Acórdão n.º 167/2009, de 20 de Novembro de 2009, da Subsecção da 1.ª Secção do Tribunal de Contas (proc. n.º 1861/2009)

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ACÓRDÃO N.º 167/2009 - 20.Nov.2009 - 1ª S/SS

(Processo n.º 1861/09)

DESCRITORES:

Contratação pública / Contratação "in house" / Controlo Análogo / Serviço de Utilização Comum dos Hospitais (SUCH) / Direito Comunitário / Princípio da concorrência / Ajuste directo / Nulidade / Recusa de Visto

SUMÁRIO:

1. No domínio da contratação pública, encontram-se  princípios gerais de direito comunitário (v. g. os da igualdade, da imparcialidade e da concorrência),  princípios específicos da realidade comunitária  (v. g. o da proibição da discriminação em razão da nacionalidade e o do reconhecimento mútuo) e, ainda,  princípios específicos da realidade da contratação pública (v. g. o da intangibilidade das propostas);

2. Nos termos do n.º 2, do artigo 5.º, do Código dos Contratos Públicos (CCP), a Parte II deste Código não é aplicável à formação dos contratos, independentemente do seu objecto, a celebrar por entidades adjudicantes com uma outra entidade, desde que:
a) A entidade adjudicante exerça sobre a actividade desta, isoladamente ou em conjunto com outras entidades adjudicantes, um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços;
b) Esta entidade desenvolva o essencial da sua actividade em benefício de uma ou de várias entidades adjudicantes que exerçam sobre ela o controlo análogo referido na alínea anterior.

3. A excepção referida no ponto anterior, designada pela doutrina e pela jurisprudência comunitária, de "contratação in house", é inadmissível sempre que a adjudicatária seja participada por capitais privados, ou quando, em termos estatutários, existe a possibilidade de participação de capital privado, uma vez que tal situação exclui a possibilidade de a entidade adjudicante exercer, sobre a adjudicatária, um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços;

4. O Protocolo celebrado entre o "Hospital do Litoral Alentejano" e o "Serviço de Utilização Comum dos Hospitais" (SUCH)  - que tem por objecto a execução da obra de remodelação da instalação de ar condicionado em vários serviços do mencionado hospital  - consubstanciando um acordo de vontades entre duas pessoas jurídicas distintas, entre as quais não existem relações hierárquicas, tipifica um verdadeiro contrato público de empreitada de obras públicas, em que se estabelece um benefício económico pela realização das prestações nele contempladas, e não uma qualquer forma de cooperação ou assistência mútua, estatutariamente determinada, para a realização de uma missão de serviço público, regido pelo Código dos Contratos Públicos e pela legislação comunitária da contratação pública;

5. Sendo associados do SUCH, para além do Hospital do Litoral Alentejano, outras entidades públicas (serviços da administração directa do Estado, institutos públicos e entidades públicas empresariais)  e entidades privadas (como é o caso de instituições particulares de solidariedade social e sociedades anónimas), não é possível considerar que o referido Hospital exerce, sobre o SUCH, um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços;

6. Estipulando os Estatutos do SUCH que as unidades de serviços partilhados, constituídas por este, podem ser constituídas sob a forma de unidades orgânicas do SUCH, ou sob a forma de pessoas colectivas, integradas pelo SUCH e pelos seus associados e/ou terceiras entidades, a escolha de um procedimento de adjudicação directa ao SUCH, permite que as empresas privadas participantes beneficiem de condições mais vantajosas relativamente a outros concorrentes, o que viola o princípio da concorrência;

7. Tendo em conta o disposto no n.º 2 do artigo 5.º do Código dos Contratos Públicos, a jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (TJCE), e os princípios que enformam as regras da contratação pública, em especial o  princípio da concorrência, não pode considerar-se que a relação entre o SUCH e os seus associados públicos, e, em particular, entre o SUCH e o Hospital do Litoral Alentejano, seja uma relação "interna" equiparada à que é estabelecida pela entidade adjudicante com os seus próprios serviços.

8. Porque foi celebrado após a entrada em vigor do CCP, e tem um valor superior a 150.000,00 euros (vide artigo 19.º, als. a) e b) do CCP), é aplicável ao contrato celebrado entre o Hospital do Litoral Alentejano e o SUCH, o disposto naquele Código, incluindo a sua parte II;

9. De acordo com o estipulado no artigo 19.º, n.º 1 al. b) do mesmo Código, impunha-se a realização de um concurso público ou de um concurso limitado com prévia qualificação;

10.A omissão da realização de concurso, quando obrigatório, implica a falta de um elemento essencial da adjudicação, o que determina a nulidade do acto  procedimental em que assentou o contrato, bem como a nulidade deste, nos termos dos artigos 133.º, n.º 1 do Código do Procedimento Administrativo e 283.º, n.º 1, do CCP.

11.A nulidade é fundamento de recusa de visto, nos termos do disposto no artigo 44.º, n.º 3, al. a), da Lei n.º 98/97 de 26 de Agosto.

Conselheiro Relator: António M. Santos Soares
 

ACÓRDÃO Nº 167 /09 - 20.NOV.09-1.ª S/SS

Processo nº 1861/2009

  

Acordam os juízes da 1ª Secção do Tribunal de Contas, em subsecção:

I - RELATÓRIO

O Hospital do Litoral Alentejano, (doravante também designado por Hospital) remeteu para fiscalização prévia, o denominado "Protocolo Nº DCS/2105/01/2008", celebrado entre aquele Hospital e o  Serviço de Utilização Comum dos Hospitais  - SUCH,  que tem como objecto "a execução da obra de remodelação da instalação de ar condicionado dos serviços de medicina física e reabilitação, consultas externas, esterilização, oftalmologia e quartos de isolamento", no valor de 622.518,00 €, acrescido de IVA.

II - MATÉRIA DE FACTO

Para além do referido acima, relevam para a decisão os seguintes factos que se dão por assentes:

A) Por deliberação tomada em 6 de Maio de 2009, o Conselho de Administração do Hospital, determinou adjudicar, por ajuste directo, ao SUCH, as obras de remodelação das instalações técnicas especiais de aquecimento, ventilação e ar condicionado dos Serviços de Consulta Externa, Medicina Física e Reabilitação, Esterilização, quartos de isolamento e oftalmologia do Hospital do Litoral Alentejano (1);

B) Nessa deliberação, o Conselho de Administração justificou a adopção do procedimento por ajuste directo, do seguinte modo (2):
"... O Hospital do Litoral Alentejano é associado de pleno direito do Serviços de Utilização Comum dos Hospitais (SUCH);
O SUCH possui a natureza originária de pessoa colectiva de utilidade pública administrativa tendo por objectivo a prestação de serviços aos seus associados com vista a um funcionamento mais ágil e eficiente destes e em regime material de entreajuda num plano materialmente cooperativo.
A actuação do SUCH, no exercício da prestação de serviços aos seus associados, em regime de cooperação e entreajuda e sem apelo a recursos exteriores, mostra-se excluída dos pressupostos de aplicação do regime jurídico dos diplomas legais que visam salvaguardar os princípios da concorrência e da imparcialidade bem como garantir a igualdade de tratamento dos operadores que pretendam contratar com a Administração.
A actividade do SUCH é condicionada, estatutariamente, em primeira linha, à auto-satisfação das necessidades dos associados, pelo que no relacionamento entre ambos, no caso concreto, entre o mesmo e o Hospital do Litoral Alentejano, não vigora a concorrência não tendo a actuação do SUCH por fim principal o lucro.
Em consonância com o exposto, deve aplicar-se à prestação de serviços pelo SUCH ao Hospital, seu associado o regime da denominada contratação "in house" prevista no artº 5º do CCP...".

C) O contrato foi assinado em 6 de Maio de 2009;

D) Nos termos do nº1, da sua cláusula primeira, o Protocolo tem por objecto a "execução das obras necessárias para a Remodelação da Instalação de  Ar  Condicionado dos Serviços de  Medicina  Física e Reabilitação, Consultas Externas,  Esterilização,  Oftalmologia e Quartos de Isolamento, com base no projecto aprovado pelo HLA, as quais decorrerão de modo faseado";

E) Entre outros, a execução das obras referidas na alínea anterior, compreende os seguintes trabalhos:

I- REFORÇO DE CLIMATIZAÇÃO
- Produção de frio e rede geral
- Consultas externas
- Medicina física e reabilitação
- Esterilização
- Quartos de isolamento
- Oftalmologia 

II- GESTÃO TÉCNICA QUE ABARCA:
- Produção de frio e rede geral
- Consultas externas
- Medicina física e reabilitação
- Esterilização
- Oftalmologia 

REFORÇO DE CLIMATIZAÇÃO

Produção de Frio e Rede Geral

I - Instalação Nova - a executar

Fornecimento e montagem de equipamentos

1.Grupo Chiller.........................................................

100.000,00

2.Grupos electrobombas.................................................

3.500,00

3.Redes de tubagens.........................................................

53.342,00

4.Instalação eléctrica.......................................................

2.500,00

II- Instalação existente

Desmontagem, alteração e/ou modificação instalações

1. Alteração rede hidráulica central térmica

3.000,00

2.Remoção para local a definir

500,00

III- Trabalhos gerais

24.947,00

Total

187.789,00

REFORÇO DE CLIMATIZAÇÂO

Consultas externas

I - Instalação nova - a executar

Fornecimento e montagem de equipamentos

1. Unidades de tratamento de ar

8.500,00

2. Ventiloconvectores

13.923,00

3. Ventiladores extracção

1.200,00

4. Rede de distribuição ar

21.109,00

5. Redes de Tubagens

10.637,00

6. Instalação eléctrica

3.000,00

II - Instalação existente

Desmontagem e alteração e/ou modificação instalações

1. Desmontagem rede hidráulica e aerólica

5.000,00

2. Desmontagem instalação eléctrica

1.250,00

3. Limpeza interior condutas

1.000,00

4. Remoção dos equipamentos a desmontar

1.000,00

III - Trabalhos Gerais

1. ensaios, arranque, afinações, telas finais instalação.

