requisito mencionado na citada al. a), a entidade adjudicatária  desenvolva  ainda  o essencial da sua actividade em benefício da entidade adjudicante [vd. Ac.Teckal-Proc. n.º C-107/98].
Na verdade, e como acentua Bernardo Azevedo em obra já citada, "enquanto a exigência de controlo análogo traduz a necessária dependência decisória da entidade controlada em relação à entidade dominante, já a obrigatoriedade do essencial da actividade da adjudicatária se destinar a abastecer a entidade adjudicante exprime a sua dependência económico-jurídica em relação a esta última". Ou seja, e ainda nas palavras de  E. Fatôme, A. Ménéménis, a entidade dependente deve, assim, funcionar como um operador dedicado que  "serve" a entidade adjudicante,  de modo exclusivo ou quase, no cumprimento dos respectivos objectivos.

E, como aferir da referida "dedicação"?

A propósito, o T.J.C.E. [vd. Ac. Carboterno - Proc. n.º C- 340/04] apela a conceitos vagos e indeterminados  ["quase-exclusividade", "substancialmente", "maior parte"]para densificar  tal expressão, facto que confere insegurança no âmbito da aplicação de tal critério. Por outro lado, a tentativa de substanciar o conceito de "destinação essencial da actividade" mediante a fixação de uma percentagem mínima  [ex: 80% ou 90%, como se alude no Ac.  Tragsa - Proc.º n.º C-295/05] também não mereceu acolhimento incondicional.
Deste modo, e com referência ainda à significação do termo  "essencial",  o conceito de  "destinação essencial da actividade" pressupõe, sob a nossa óptica,  que o essencial da  actividade inscrita no objecto social da entidade adjudicatária [controlada] se centre, de modo principal, na satisfação das necessidades da entidade adjudicante, muito embora não iniba aquela de, subsidiária ou complementarmente, exercer outras actividades.
Embora nos movamos ainda no âmbito de alguma indeterminação, esta será suprida, entre o mais, pelos citados elementos quantitativos. E, assim, tal definição substanciará, afinal, um critério adequado e acolhível.

3.2.7.2.
"In casu",  e encurtando razões,  reconhecemos que ocorre o requisito "destinação essencial da actividade", previsto no art.º 5.º, n.º 2, al. b), do C.C.P.,porquanto o SUCH, entidade adjudicatária, tem desenvolvido a sua actividade, de modo principal, na satisfação das necessidades da  adjudicante e outros associados públicos.
Esta constatação suporta-se, obviamente, na percentagem [9,82%] de serviços prestados no ano de 2008 a não associados do SUCH e no correspondente valor de facturação [€ 5 770 095,98], em contraponto com o valor da facturação [€ 79 847  577,00] respeitante a serviços prestados aos associados públicos, elementos que, embora de natureza quantitativa, contribuem, adjuvantemente, para a densificação do citado critério.
E, para a substanciação do mencionado critério de aferição do conceito "dedicação", concorrem ainda os Estatutos que regem a actividade do SUCH, seja na vertente empresarial, seja nas obrigações que decorrem do respectivo objecto social.
Anotamos, por último, que as percentagens e valores pecuniários acima referidos assentam em informação oficial e fidedigna inserta [vd. fls. 117] em documento que acompanha as alegações de recurso em apreço, a qual contraria [e corrige] a matéria inscrita em II. Z) e AA), do acórdão sob recurso e aqui dada como provada.

4. Dos Pareceres do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República - n.os 145/2001 e 1/95.

Previamente, e no plano do valor dos Pareceres elaborados pelo Concelho Consultivo, importa adiantar, de acordo com o disposto nos art. os 42.º e 43.º, do Estatuto do Ministério Público, o seguinte:

§ A doutrina contida em tais Pareceres poderá ser, obrigatoriamente, seguida e sustentada pelos magistrados do Ministério Público, caso o Procurador Geral da República emita despacho nesse sentido;

§ Quando homologados pelas entidades que os tenham solicitado, tais Pareceres são publicados no Diário da República para valerem como interpretação oficial nos serviços respectivos.