1.000,00

2. Estruturas metálicas apoio equipamentos

1.500,00

3. Apoio de construção civil

12.507,00

TOTAL

81.626,00

REFORÇO DE CLIMATIZAÇÂO

Medicina física e de reabilitação

I - Instalação nova - a executar

Fornecimento e montagem de equipamentos

1. Unidades de tratamento de ar

8.500,00

2. Ventiloconvectores

10.292,00

3. Ventiladores extracção

1.500,00

4. Rede de distribuição ar

8.780,00

5. Redes de Tubagens

10.635,00

6. Instalação eléctrica

2.200,00

II - Instalação existente

Desmontagem e alteração e/ou modificação instalações

1. Desmontagem rede hidráulica e aerólica

1.000,00

2. Desmontagem instalação eléctrica

400,00

3. Limpeza interior condutas

1000,00

4. Remoção dos equipamentos a desmontar

500,00

III - Trabalhos Gerais

1. ensaios, arranque, afinações, telas finais instalação.

1000,00

2. Estruturas metálicas apoio equipamentos

-

3. Apoio de construção civil

9.369,00

Total

55.426,00

REFORÇO DE CLIMATIZAÇÃO

Esterilização

I - Instalação nova - a executar

Fornecimento e montagem de equipamentos

1. Unidades de tratamento de ar

8.500,00

2. Ventiloconvectores

1320,00

3. Ventiladores extracção

3.200,00

4. Humidificadores

4000,00

5. Rede de distribuição ar

20.992,00

6. Redes de Tubagens

9.201,00

7. Rede eléctrica

1.700,00

II - Instalação existente

Desmontagem e alteração e/ou modificação instalações

1. Desmontagem rede hidráulica e aerólica

2500,00

2. Desmontagem instalação eléctrica

1000,00

3. Limpeza interior condutas

300,00

4. Remoção dos equipamentos a desmontar

1000,00

III - Trabalhos Gerais

1. ensaios, arranque, afinações, telas finais instalação.

1000,00

2. Estruturas metálicas apoio equipamentos

incluido

3. Apoio de construção civil

6.106,00

Total

60.819,00

H) Nos termos do nº1, da cláusula 11ª, do Protocolo, o  pagamento dos trabalhos far-se-á da seguinte forma:

1 - 30% do preço, com a celebração do Protocolo.
2 - O remanescente, através da apresentação, por parte do SUCH, de autos de medição, elaborados com observância do disposto nos artigos 387º e seguintes do Código dos Contratos Públicos.

I) Através do oficio com a ref.ª 5262, de 30 de Outubro de 2009, o Conselho de Administração do Hospital, veio informar este Tribunal que a obra ainda não começou a ser executada e que, até à data, não foi efectuado qualquer pagamento.

J) Os novos Estatutos do SUCH foram publicados no Diário da República, 2ª Série, (Parte Especial), de 29 de  Dezembro de 2006, tendo, no entender, do próprio SUCH, reforçado a sua natureza associativa e privada (3);

K) Nos termos do artigo 2º, n.º 1, desses Estatutos, o SUCH tem por objecto tomar a seu cargo iniciativas susceptíveis de contribuir para o funcionamento mais ágil e eficiente dos seus Associados, designadamente, prestando-lhes assistência técnica no domínio das instalações e equipamentos, assegurando a exploração ou a gestão de instalações técnicas e áreas industriais, incluindo lavandarias, centrais e transportes e constituindo unidades de serviços partilhados.

L) Por seu turno, o artigo 6º dos Estatutos do SUCH estabelece:
"... 1. Podem ser associados do SUCH as entidades, públicas ou privadas (4), que integrem o sistema de saúde português, bem como todas as instituições particulares de solidariedade social ou outras pessoas colectivas de utilidade pública administrativa que desenvolvam actividades de promoção e protecção da saúde.
2. Podem ser associados do SUCH serviços pertencentes ao Ministério da Saúde ou dele dependentes...".

M) Em 31de Dezembro de 2008, o SUCH tinha 95 associados (5), entre os quais se contam entidades do Sector Público Administrativo, Institutos Públicos, Entidades Públicas Empresariais, Instituições Particulares de Solidariedade Social, Pessoas Colectivas de Direito Privado e Utilidade Pública Administrativa, uma Cooperativa (CESPU) e um Hospital Privado (Hospital dos Lusíadas).

N) O Hospital do Litoral Alentejano é um desses 95 associados.

O) Nos termos do artigo 7º dos Estatutos do SUCH, são direitos dos associados:
"...1. a) Usufruir dos serviços prestados pelo SUCH nos termos que forem regulamentados;
b) Eleger os membros não nomeados dos órgãos sociais do SUCH;
c) Apresentar todas as propostas que julguem de interesse para a melhor prossecução dos fins do SUCH;
d) Reclamar perante o Conselho de Administração dos actos que considerem lesivos dos seus interesses;
e) Recorrer para a Assembleia-Geral dos actos do Conselho de Administração que julguem irregulares;
f) Examinar, na sede do SUCH, o orçamento e o relatório e contas.
2. Os associados podem apresentar à Assembleia-Geral propostas para a constituição da Mesa da Assembleia-Geral, do Conselho Fiscal e da Comissão de Vencimentos.".                                                   

P) Nos termos do artigo 10º dos Estatutos do SUCH, são órgãos deste, a Assembleia-Geral, o Conselho de Administração e o Conselho Fiscal.

Q) De acordo com o artigo 12º, dos mesmos Estatutos, a Assembleia Geral éconstituída por representantes de todos os associados.

R) Por força do artigo 15º, ainda dos Estatutos, compete à Assembleia Geral:
- Eleger e destituir os membros não nomeados dos órgãos do SUCH;
- Apreciar e aprovar os planos estratégicos e de actividades;
- Apreciar e aprovar o relatório e contas do exercício anual;
- Pronunciar-se sobre a gestão do SUCH;
- Deliberar, por maioria de três quartos dos associados presentes, sobre alterações aos estatutos;
- Deliberar, por maioria de três quartos do número total de associados, sobre a dissolução do SUCH;
- Deliberar, por proposta do Conselho de Administração, sobre a realização de empréstimos e a aquisição, alienação ou oneração de bens imóveis;
- Deliberar, segundo proposta do Conselho de Administração, sobre a participação do SUCH noutras pessoas colectivas, nomeadamente, subscrição de participações, quotas ou acções na sua constituição, aquisição de participações, quotas ou acções em pessoas colectivas já constituídas ou adesão  a associações constituídas ou a constituir;
- Conhecer dos recursos interpostos da recusa de admissão como associados do SUCH;
- Pronunciar-se sobre as questões que lhe sejam apresentadas nos termos regulamentares; 
- Aprovar o regulamento de quotização proposto pelo Conselho de Administração.

S) O número de votos de cada associado na Assembleia-Geral é determinado pelo valor percentual dos serviços adquiridos relativamente à facturação total do SUCH (cfr. artigo 14.º, n.º 6 dos Estatutos).

T) Nos termos do artigo 16º dos Estatutos, o Conselho de Administração do SUCH é composto por um Presidente, um Vice-Presidente e três Vogais. O Presidente e o Vice-Presidente são nomeados pelo Ministro da Saúde e os três Vogais são eleitos em Assembleia-Geral.

U) De acordo com o artigo 17º, ainda dos Estatutos, o Conselho de Administração assegura a gestão da associação, mediante o plano de actividades e o orçamento aprovado pela Assembleia-Geral.

V) O Conselho Fiscal, composto por três membros, é eleito em Assembleia-Geral (cfr. artigo 22º).

W) A intervenção do Ministro da Saúde traduz-se em:

- Nomear o Presidente e o Vice-Presidente do Conselho de Administração (artigo 16.º, n.º 2);
- Exercer a tutela sobre o SUCH (artigo 4.º);
- Homologar as alterações aos Estatutos aprovadas em Assembleia-Geral (artigo 15.º, n.º 2);
- Homologar a dissolução do SUCH, aprovada em Assembleia-Geral (artigo 15.º, n.º 2);
- Homologar a contracção de empréstimos que impliquem um nível de endividamento líquido igual ou superior a 75% dos capitais próprios apurados no exercício do ano transacto (artigo 15.º, n.º 3).

X) O artigo 2º, n.º 2, dos Estatutos estabelece, por sua vez, que, para além de ser um instrumento de auto-satisfação das necessidades dos seus associados, o SUCH pode ainda, no regime de concorrência e de mercado, desenvolver actividades em todas as áreas de apoio das instituições e serviços que integram o sistema de saúde português, sejam ou não seus associados. O n.º 4 refere, ainda, que o SUCH pode alargar as suas actividades a instituições públicas ou privadas, nacionais ou estrangeiras, desde que não resulte qualquer prejuízo para os associados e haja vantagem no plano económico e em matéria de enriquecimento e valorização tecnológica; 

Y) A fols. 29 e segs. do 2º volume do presente processo, constam umas listagens de clientes e de facturação, relativamente a diversas áreas de negócio do SUCH (Energia, Manutenção, Projectos e Obras, Segurança e Controlo Técnico, Limpeza Hospitalar, Resíduos e Nutrição), registando-se aí, como clientes, entidades privadas, como, por exemplo,  British Hospital Lisbon XXI, S.A., Clínica de Montes Claros, Lda., Clínica Particular de Barcelos, Lda., Controlvet Segurança Alimentar, DALKIA- Energia e Serviços, S.A., Farma APS- Produtos Farmacêuticos, S.A., Ferticentro- Centro de Estudos de Fertilidade, S.A., IMAGRAN- Lab. de Imagiologia da Marinha Grande, Imalis- Meios Diagnósticos de Imagiologia de Leiria, Lda., Intercir- Centro Cirúrgico de Coimbra, Lda., SECIL- Companhia Geral de Cal e Cimento, S.A., Sociedade da Água do Luso,  SOMINCOR- Sociedade Mineira de Neves Corvo, S.A.,  AICCOPNAssoc. Indust. Const. Civil e Obras Públicas, Ensinave- Educação e Ensino Superior Alto Ave, Lda., Abbott Laboratórios, Lda., Codan Portugal Instrumentos Médicos, S.A., Serunion Restaurantes de Portugal, S.A., HPP Saúde- Hospital Privado de Santa Maria de Faro, Hospital Particular de Viana do Castelo, Lda., ACOS- Laboratório Veterinário de Beja, Ginásio Clube Português, Sociedade de Construções Soares da Costa, S.A., Tecnovia Açores- Sociedade de Empreitadas, S.A., SAMS, Clínica CUF Torres Vedras, S.A., Dr. Joaquim Chaves Laboratório de Análises Clínicas, S.A., Eurest Portugal  - Soc. Europeia de Restaurantes, Lda., Ambitral Transporte de Resíduos, Lda., entre muitos outros, em que se incluem farmácias, clínicas, laboratórios clínicos, laboratórios farmacêuticos, lares, etc.   

Z)  A fols. 29 do 2º volume do processo, constam dados relativos ao volume de negócios do SUCH, em 2008, e respectiva facturação, onde se mostra que, em 2008, foram facturados a entidades não associadas do SUCH, 21.614.562,09 €, representando 24,6% da facturação.

AA) Dos mesmos dados, resulta que a facturação a entidades privadas, no referido ano de 2008, foi de 7.484.990,73 €, representando 8,52% do total.

BB) O artigo 2º, nº 3, dos Estatutos do SUCH estipula que as unidades de serviços partilhados, constituídas pelo SUCH, podem ser constituídas sob a forma de unidades orgânicas do mesmo SUCH ou sob a forma de pessoas colectivas, integradas pelo SUCH e pelos seus associados e/ou por terceiras entidades.

CC) O artigo 3º dos mesmos Estatutos, determina que, sempre que tal se mostre de interesse para a prossecução do seu objecto, o SUCH pode instituir ou participar na constituição de associações, sociedades ou pessoas colectivas de outra natureza, bem como adquirir ou alienar participações sociais.

DD) No ponto IV.2.10, do Relatório de Gestão e Contas de 2008 do SUCH, junto a fols. 92 e segs. do 2º volume do processo, refere-se:
"... Tendo presente a publicação do novo Código dos Contratos Públicos -CCP, através do Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de Janeiro, que veio unitariamente estabelecer a disciplina aplicável à formação dos contratos públicos, assumiu particular importância o enquadramento geral das relações entre os SUCH e os seus Associados públicos face às normas aplicáveis, no ordenamento jurídico nacional e comunitário, em matéria de contratação pública.
Em sede de aprofundamento destas matérias jurídicas, e tendo por base uma interpretação teleológica conforme às normas comunitárias, considerase possível reconduzir as relações estabelecidas entre o SUCH e os seus associados públicos à figura das relações in house, com a consequente exclusão dos acordos celebrados no âmbito dessa relação jurídica da esfera de aplicação das regras sobre contratação pública, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 5.º do CCP.
Embora, desde sempre se tenha entendido e, portanto, defendido, que o SUCH, como organismo de direito privado não está sujeito à disciplina da contratação pública, a verdade é que, também desde sempre, se tem propugnado pelo respeito rigoroso dos princípios da boa fé, transparência, publicidade, igualdade e concorrência na formação dos contratos a celebrar pelo SUCH...". 

III - O DIREITO

1. Como já se salientou nos Acórdãos da 1ª Secção, deste Tribunal, nºs 143/09, de 22 de Julho de 2009 e 159/09, de 29 de Outubro de 2009 (6), a natureza da contratação entre os SUCH e os seus associados, quando estes se configuram como pessoas colectivas de direito público, - maxime os hospitais integrados na rede de prestação de cuidados de saúde (7)- foi sempre muito controvertida, tendo dado origem a inúmeros pareceres, de que se salientam dois do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República (PGR): o Parecer nº 1/95, de 9 de Março de 1995, publicado no Diário da República, II Série, de 1 de Julho de 1995, e o Parecer n.º 145/2001, de 7 de Novembro de 2002, publicado no Diário da República, II Série, de 23 de Abril de 2003.
Ambos os pareceres, atrás referidos, foram emitidos durante a vigência das Directivas 93/36/CEE, 93/37/CEE e 93/38/CEE, do Conselho, de 14 de Junho.
No que ao direito interno se refere, o primeiro Parecer reporta-se ao regime constante do Decreto-Lei n.º 211/79, de 12 de Julho,  - anterior pois à integração de Portugal na então Comunidade Económica Europeia  -, e o segundo foi produzido já no âmbito dos DL nºs 55/99, de 2 de Março, e 197/99, de 8 de Julho, confessas transposições das Directivas de 1993, atrás identificadas.
Por se mostrar relevante, indicam-se de seguida as conclusões tiradas no Parecer nº 145/2001, invocado, aliás, no presente processo (8):
"1.ª O serviço de utilização comum dos hospitais (SUCH), criado nos termos do Decreto-Lei n.º 46 668, de 24 de Novembro de 1965, retomou, com a execução do procedimento previsto no Decreto-Lei n.º 12/93, de 15 de Janeiro, a estrutura associativa e a designação de pessoa colectiva de utilidade pública administrativa (artigo 1.º, n.º 2, dos estatutos).
2.ª O SUCH, associação de entidades hospitalares públicas e privadas e de instituições particulares de solidariedade social que se dediquem à promoção e protecção da saúde, deve ser qualificado, pelas suas finalidades estatutárias e pelo regime de intervenção estadual a que está submetido, como pessoa colectiva de utilidade pública administrativa.
3.ª No regime estatutário do SUCH compreendem-se traços juspublicísticos, com incidência na designação dos titulares dos seus órgãos directivos, pelo Governo (artigos 13.º, n.º 2, e 16.º, n.º 2, dos estatutos) e a sujeição de alguns actos de gestão a tutela integrativa do Estado (artigo 15.º, n.º 1, alíneas e), f) e g), dos mesmos estatutos).
4.ª A finalidade principal do SUCH é a prestação de certos serviços aos seus associados, para um funcionamento mais ágil e eficiente destes e em regime materialmente de cooperação e entreajuda, sem apelo a recursos exteriores.
5.ª No regime de concorrência e de mercado, o SUCH pode ainda desenvolver actividades em todas as áreas de apoio das instituições e serviços que integram o sistema de saúde português, sejam ou não seus associados.
6.ª O regime previsto nos Decretos-Leis nºs 59/99, de 2 de Março, e 197/99, de 8 de Junho, pressupõe a necessidade de recurso a contratantes externos, destinando-se a salvaguardar os princípios da concorrência e da imparcialidade em vista a garantir a igualdade de tratamento dos operadores que pretendam contratar com a Administração.
7.ª Consequentemente, a actuação do SUCH no exercício das atribuições referidas na conclusão 4.ª mostra-se excluída dos pressupostos de aplicação do regime jurídico dos diplomas legais mencionados na conclusão anterior.8.ª Fora das situações a que se referem as anteriores 4.ª e 7.ª conclusões, o SUCH, sempre que, como dono de obra ou adjudicante de bens e serviços, careça de contratar com terceiros, inclui-se entre as entidades equiparadas a organismos de direito público, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 3.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março, e 3.º, n.º 1,do Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de Junho, compreendendo-se, nessa estrita medida, no âmbito da aplicação subjectiva destes diplomas legais." 

O cerne da doutrina do referido Parecer é, assim, o de, nos contratos entre o SUCH e os seus associados públicos, não estar em causa o recurso, por estes, a um contratante externo.
As declarações de voto proferidas no mesmo Parecer, discordando da qualificação jurídica atribuída ao SUCH, vão, aliás, no mesmo sentido fundamental: podendo qualificar-se o SUCH como um organismo de direito público, daí decorreria a possibilidade de contratação directa com outro organismo da mesma natureza.
Este entendimento era compatível com alguma doutrina construída sobre as directivas comunitárias então em vigor.
Como refere CLÁUDIA VIANA (9), o disposto no artigo 1.º, alínea c), da Directiva 92/50/CEE e no artigo 1.º, n.º 6, da Directiva n.º 93/38/CEE, conjugado com os artigos 6º e 11º, das ditas Directivas 92/50/CEE e 93/38/CEE, respectivamente, levava alguns autores a admitir que os contratos celebrados entre dois entes públicos estavam excluídos da regulação comunitária.
Nesse sentido, era relativamente ampla a possibilidade de caracterizar determinados tipos de contratação, entre entes públicos, como auto-satisfação de necessidades.
No entanto, e tal como já se reconhecia quando se decidiu solicitar o segundo parecer à Procuradoria-Geral da República (10), assistiu-se, entretanto, a uma significativa evolução das circunstâncias, que coloca em causa, hoje, a actualidade do Parecer da PGR nº 145/2001, supra referido.

Efectivamente:
- Foram publicadas novas Directivas europeias (11), que clarificaram (limitando) a possibilidade de celebração de contratos entre entidades adjudicantes;
- Foi proferida relevante jurisprudência do Tribunal de Justiça Europeu sobre a matéria, densificando as excepções à aplicação do regime comunitário de contratação pública e declarando o seu carácter restritivo;
- Foi publicado, no plano nacional, o novo Código dos Contratos Públicos (12), que alarga, significativamente, em nome do princípio da concorrência, o âmbito dos contratos cuja formação fica submetida aos procedimentos nele regulados;
- O estatuto jurídico dos hospitais públicos sofreu importante evolução, sendo que parte deles não fazem já parte do Sector Público Administrativo, tendo um regime empresarial;
- O estatuto e o regime do SUCH sofreram também modificações relevantes, que reforçaram a sua vertente associativa e privada, com enfraquecimento dos poderes tutelares e de controlo do Estado (13).
Ora, face a estas mutações, a doutrina do Parecer da PGR supra referenciado não pode já ter-se como segura e, sequer, como adiante veremos, como actual e válida.