Daqui se retira que a doutrina contida em tais Pareceres, constitutiva de interpretação de índole normativa, detém a aptidão vinculativa atrás enunciada e legalmente prevista, não condicionando ou interferindo no poder de decisão dos Tribunais e, mais particularmente, do Tribunal de Contas.
Deste modo, a invocação dos Pareceres acima referidos integrará, a par de outros elementos, o exercício analítico em curso, sem mais.

4.1.
Os referidos Pareceres - 145/2001 e 1/95 - foram emitidos no decurso da vigência das Directivas n.os 93/36/C.E.E. e 93/38/C.E.E., sendo que, no âmbito do direito interno, o primeiro posiciona-se com referência ao Decreto-Lei n.º 211/79, de 12.07, e o segundo já se sustenta na vigência dos Decretos-Lei n.os 55/99, de 02.03, e 197/79, de 08.07.
Basicamente, a doutrina contida no Parecer n.º 145/2001 pressupõe sempre a ausência da necessidade de recurso a algum contratante externo no domínio dos contratos celebrados entre o SUCH e os seus associados públicos. Ou seja, o SUCH emerge aí como cerne de uma "actividade materialmente cooperativa" e de "auto-organização das entidades do sistema de Saúde", onde não se questiona o "recurso a entidade externas" que obrigue à equação e salvaguarda dos princípios da concorrência, igualdade e imparcialidade e, inerentemente, ao seguimento dos procedimentos concursais.
No entanto, e segundo o referido Parecer, sempre que o SUCH, enquanto adjudicante, careça de contratar com terceiros, tal actividade subordinar-se-á ao regime da contratação pública [vd. n.º 4, do Parecer].
Aquele entendimento, traduzido na admissibilidade da contratação directa entre órgãos da mesma natureza, era até compatível com alguma interpretação "construída" sobre as Directivas Comunitárias 92/50/C.E.E. e 93/38/C.E.E., mas sempre sob reserva crítica do T.J.C. Europeias.
E a esta reserva não é ainda alheia a ocorrência de várias circunstâncias que, ajustadamente, colocam em crise a actualidade dos Pareceres referidos, e de que destacamos as seguintes:

§ Publicação das Directivas n.os2004/18/C.E.E. e 2004/17/C.E.E. de 31.03, clarificadoras dos pressupostos de celebração dos contratos entre entidades adjudicantes;

§ Jurisprudência do Tribunal de Justiça Europeu, enunciadora das excepções à aplicação das regras da contratação pública e sublinhando o seu carácter restritivo;

§ Publicação do Código de Contratos Públicos [aprovado pelo Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29.01], com especial enfoque na salvaguarda do princípio da concorrência e restrição das excepções à aplicação do regime da contratação pública;

§ Inovação operada no estatuto jurídico dos Hospitais Públicos, acentuando, tendencialmente, a sua natureza empresarial;

E, por último

§ A evolução estatutária do SUCH [vd. versão de 2006, in D.R., II Série, de  29.12.2006].

E, com referência à evolução estatutária do SUCH, sublinha-se:

§ O Presidente da mesa da Assembleia-Geral é eleito pelos membros desta, sendo que, anteriormente, era nomeado pelo Ministro da Saúde;
§ O Conselho Fiscal é integralmente eleito em Assembleia-Geral;
§ Os actos do Conselho de Administração e da Assembleia-Geral não são recorríveis pelos Associados para o Ministro da Saúde, permitindo-se apenas o recurso para a Assembleia-Geral dos actos do referido Conselho;
§ O SUCH passou a ter como objecto a possibilidade de constituir unidades de Serviços partilhados, sob a forma de unidades orgânicas suas, ou sob a forma de pessoas colectivas integradas por si, por seus associados e/ou terceiras entidades;
§ O Ministro da Saúde não homologa agora as decisões da Assembleia-Geral relativas à contracção de empréstimos, a menos que esses determinem um endividamento líquido igual ou superior a 75% dos capitais próprios apurados no ano transacto.