2. Importa analisar, de seguida, a natureza do Protocolo ora submetido à fiscalização prévia deste Tribunal.
O Protocolo em apreço consubstancia um acordo de vontades entre duas pessoas jurídicas distintas, entre as quais não existem relações hierárquicas.
Além disso, este acordo tem um conteúdo inequivocamente sinalagmático e obrigacional.
Como decorre da matéria de facto dada por assente nas alíneas D) e E) do probatório, o Protocolo aqui em causa tem por objecto a "execução das obras necessárias para a Remodelação da Instalação de Ar Condicionado dos Serviços de Medicina Física e Reabilitação, Consultas Externas, Esterilização, Oftalmologia e Quartos de Isolamento" do Hospital do Litoral Alentejano, com base no projecto por este aprovado.
Estamos, assim, perante um contrato que é composto por uma diversidade de prestações, correspondentes a vários tipos de contratos típicos, uma vez que envolve componentes de fornecimento de equipamentos, fornecimento de serviços e trabalhos de construção/instalação de equipamento e condutas para aquecimento, ventilação, refrigeração e climatização, a cujo cumprimento corresponde o pagamento de um preço.
Existe aqui, pois, uma unicidade contratual e, consequentemente, um único procedimento pré-contratual (14).
Importa agora caracterizar este contrato que, contemplando prestações próprias de diferentes contratos típicos (15), se pode ter como um contrato misto.
No domínio do DL nº 59/99 de 2 de Março, a disciplina dos contratos mistos estava regulada no artigo 5º, deste diploma legal, que apontava para a aplicação do regime previsto para a componente de maior expressão financeira, quando na contratação pública se abrangessem, simultaneamente, prestações autónomas de aquisição de bens ou serviços e empreitadas de obras públicas.
Actualmente, o Código dos Contratos Públicos (CCP) trata dos contratos mistos, e, mais especificamente, da escolha do procedimento para a sua formação, no artigo 32º, subordinado à epígrafe "Escolha do procedimento para a formação de contratos mistos".
Este artigo 32º não tem, porém, uma disciplina semelhante à do artigo 5º do DL nº 59/99 de 2 de Março, quanto à disciplina aplicável a tais contratos.

Contudo, o seu nº2, al. a), dispõe o seguinte:

Artigo 32º
Escolha do procedimento pata a formação de contratos mistos
............................................................
2 - Para a formação de um contrato misto cujo objecto abranja simultaneamente, prestações típicas dos contratos de empreitada de obras públicas, de locação ou de aquisição de bens móveis ou aquisição de serviços:
•a)                  A escolha do ajuste directo, bem como a escolha do concurso público ou do concurso limitado por prévia qualificação, sem publicação do respectivo anúncio no Jornal Oficial da União Europeia, permite a celebração daquele contrato desde que o respectivo valor seja inferior ao mais baixo dos valores até aos quais seria permitida, nos termos do disposto na alínea a) do artigo 19º e da alínea a) do nº1de artigo20º, a celebração de um contrato se4parado cujo objecto abrangesse prestações típicas de apenas um daqueles contratos.
•b)                  ...................................................................................... 

Para encontrar essa disciplina jurídica, devemos, assim, socorrer-nos, para além deste artigo 32º do CCP, também da Directiva nº 2004/18/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de Março, cuja transposição para o nosso Direito interno foi efectuada pelo referido CCP.
O artigo 1º desta Directiva, com a epígrafe "Definições" estabelece no seu nº2, al. b) que "´contratos de empreitada de obras públicas´ são  contratos públicos (16) que têm por objecto quer a execução, quer conjuntamente a concepção e execução, quer ainda a realização, por qualquer meio, de trabalhos relacionados com uma das actividades na acepção do anexo I ou de uma obra que satisfaça as necessidades especificadas pela entidade adjudicante". (17)
Por seu lado, dispõe a al. c) do nº2, do mesmo artigo 1º, que " ´contratos públicos de fornecimento´ são contratos públicos, que não os abrangidos pela alínea b), que têm por objecto a compra, a locação financeira, a locação ou a locação-venda, com ou sem opção de compra, de produtos".
Nesta mesma alínea c), estabelece-se ainda que é considerado um "contrato público de fornecimento", o contrato público que tenha por objecto o fornecimento de produtos e, a título acessório, operações de montagem e instalação.
Ora, o presente Protocolo tem por objecto, como acima se disse, a execução da obra de remodelação da instalação de ar condicionado em vários serviços do Hospital do Litoral Alentejano, obra essa composta por trabalhos próprios de diversos contratos típicos (vide a matéria de facto dada por assente nas alíneas E) e F) do probatório).
Estamos, pois, perante a execução de trabalhos que, nos termos do Anexo I à citada Directiva, se integram na actividade de construção, e mais propriamente, na actividade de instalação de canalizações e de climatização, conforme resulta da Divisão 45´, (Descrição "construção"), Grupo 45.3 (Descrição "Instalações especiais"), classe 45.33 (Descrição "Instalação de canalizações e de climatização") e compreendem o equipamento e condutas para aquecimento, ventilação, refrigeração e climatização (AVAC), tal como se refere nas observações que são indicadas, na mesma Directiva, relativamente à descrição dos trabalhos em causa.
Nesta conformidade, tendo o Protocolo aqui em causa, por objecto, trabalhos compreendidos na actividade de construção, tal como previsto no Anexo I à Directiva 2004/18/CE, e sendo um contrato oneroso celebrado entre um operador económico e uma entidade adjudicante, estamos perante um contrato público de empreitada de obras públicas,  na acepção da mencionada Directiva.
Efectivamente, a inclusão do contrato ora submetido a fiscalização prévia deste Tribunal, na alínea b) do nº2, do artigo 1º da Directiva nº 2004/18/CE, afasta a sua inclusão e caracterização como "contrato público de fornecimento", tal como resulta da alínea c) do mesmo normativo.
Por outro lado, afastada está, também, aqui, a caracterização deste contrato, como "contrato público de serviços", uma vez que, a alínea d), do nº2, do mesmo artigo 1º, da Directiva, estabelece que o contrato público de serviços é aquele que, não sendo contrato de empreitada de obras públicas, ou contrato público de fornecimento, tem em vista a prestação de serviços mencionados no Anexo II à Directiva.
Assim, manifesto é estarmos, no caso sub judice, perante um contrato de empreitada de obras públicas, - claramente um contrato oneroso - em que se estabelece um benefício económico pela realização das prestações nele contempladas, e não perante qualquer forma de cooperação ou assistência mútua, estatutariamente determinada, para a realização de uma missão de serviço público.
Efectivamente, inexistem, por um lado, quaisquer cláusulas específicas de serviço público, e, por outro lado, o tipo de trabalhos aqui em causa poderia ser adquirido no mercado, e nele oferecido por qualquer operador, sendo certo, ainda, que o incumprimento do contrato está sujeito a penalizações pecuniárias, o que dificilmente se concebe numa relação não contratual.
Ora, estando nós perante um verdadeiro contrato, importa sublinhar que o princípio geral, hoje consagrado no Código dos Contratos Públicos, é - ao contrário do que antes sucedia - o de que o regime de contratação pública nele estabelecido é tendencialmente aplicável à formação de todo e qualquer contrato público, entendendo-se por tal, todo aquele que, independentemente da sua designação e natureza, seja celebrado pelas entidades adjudicantes referidas no Código. (18)(19) 
O Hospital do Litoral Alentejano - hospital do sector público administrativo (SPA) (20)- é uma entidade adjudicante, nos termos do artigo 2º, nº1, al. d) do Código dos Contratos Públicos, pelo que os contratos por ele celebrados são contratos públicos.

Estamos, pois, perante um contrato regido pelo Código dos Contratos Públicos e pela legislação comunitária de contratação pública.

3. Veremos, seguidamente, a natureza dos contratantes.

3. 1. O Hospital do Litoral Alentejano, localizado no concelho de Santiago do Cacém, foi criado pelo DL nº 172/2003, de 1 de Agosto, cujo artigo 1º o caracteriza como estabelecimento público dotado de personalidade jurídica, autonomia administrativa, financeira e patrimonial, no âmbito de aplicação do nº1, do artigo 2º, do Regime Jurídico da Gestão Hospitalar, aprovado pela Lei nº 27/2002 de 8 de Novembro.
O Hospital, de harmonia com o estipulado no artigo 2º, do mesmo DL nº 172/2003, ficou sujeito, pelo período de dois anos, ao regime de instalação estabelecido pelo DL nº 215/97 de 18 de Agosto, sendo dirigido por uma comissão instaladora constituída presidente do conselho de administração do Hospital do Conde do Bracial (21), que presidia, e pelos respectivos vogais (artigo 3º).
Referimos atrás que o Hospital do Litoral Alentejano se integra no sector público administrativo.
Por outro lado, e nos termos do artigo 3º da Lei nº 3/2004 de 15 de Janeiro (22), tem a natureza de instituto público, sendo uma entidade adjudicante, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 2.º do Código dos Contratos Públicos.
Na actualidade, e por força do disposto no DL nº 303/2009 de 22 de Outubro, o Hospital do Litoral Alentejano foi transformado em entidade pública empresarial (EPE), com a designação de Hospital do Litoral Alentejano, EPE, cujos estatutos, de acordo o artigo 1º, nº2, deste diploma legal, são os constantes do anexo II ao DL nº 233/2005 de 29 de Dezembro, com as especificidades estatutárias constantes do anexo ao citado DL nº 303/2009.
Esta entidade pública empresarial sucedeu ao Hospital do Litoral Alentejano em todos os direitos e obrigações (artigo 2º do DL nº 303/2009).                                               

3. 2. A jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias tem vindo a afirmar claramente (23) que o regime de contratação pública se aplica, em princípio, aos casos em que uma entidade adjudicante celebra por escrito, com uma entidade dela distinta no plano formal e dela autónoma no plano decisório, um contrato a título oneroso que tenha um objecto abrangido por essas directivas, quer esta segunda entidade seja ela própria uma entidade adjudicante quer não.
Isto significa que, desde que estejamos perante um contrato outorgado por duas entidades distintas, nos planos formal e decisório, devemos aplicar as regras da contratação pública, mesmo que essas entidades sejam, ambas, entes públicos ou entidades adjudicantes.
As Directivas de 2004, na senda da jurisprudência do Tribunal de Justiça, vieram clarificar que a participação de organismos de direito público como concorrentes em procedimentos pré-contratuais não pode pôr em causa a livre concorrência (24) e que a possibilidade de celebração directa de um contrato público, entre entidades adjudicantes, está, hoje, apenas prevista para contratos públicos de serviços e somente em caso de existência de um direito exclusivo. (25)
De acordo com essa jurisprudência, esta excepção deve ser interpretada restritivamente. (26)
Assim, é hoje bem claro (27), no plano do direito europeu dos contratos públicos, que a celebração de contratos públicos, economicamente relevantes, deve estar sujeita às normas de contratação pública, mesmo quando seja feita entre entidades públicas.
Ora, se a contratação inter-administrativa não é, em regra, e por si própria, considerada como uma forma de auto-satisfação das necessidades, a não ser em situações muito delimitadas, não há razões para deixar de aplicar os mesmos critérios rigorosos quando esteja em causa a contratação entre entes públicos e entes não públicos.
O SUCH é, na afirmação do Parecer da Procuradoria-Geral da República referido acima, uma pessoa colectiva de utilidade pública administrativa, sendo que estas entidades têm sido consideradas, pela doutrina dominante, como pessoas colectivas de direito privado. (28)
Como se refere na alínea I) do probatório, o próprio SUCH se autoqualifica como um organismo de direito privado.
Além disso, como se evidencia na alínea K) do probatório, e é consentido pelo artigo 6.º dos Estatutos, contam-se, entre os associados do SUCH, entidades privadas.
Acresce que, nos termos do artigo 2.º, n.º 1, alínea d), dos actuais Estatutos do SUCH, esta associação tem, hoje, também por objecto constituir unidades de serviços partilhados, destinadas a assegurar a prestação, aos seus associados, da generalidade dos serviços de apoio à prestação de cuidados de saúde.
De acordo com o n.º 3 do mesmo normativo, estas unidades de serviços partilhados podem ser constituídas sob a forma de pessoas colectivas integradas pelo SUCH e pelos seus associados e/ou por terceiras pessoas.
Conforme consta do site do SUCH na internet, (29) e consta em anexo ao Relatório de Gestão e Contas 2008, foram criadas pelo SUCH, designadamente, as seguintes entidades:

§ SUCH Dalkia, Serviços Hospitalares: Criada em Junho de 1996, é um Agrupamento Complementar de Empresas (ACE), sendo 50% propriedade do Serviço de Utilização Comum dos Hospitais e os restantes 50% da "DALKIA - Empresa de Serviços, Condução e Manutenção de Instalações Técnicas, S.A". Este ACE tem por objecto social a produção de energia eléctrica e a gestão das actividades dos seus membros relacionadas com a gestão e exploração de actividades de apoio em hospitais, designadamente o conjunto de serviços técnicos de manutenção de equipamentos e exploração de lavandarias.

§ EAS - Empresa de Ambiente na Saúde, Tratamento de Resíduos Hospitalares: Criada em Maio de 2001, a EAS é totalmente detida pelo Serviço de Utilização Comum dos Hospitais. Transformada em Maio de 2008 em "EAS Unipessoal, Lda.", com alargamento do seu objecto social, possui uma participação de 64,53% no capital da "Valor Hospital, SA".

§ Somos COMPRAS, ACE: Criado em Abril de 2007, Somos COMPRAS é uma entidade empresarial de serviços partilhados para a área de Compras e Logística na Saúde. São agrupados deste ACE, para além do SUCH, com 86%, três grupos hospitalares: - Centro Hospitalar de Lisboa Central, EPE, Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, EPE e Hospital de Santa Maria, EPE, representando uma participação de 9%. Integra ainda este ACE, com uma participação de 5%, um parceiro especializado, a "SGG - Serviços Gerais de Gestão SA", uma empresa do universo da "DeloitteTouche Tohmatsu".

§ Somos PESSOAS, ACE: Com uma participação de 95%, o SUCH é o principal agrupado do Somos PESSOAS, Agrupamento Complementar de Empresas criado em Junho de 2007, tendo a "Capgemini, SA", como parceiro especializado, os restantes 5%. Este ACE disponibiliza serviços partilhados de gestão de Recursos Humanos.

§ Somos CONTAS, ACE: O SUCH detém uma participação de 95% na Somos CONTAS, agrupamento Complementar de Empresas (ACE) criado em Junho de 2007, para o desenvolvimento de serviços partilhados de gestão financeira, em que também é agrupado um parceiro especializado, a "Accenture, SA", que detém os restantes 5%.

§ Somos AMBIENTE, ACE: Com uma participação de 80%, o SUCH é o principal agrupado do Somos AMBIENTE, ACE, Agrupamento Complementar de Empresas criado em Julho de 2008. Esta unidade empresarial tem por objectivo principal a construção e exploração de um Centro Integrado de Valorização Energética, Reciclagem e Tratamento de Resíduos e conta com a participação de um parceiro especializado e de um parceiro tecnológico.

Estas participações repercutem-se na própria organização estrutural do SUCH.
Assim, se atentarmos no seu organigrama, verificamos a existência de áreas de negócio constituídas em sociedades, com órgãos sociais próprios, integrados por representantes do SUCH e das empresas participadas.
Por exemplo: na "Somos Pessoas", a Assembleia-Geral tem um representante da "Cap Gemini, SA"; na "Somos Contas", um representante da "Accenture, SA".
No Relatório de Gestão e Contas de 2008 refere-se que, nesse ano, se verificou o arranque das operações dos ACE, a externalização dos processos transaccionais e a definição da estratégia de empresarialização das áreas. Desta estratégia faz parte, como se refere a páginas 22 desse Relatório, a saída do SUCH da posição de prestador de serviços, externalizando-os, e a sua consolidação como parceiro e gestor de contratos.
Deste e de outros documentos, constantes do site do SUCH, resulta clara a actuação de natureza empresarial e de mercado adoptada pelo SUCH nos últimos anos e a estratégia em curso de reforço dessa perspectiva.
Na verdade, como se deixou assente na alínea Y) do probatório, 24,6% da facturação do SUCH em 2008 (21.614.562,09 €) respeitou a entidades não associadas do mesmo.
Do exposto, resulta que o novo modelo organizativo e a actividade desenvolvida, dificilmente se compaginam com a tradicional visão do SUCH como um instrumento de pura "cooperação e interajuda", de "colocação em comum de meios para a obtenção de directas vantagens comuns, dentro do mesmo círculo pessoal dos associados" (30), como um mero braço dos seus associados para a auto-satisfação das suas necessidades.
Estamos agora perante uma organização empresarial sofisticada, que, para além de ser privada, conjuga meios próprios com parcerias de negócio, nas quais participam empresas privadas de carácter puramente mercantil.

4. Abordaremos, de seguida, uma questão que é suscitada pela entidade adjudicante, para justificar a adopção, no caso em apreço, do procedimento por ajuste directo, qual seja a de, no caso vertente, se estar perante a chamada "contratação in house" e, por isso, subtraída dos procedimentos pré-contratuais previstos para a contratação pública, na parte II, do Código dos Contratos Públicos (CCP), tendo em conta o disposto no artigo 5º, deste Código, e designadamente, os seus nºs 2 e 6.

Dispõem os nºs 2 e 6, do artigo 5º do CCP:

Artigo 5º
Contratação excluída
1 - ..........................................................................
2 - A parte II do presente código também não é aplicável à formação dos contratos, independentemente do seu objecto, a celebrarpor entidades adjudicantes com uma outra entidade, desde que:
a) A entidade adjudicante exerça sobre a actividade desta, isoladamente ou em conjunto com outras entidades adjudicantes, um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços; e
b) Esta entidade desenvolva o essencial da sua actividade em benefício de uma ou de várias entidades adjudicantes que exerçam sobre ela o controlo análogo referido na alínea anterior.
3 - .........................................................................
4 - ........................................................................
5 - ........................................................................
6 - À formação dos contratos referidos nos nºs 1 a 4 são aplicáveis:
a) Os princípios gerais da actividade administrativa e as normas que concretizem preceitos constitucionais constantes do Código do Procedimento Administrativo; ou
b) Quando estejam em causa contratos com objecto passível de acto administrativo e demais contratos sobre o exercício de poderes públicos, as normas constantes do Código do Procedimento Administrativo, com as necessárias adaptações.
..................................................................................

Como se colhe do nº2, do artigo 5º, do CCP, e, citando JORGE ANDRADE DA SILVA (31), estão excluídos do regime de formação dos contratos públicos, - e dos princípios que os regem - os chamados contratos in house (32), meramente internos, por serem celebrados entre uma entidade pública e outra entidade que é um seu prolongamento e cuja actividade, por isso mesmo, a primeira controla, existindo, entre aquela e esta, uma relação de dependência jurídica por forma a que se não possa falar, relativamente à entidade dependente, da existência de vontade própria.
Neste tipo de contratos estão incluídos os celebrados entre o Estado e as entidades que integram a chamada Administração Indirecta. (33)
Ora, ao falar-se de contratação excluída dos princípios da contratação pública, importa aludir a que princípios nos reportamos. Assim, no domínio da contratação pública, e como refere RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA (34), encontramos princípios gerais de direito comunitário (v. g. os da igualdade, da imparcialidade e da concorrência), princípios específicos da realidade comunitária (v. g. o da proibição da discriminação em razão da nacionalidade e o do reconhecimento mútuo) e, ainda, princípios específicos da realidade da contratação pública (v. g. o da intangibilidade das propostas).