Tais alterações, de cariz estatutário, caracterizam o SUCH como uma entidade bem diversa da existente à data da emissão dos referidos Pareceres, pois, de um lado, reforçaram a sua natureza privada e associativa, e, do outro, reduziram o poder tutelar e de controlo por parte do Estado.

Argumentário bastante para não reputarmos de actual a doutrina ali expendida. 

5. Da Ilegalidade verificada

Tal como resta demonstrado, o presente Protocolo, real contrato de empreitada de obras públicas, sobrevém a um procedimento que infringe o disposto no art.º 5.º, n.º 2, do C.C.P. Ou seja, muito embora ocorra o requisito expresso "na destinação essencial da actividade" desenvolvida pela entidade adjudicatária em benefício da entidade adjudicante, resta demonstrado que esta última não exerce sobre aquela um controlo análogo ao exercido sobre os seus próprios serviços.
As regras da contratação pública não são aplicáveis à formação de contratos a celebrar entre entidades adjudicantes e outras entidades, desde que, cumulativamente, ocorram os pressupostos enunciados no art.º 5.º, n.º 2, als. a) e b), do Código de Contratos Públicos.
Assim, o presente Protocolo ou contrato não se mostra abrangido por alguma excepção à aplicação do regime da contratação pública, pelo que, lhe é aplicável a Parte II, do C.C.P. .
O presente contrato, celebrado por um Instituto Público, encerra um valor superior ao referido na al. b), do art.º 7.º, da Directiva n.º 2004/18/C.E.[€ 206 000,00].
Assim, e de acordo com o disposto no art.º 20.º, n.º 1, al.b), do C.C.P., o contrato deveria ser precedido de concurso público ou de concurso limitado por prévia qualificação.
A ausência de concurso, de carácter obrigatório, integra a falta de um elemento essencial da adjudicação, a qual, por sua vez, enforma a nulidade reportada no art.º 133.º, n.º 1, do Código de Procedimento Administrativo.
Tal nulidade, geradora da invalidade do contrato [vd. art.º 283.º, n.º 1, do C.C.P.], é fundamento de recusa do visto, atento o disposto no art.º 44.º, n.º 3, al. a), da Lei n.º 98/97, de 26.08.
Neste contexto, de facto e de direito, inexiste motivo para alterar o aresto recorrido.
 

IV. DECISÃO
 

Pelos fundamentos expostos, decide-se negar provimento ao recurso, mantendo o acórdão recorrido.
Emolumentos legais.
Registe e notifique.
Lisboa, 07 de Outubro de 2010

Os Juízes Conselheiros, - (Alberto Fernandes Brás - Relator) - (António Augusto dos Santos Carvalho) - (Carlos Alberto Morais Antunes)) 

Fui presente,

(Procurador-Geral Adjunto) - (Daciano Pinto)


(1) Norma transposta para o C.C.P., onde se mostra vertida no respectivo art.º 343.º. 
(2) Vd., a propósito, Prof. Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, 2.ª Ed., Vol. 1, 577 e Esteves de Oliveira, Direito Administrativo, Coimbra 1980, p. 208.
(3) Vd. Lei-Quadro dos Institutos Públicos, alterada pela Lei n.º 51/2005, de 30.08 e pelos Decretos-Lei n.os 200/2006, de 27.10 e 105/2007 de 03.04.  
(4) Vd. Bernardo Azevedo, Estudo Sobre "Contratação in house: Entre a liberdade de Auto-Organização Administrativa e a Liberdade de Mercado". 
(5) Cf., ainda, Bernardo Azevedo, em "Estudo" já identificado. 
(6) Vd. Estudos da Contratação Pública I, fls.126. 
(7) Vd. Regime Jurídico das Empresas Municipais. 
(8) Vd. Pareceres do C. Consultivo da P.G.P., n.ºs 1/95 e 145/2000. 
(9) Estudos da Contratação Pública, I 
(10) Vd. Elisa Scotti.
(11) Vd. Rui Medeiros.