4. 1. Para situarmos os tipos de contratos excluídos do regime de formação e dos princípios que regem a contratação pública, e, designadamente, precisarmos o conceito de "contratos in house", há que fazer uma breve excursão histórica.
Desde os anos 90 que têm sido presentes ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (TJCE) processos (recursos) onde se equaciona se os Estados Membros estarão ou não sujeitos às exigências pré-contratuais das normas comunitárias e nacionais, quando uma entidade pública adquire bens, ou serviços, a outro ente público sob o seu controlo.
O conceito da contratação in house tem origem no direito comunitário, sendo uma construção da jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, em articulação com o estipulado nas Directivas 92/50/CEE do Conselho, de 18 de Junho de 1992 e 93/36/CEE, do Conselho, de 14 de Junho de 1993.                                               
Como refere CLÁUDIA VIANA (35), até à publicação das Directivas de 2004, a celebração de contratos, entre entidades adjudicantes e entes públicos, apenas era objecto de regulação na Directiva 92/50/CEE, do Conselho, de 18 de Junho, que estabelecia no seu artigo 1º, al. c) que "os prestadores de serviços são qualquer pessoa singular ou colectiva, incluindo organismos de direito público, que ofereçam serviços".
No mesmo sentido, o nº6, do artigo 1º da Directiva 93/36/CEE do Conselho, de 14 de Junho, admitia que o prestador de serviços podia ser uma entidade adjudicante.
No Acórdão Teckal, de 18 de Novembro de 1999 (36)- pioneiro nesta matéria - o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias sintetizou as condições que teriam que se verificar para que um contrato deste tipo se pudesse considerar excepcionado da regra do concurso público.
Assim, considerou-se, neste Acórdão, que se verificaria uma relação "in house" na hipótese de, simultaneamente, a entidade adjudicante exercer, sobre o adjudicatário, um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços, e de essa entidade realizar o essencial da sua actividade com a(s) entidade(s) adjudicante(s) que a controla(m).
Nestes casos, a dependência do co-contratante em relação à(s) entidade(s) adjudicante(s) caracteriza-se por ser, simultaneamente,  estrutural, através do controlo, e funcional, através da inexistência de uma liberdade de actuação. (37)Tratando-se de um contrato "in house", não haveria lugar à aplicação das regras gerais da contratação pública, pois, na realidade, tudo se processava no âmbito de uma "relação interna" de fornecimento e satisfação de necessidades da(s) própria(s) entidade(s) adjudicante(s), em que o co-contratante era uma longa manus  desta(s) mesma(s) entidade(s), não obstante se estar perante pessoas juridicamente distintas.

4. 2. A qualificação de uma relação contratual como "in house", depende, pois, da verificação cumulativa de dois requisitos (38):
1) O controlo análogo, ou seja, o controlo (dependência estrutural e controlo efectivo) exercido pela(s) entidade(s) adjudicante(s), sobre a entidade com a qual pretende(m) celebrar o contrato, deve ser  análogo àquele que a(s) entidade(s) adjudicante(s) exerce(m) sobre os seus próprios serviços;
2) O essencial da actividade exercida pela adjudicatária é em proveito da(s) entidade(s) adjudicante(s): a entidade com a qual é celebrado o contrato, deve realizar a parte substancial da sua actividade, em benefício da(s) entidade(s) adjudicante(s).  

Estes dois requisitos identificados pelo TJCE, e designadamente o segundo requisito, não são, no entanto, de fácil interpretação e verificação.
São conceitos vagos e indeterminados, cujo sentido e alcance se revela, por vezes, difícil.

Efectivamente, e v. g., como apurar, no concreto, a existência de um controlo análogo ao que a entidade adjudicante exerce sobre os seus próprios serviços?

E como qualificar, quantitativa e/ou qualitativamente, a circunstância de, o essencial da actividade da entidade adjudicatária, ser realizado em proveito da entidade adjudicante?                                           

4. 3. A jurisprudência do TJCE fornece-nos uma ajuda nesta tarefa de interpretação:

Na verdade, dos Acórdãos Stadt Halle, de 11 de Janeiro de 2005, e Parking Brixen, de 13 de Outubro de 2005, retira-se, desde logo, uma primeira e importante ideia, para balizar a nossa tarefa interpretativa:
Tratando-se a contratação in house, de uma excepção às regras gerais do direito comunitário, as duas condições acima enunciadas devem ser objecto de uma interpretação restritiva, recaindo sobre aquele que as invoca, o ónus da prova de que existem, efectivamente, circunstâncias excepcionais que justificam a derrogação das ditas regras gerais (vide o ponto 46 do Acordão Stadt Halle e RPL Lochau - Processo nº C-26/03 - e o ponto 63 do Acordão Parking Brixen - Processo nº C-458/03). (39)

4. 4. Vejamos, agora, em que consistem os dois requisitos atrás referidos, começando por analisar o do " controlo análogo":

O que entender, então, por controlo análogo?

Na expressão de R. PERIN / D. CASALINI (40) para que se possa concluir por uma relação de controlo análogo entre a Administração adjudicante e uma qualquer entidade dela distinta, sob o plano formal, é mister que, à primeira caiba um "penetrante poder de indirizzo" ou, segundo RICCARDO URSI (41), um "adstringente poder de direcção" sobre a actividade da entidade sujeita ao seu poder de controlo (organização in house), um poder que lhe permita exercer uma influência determinante (e não apenas dominante), sobre os objectivos estratégicos e as decisões vitais, a tomar pela organização in house (42).
Prosseguindo na caracterização deste requisito, e para análise da situação vertente, importa, antes de mais, distinguir, aqui, três situações: 
a) A co-contratante adjudicatária pode ser uma sociedade de capitais públicos unipessoal (o capital é detido a 100% por uma única entidade pública).
b) A co-contratante adjudicatária pode ser uma sociedade de capitais públicos pluriparticipados (o capital é detido por uma pluralidade de entidades públicas).
c) A co-contratante pode ser uma sociedade de economia mista (sociedade em que os entes privados detém parte do capital) ou de capitais públicos, com previsão, nos seus estatutos, da possibilidade de abertura a capitais privados.
No que respeita a esta última situação, o TJCE conclui pela inadmissibilidade da excepção in house, sempre que a adjudicatária seja participada por capitais privados, ou naquelas situações em que, em termos estatutários, existe a possibilidade de participação do capital privado - neste sentido vide o Acórdão "Stadt Halle", de 11 de Janeiro de 2005; o Acórdão "Coname", de 12 de Abril de 2005; o Acórdão "Brixen", de 13 de Outubro de 2005; o Acórdão "ANAV", de 06 de Abril de 2006 e o Acórdão "Agusta e Agusta Bell", de 08 de Abril de 2008.

Já no que respeita às duas primeiras situações - sociedades de capitais públicos - a jurisprudência é menos abundante:                                               
Aqui, apenas podemos recensear dois Acórdãos do TJCE: o Acórdão "Carbotermo", de 11 de Maio de 2006 e o Acórdão "Tragsa", de 19 de Abril de 2007.
Ora, como se refere no ponto 37, do Acórdão "Carbotermo", "a circunstância de a entidade adjudicante deter, isoladamente ou em conjunto com outros poderes públicos, a totalidade do capital de uma sociedade adjudicatária, tende a indicar, sem ser decisiva, que esta entidade adjudicante exerce sobre esta sociedade um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços".
Por seu turno, e como se colhe do ponto 57, do Acórdão "Tragsa", "no que respeita à primeira condição, relativa ao controlo da autoridade pública, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a circunstância adjudicante deter, isoladamente ou em conjunto com outras autoridades públicas, a totalidade do capital de uma sociedade adjudicatária constitui, em princípio, um indício de que essa entidade adjudicante exerce sobre esta sociedade um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços
No caso de a titularidade de todo o capital social de uma sociedade adjudicatária, pertencer a uma única entidade pública, poder-se-á dizer, com J.
KOKKOT (43), que se presume estar, forçosamente, preenchido o requisito de controlo análogo, pois, nessa hipótese, são substancialmente coincidentes os interesses da entidade adjudicante com os da sociedade controlada.
Com efeito, mesmo perante a ausência de um poder de direcção em sentido técnico, certo é que cabe à administração da entidade adjudicante o poder de nomear os titulares dos órgãos executivos da sociedade adjudicatária.
Ora, estes últimos, até pela estreita ligação pessoal que os une à entidade pública matriz, dificilmente se afastarão das directivas que lhes são impostas, tendo em mente a realização dos objectivos estabelecidos no interesse geral.
Encontramos, assim, plasmada nestes dois acórdãos, uma ideia de presunção de controlo análogo, quando o capital social da co-contratante é detido na sua totalidade por entidades públicas.

4. 5. Vejamos, de seguida, o segundo requisito, ou seja o de a entidade adjudicatária dever desenvolver o essencial da sua actividade em benefício de uma ou de várias entidades adjudicantes, que exerçam, sobre ela, o controlo análogo que vimos atrás.
Haverá, assim, que aferir se o SUCH desenvolve o essencial da sua actividade em benefício dos seus associados.
Neste âmbito, importa reter que, no Acórdão Carbotermo, supra referido, e sobre este segundo requisito, se disse:
"... A exigência de que a pessoa em causa realize o essencial da sua actividade com a, ou as autarquias que a controlam, tem especificadamente por objectivo assegurar que a Directiva 93/36/CEE continue a ser aplicável, quando esteja activa, no mercado, uma empresa controlada por uma ou várias autarquias, que pode, portanto, entrar em concorrência com outras empresas.
Com efeito, uma empresa não fica necessariamente privada da respectiva liberdade de acção, pelo simples facto de as decisões, que lhe dizem respeito, serem controladas pela autarquia que a detém, se, apesar disso, puder exercer uma parte importante da sua actividade económica com outros operadores.
É ainda necessário que as prestações desta empresa sejam substancialmente destinadas a esta única autarquia. Nestes limites, justifica-se que esta empresa escape às imposições da Directiva 93/36/CEE, já que estas são ditadas pela preocupação de preservar uma concorrência que, nesse caso, já não tem razão de ser...".

Aplicando estes princípios ao caso que nos ocupa, poderá considerar-se que o SUCH realiza o essencial da sua actividade em benefício dos seus associados, que o controlam - na acepção do Acórdão Teckal, já referido - se a sua actividade for dirigida principalmente aos associados, revestindo qualquer outra actividade, apenas carácter marginal. 
Ora, para apreciar se este é o caso sub judice, deve o Tribunal tomar em consideração todas as circunstâncias do caso em apreço, tanto qualitativas como quantitativas, tendo em conta a matéria de facto dada por adquirida, nas várias alíneas do probatório.
Deste modo, para apreciar se uma determinada entidade realiza o essencial da sua actividade em proveito da(s) entidade(s) que a controla(m), a fim de decidir da aplicabilidade da Directiva 93/36/CEE, há que tomar em conta todas as actividades que aquela entidade realiza, com base na adjudicação feita pela(s) entidade(s) adjudicante(s), independentemente de quem remunera esta actividade, e quer se trate da(s) própria(s) entidade(s) adjudicante(s) ou do utilizador das prestações fornecidas, sendo irrelevante o território onde esta actividade é exercida.
No Acórdão Tragsa, o TJCE socorreu-se de um critério quantitativo, para densificar este segundo critério:
Tratou-se do volume de negócios.
Ora, na situação tratada no Acórdão Tragsa, o TJCE considerou preenchido o segundo requisito, numa situação concreta em que, 90% do total das actividades da adjudicatária, era realizado em benefício da entidade adjudicante.
Por outro lado, quanto ao facto de o essencial da actividade da adjudicatária dever ser realizado com a(s) entidade(s) pública(s) que detêm esta sociedade, o citado Acórdão considerou que, no caso de várias entidades deterem uma empresa, aquela condição pode ser satisfeita se esta empresa realizar o essencial da sua actividade, não apenas com uma ou outra entidade, mas com essas entidades, consideradas no seu conjunto.
Como sustenta BERNARDO AZEVEDO (44), a obrigatoriedade de o essencial da actividade da adjudicatária se destinar a abastecer a(s) entidade(s) adjudicante(s) exprime a sua dependência económico-jurídica, por referência a esta(s) ultima(s).
A entidade dependente deve, pois, funcionar como um "operador dedicado", concentrado, exclusivamente, ou quase, em alimentar (por via da prestação de serviços ou do fornecimento de bens) o seu ente-matriz, no desenvolvimento da respectiva missão.
A observância deste regime de (quase) "dedicação exclusiva", afere-se pelo volume de negócios da organização in house, o qual deve reflectir que todas as actividades não dedicadas, têm uma expressão puramente marginal no respectivo exercício (destinando-se, quando muito, à realização de sinergias produtivas).
É que, apesar de o essencial da sua actividade de destinar a abastecer a entidade adjudicante, a entidade controlada não está, ainda assim, inibida de, a titulo puramente subsidiário ou complementar, exercer outras actividades (até por razões de economia de escala e de rentabilização dos seus activos), ponto é que o essencial da actuação, no âmbito do seu objecto social, tenha sempre de se focar, principalmente, na satisfação de necessidades (directas ou indirectas) da entidade adjudicante.

5. É chegada a altura de reverter para o caso que nos ocupa. 

No caso vertente, a entidade adjudicante é o Hospital do Litoral Alentejano, que, como já vimos, é um dos 95 associados do SUCH.  
Nos termos do artigo 2.º, n.º 1, alínea d) dos Estatutos do SUCH, competelhe tomar a seu cargo as iniciativas susceptíveis de contribuir para o funcionamento mais ágil e eficiente dos seus Associados, libertando-os para a plena dedicação à prestação de cuidados de saúde ao cidadão, designadamente constituindo unidades de serviços partilhados, destinadas a assegurar a prestação aos seus associados da generalidade dos serviços de apoio à prestação de cuidados de saúde, designadamente a gestão integrada de recursos humanos, gestão administrativa e financeira, informática e telecomunicações e gestão de frotas automóveis.
Esta incumbência do SUCH surge como uma vertente do seu objecto social, descrito nos estatutos, e não como uma imposição administrativa da entidade adjudicante. As concretas prestações são asseguradas por via negocial.
Nestes termos, não se pode afirmar que a adjudicante possa impor ao SUCH a prestação dos serviços em causa. O SUCH oferece-os, no âmbito do seu objecto social (45), e não por determinação da adjudicante.
Face ao regime aplicável, afigura-se que, formalmente, o SUCH dispõe de liberdade quanto ao seguimento a dar a um pedido feito pelos seus associados, e também quanto ao preço aplicável às suas prestações. (46)(47)
O SUCH possui, por outro lado, autonomia decisória para realizar quaisquer actos ou actividades não determinadas ou solicitadas pela adjudicante.
Mas, mesmo que consideremos os seus associados como um conjunto homogéneo (48), e que se defenda que o SUCH está estatutariamente vinculado a oferecer-lhes determinado tipo de serviços, ou mesmo que se configurasse que essas actividades eram impostas pela entidade tutelar (o Estado) (49), a verdade é que, nos termos do n.º 2 do artigo 2.º dos Estatutos, o SUCH pode também desenvolver livremente actividades "em regime de concorrência e de mercado", para outras entidades, actividades que dependem exclusivamente da sua vontade.
Como se refere na alínea Y) do probatório, as actividades prestadas a não associados, em pleno regime de concorrência e de mercado, representam já perto de 25% da facturação do SUCH.
O SUCH tem, assim, uma significativa autonomia empresarial para destinar livremente ao mercado os seus próprios produtos, podendo exercer uma parte importante da sua actividade económica junto de outros operadores. (50)
Ora, na perspectiva de vária doutrina (51), nestas circunstâncias, em que se verifica uma significativa liberdade de acção para a entidade realizar uma parte da sua actividade para terceiros, não é possível dar por verificada a existência do necessário controlo pela entidade adjudicante (52), não podendo qualificar-se a organização como um ente meramente instrumental, nem a relação como in house.
Mas se, formalmente, o SUCH tem um razoável grau de autonomia e liberdade negocial, importa apurar se existem, sobre os seus órgãos decisórios, mecanismos de controlo que permitem à entidade pública influenciar, na prática, as suas decisões, atribuindo-lhe a "possibilidade de influência determinante quer sobre os objectivos estratégicos quer sobre as decisões importantes" (53).
Como se referiu nas alíneas Q) e seguintes do probatório, a Assembleia Geral do SUCH tem poderes de aprovação dos planos estratégicos e de actividades, elege a maioria dos membros do Conselho de Administração e pode questionar a sua actuação.
Como referiu a 1ª Secção deste Tribunal, nos Acórdãos nºs 143/09, de 22 de Julho de 2009 e 159/09 de 29 de Outubro de 2009, citando BERNARDO DE AZEVEDO, no texto supra indicado, e em alinhamento com outros autores, defende este Autor que, desde que nos confrontemos com entidades pluriparticipadas, é necessário, para caracterizar uma relação in house, que o controlo pertença à entidade que concretamente adjudica o serviço, "o que significa que o mesmo se deve ter por excluído sempre que aquela detenha uma ínfima participação no capital social da entidade adjudicatária (seja pela excessiva dispersão das participações sociais, seja pela sua distribuição em termos desequilibrados)".
No entanto, a jurisprudência mais recente do Tribunal de Justiça, constante do acórdão proferido no processo C-324/07 (Coditel), que desenvolve ideia já aflorada no acórdão relativo ao processo C-295/05 (Asemfo/Tragsa), em inversão da doutrina que inicialmente foi propugnada no processo C-231/03 (Coname), vai noutro sentido.
Naqueles arestos, reconhece-se que a possibilidade de as autoridades públicas recorrerem aos seus próprios meios, para dar execução às suas missões, pode ser exercida em colaboração com outras autoridades públicas e que, nesse caso, está normalmente excluído que uma dessas autoridades, a menos que detenha uma participação maioritária nessa entidade, exerça sozinha um controlo determinante sobre as decisões desta última.
Em consequência, entende o Tribunal que, nessas situações, pode concluir-se que o controlo de que cuidamos é exercido de forma conjunta pelas entidades públicas que detêm o ente criado, através de deliberações, se for caso disso, aprovadas por maioria.
Esta mesma ideia foi consagrada no n.º 2 do artigo 5.º do Código dos Contratos Públicos, quando nele se exige que a entidade adjudicante exerça sobre a actividade da entidade com quem contrata, um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços, isoladamente ou em conjunto com outras entidades adjudicantes.
Ora, como também se refere no processo Coditel: "(...) em circunstâncias (...) nas quais as decisões relativas às actividades de uma sociedade cooperativa intermunicipal detida exclusivamente por autoridades públicas são tomadas por órgãos estatutários dessa sociedade compostos por representantes das autoridades públicas associadas, o controlo exercido sobre essas decisões pelas referidas autoridades públicas pode ser entendido no sentido de permitir que estas últimas exerçam sobre aquela sociedade um controlo análogo ao que exercem sobre os seus próprios serviços."
O artigo 5.º, n.º 2, do CCP, refere que o controlo pode ser exercido em conjunto com outras entidades adjudicantes e a jurisprudência do Tribunal de Justiça fala em controlo exercido por autoridades públicas.
Sucede que, no caso, o SUCH, como resulta da matéria de facto dada por assente nas alíneas K) e L) do probatório pode ter, e tem, associados privados e pode ser, e é, detentor de participações em entidades privadas.
Ora, é jurisprudência constante do Tribunal de Justiça (54) que a participação, ainda que minoritária, de uma empresa privada no capital de uma sociedade no qual participa também a entidade adjudicante em causa exclui, de qualquer forma, que esta entidade adjudicante possa exercer sobre esta sociedade um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços. (55)
Assim, como se refere no acórdão relativo ao processo C-231/03 (Coname), uma sociedade aberta ao capital privado, pelo menos em parte, não pode ser considerada uma estrutura de gestão "interna" de um serviço público.
Isto porque "a relação entre uma autoridade pública, que seja uma entidade adjudicante, e os seus próprios serviços, se rege por considerações e exigências específicas da prossecução de objectivos de interesse público. Ao invés, o capital privado numa empresa obedece a considerações inerentes a interesses privados e prossegue objectivos de natureza diferente.
Em segundo lugar, a atribuição, sem concurso, de um contrato público a uma empresa de economia mista colide com o objectivo da concorrência livre e não falseada e com o princípio da igualdade de tratamento dos interessados a que se refere a Directiva (...), na medida em que, designadamente, esse procedimento permite a uma empresa privada com capital nessa empresa uma vantagem relativamente aos seus concorrentes.
Por conseguinte, (...), na hipótese de a entidade adjudicante pretender celebrar um contrato a título oneroso para serviços abrangidos pelo âmbito de aplicação material da Directiva (...), com uma sociedade juridicamente distinta, em cujo capital detém uma participação com uma ou várias empresas privadas, devem ser sempre aplicados os procedimentos de adjudicação de contratos públicos previstos nesta directiva." (56)  

É certo que, no caso concreto, não estamos perante uma sociedade comercial.
Estamos, sim, perante uma associação, em que os associados contribuem com uma quota e, eventualmente, com contribuições, dotações e subsídios. (57)

Será este argumento relevante?                                      

É certo que eles mitigam as preocupações reveladas pelo Tribunal de Justiça. Mas, a nosso ver, não são determinantes.
Como disse este Tribunal nos arestos atrás referidos, e que, nesta parte, seguiremos de perto, o SUCH tem já associados privados que não prosseguem interesses exclusivamente altruísticos (como é o caso do hospital privado), e pode vir a ter muitos outros. (58)
E, mesmo não podendo alienar a sua participação, nem sendo beneficiários da distribuição de dividendos, estes associados participarão nas deliberações que determinam e influenciam as actividades do SUCH, com subordinação a interesses privados e não públicos, o que acarreta os efeitos referidos pelo Tribunal de Justiça.
Mas, mesmo que considerássemos que a participação privada no SUCH é, no momento, marginal e irrelevante, ou que esses associados intervêm na qualidade de beneficiários e não de prestadores de serviços, as circunstâncias do caso levam-nos ainda a relevar a questão das participações detidas pelo SUCH nos ACE e entidades por ele criados, e a que já atrás nos referimos.
Em especial, no caso dos ACE através dos quais são prestados serviços, e que integram parceiros privados (59), a adopção de procedimentos de adjudicação directa ao SUCH (ou aos próprios ACE), permite que as empresas privadas participantes desses ACE, beneficiem de uma clara vantagem relativamente aos seus concorrentes.
Acresce que, como acima se referiu, a estrutura organizativa do SUCH comporta a representação, nos órgãos de administração, de representantes desses parceiros privados, que estão colocados numa posição que lhes permite influenciar as decisões de gestão e, dessa forma, interferir com os interesses prosseguidos.
Ora, como se referiu no acórdão proferido recentemente no processo C-480/06 (Comissão v. República Federal da Alemanha), pode admitir-se que as autoridades públicas prossigam as suas missões de serviço público com base em instrumentos organizativos de natureza cooperativa, sem submissão às regras da contratação pública, mas "desde que a realização desta cooperação seja regida unicamente por considerações e exigências próprias à prossecução de objectivos de interesse público e que o princípio da igualdade de tratamento dos interessados consagrado na Directiva (...) seja garantido, de modo a que nenhuma empresa privada seja colocada numa situação privilegiada relativamente aos seus concorrentes.".
Como acabámos de ver, o actual regime do SUCH não garante a subordinação exclusiva da sua gestão a objectivos de interesse público e a contratação directa do SUCH pelos seus associados não conduz à mera partilha e utilização de serviços comuns, num suposto modelo de auto-satisfação, mas à contratação indirecta de empresas privadas associadas (60), que, por essa via, são colocadas numa situação privilegiada relativamente aos seus concorrentes.
Esta actividade económica deve, claramente, ser norteada pelas leis do mercado, sob pena de a concorrência, princípio fundamental da contratação pública, poder ser desvirtuada.
Deve, aliás, dizer-se que, no caso vertente, a violação do princípio da concorrência está ostensivamente em causa.
Efectivamente, e como resulta da matéria de facto dada por assente na alínea E) do probatório, o nº2, da cláusula primeira, do Protocolo ora submetido a fiscalização prévia deste Tribunal, estipula que "para a execução dos trabalhos... o SUCH fica desde logo autorizado a recorrer a meios disponibilizados por empresas da especialidade".
Isto significa que, com a possibilidade aberta por este clausulado do Protocolo, fica desde logo em causa a obtenção das melhores condições económicas e técnicas, para a realização do fim do contrato e, desse modo, em causa fica também a realização do interesse público.
A plena realização deste, como é manifesto, só seria proporcionada pela observância do princípio da concorrência, plasmado na possibilidade de apresentação da mais ampla quantidade e diversidade de potenciais concorrentes e propostas.

5. Assim, tendo em conta o disposto no n.º 2 do artigo 5.º do Código dos Contratos Públicos, a jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias e os princípios que enformam as regras da contratação pública, em especial o princípio da concorrência (61), não pode, pois, considerar-se que a relação entre o SUCH e os seus associados públicos, e, em particular, entre o SUCH e o Hospital do Litoral Alentejano, seja uma relação "interna" equiparada à que é estabelecida pela entidade adjudicante com os seus próprios serviços.
Consequentemente, não pode aplicar-se ao caso sub judice, a excepção prevista no artigo 5.º, n.º 2, do CCP.
Claro é, também, que não foi estabelecido a favor do SUCH qualquer direito exclusivo de prestação do serviço em causa, para os efeitos do disposto no artigo 5.º, n.º 4, alínea a), do mesmo Código.
Não se vislumbra, pois, qualquer excepção à aplicação, in casu, das regras da contratação pública.

6. Como vimos, o protocolo ora submetido a fiscalização prévia, constitui um contrato de empreitada de obras públicas, sendo certo que o mesmo foi celebrado após a entrada em vigor do Código dos Contratos Públicos.
Por outro lado, este contrato foi celebrado por um Hospital que, à época, pertencia ao Sector Público Administrativo e é de valor superior a 150.000,00 euros (vide artigo 19º, als. a) e b) do CCP).
Não estando o mesmo abrangido por qualquer excepção à aplicação do regime da contratação pública, é-lhe aplicável o Código dos Contratos Públicos, incluindo a sua parte II, nos termos do disposto nos artigos 1.º, n.º 2, 2.º, n.º 2, alínea a) e 32º, nº2, al. a), do referido Código.
Por outra parte, de acordo com o estipulado no artigo 19º, n.º 1, alínea b), do mesmo Código, o contrato deveria ter sido precedido de concurso público ou de concurso limitado por prévia qualificação.
Ora, não tendo sido realizado nenhum destes procedimentos, resulta desta norma legal que o contrato não podia ter sido celebrado.
A ausência do concurso, quando obrigatório, - como é o caso - implica a falta de um elemento essencial da adjudicação, o que determina a respectiva nulidade, nos termos do artigo 133º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo (CPA), como tem sido entendimento pacífico e reiterado deste Tribunal.
Esta nulidade pode ser declarada a todo o tempo e origina a nulidade do contrato, nos termos do disposto no artigo 283º, nº 1, do Código dos Contratos Públicos.
A nulidade é fundamento de recusa de visto, como estabelece a alínea a) do nº 3, do artigo 44º, da Lei n.º 98/97, de 26 de Agosto. 

III - DECISÃO

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os Juízes da 1.ª Secção do Tribunal de Contas, em Subsecção, em recusar o visto ao presente Protocolo.
São devidos emolumentos, nos termos do artigo 5.º, n.º 3, do Regime Jurídico anexo ao Decreto-Lei n.º 66/96, de 31 de Maio.
Remeta-se cópia deste acórdão à Senhora Ministra da Saúde para que a respectiva jurisprudência possa ser difundida pelas entidades de gestão e administração que operam no âmbito do Serviço Nacional de Saúde.

Lisboa, 20 de Novembro de 2009 

Os Juízes Conselheiros, - (António M. Santos Soares, relator) - (Helena Abreu Lopes) - (João Figueiredo)

Fui presente

O Procurador-Geral Adjunto - (Daciano Pinto)


(1) Vide fols. 6 a 8 dos autos.
(2) Vide fols. 6 a 8 dos autos.  
(3) Cfr.www.somos.pt
(4) Sublinhado nosso.  
(5) Vide fols. 219 e seg. do 2º vol. dos autos. 
(6) Ambos ainda não transitados em julgado.
(7) A rede de prestação de cuidados de saúde abrange, de acordo com o disposto no artigo 1º, nº2, do Regime Jurídico da Gestão Hospitalar (RJGH), aprovado pela Lei 27/2002 de 8 de Novembro, os estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde (SNS), os estabelecimentos privados que prestem cuidados aos utentes do SNS e outros serviços de saúde, nos termos de contratos celebrados ao abrigo do disposto no capítulo IV do RJGH, e os profissionais em regime liberal com quem sejam celebradas convenções.
(8) Vide v. g. fols. 14 dos autos.  
(9) Em "Contratos Públicos "in house" - em especial, as relações contratuais entre municípios e empresas municipais e intermunicipais", in Revista de Direito Regional e Local, n.º 00, Outubro-Dezembro 2007, págs. 34 e ss.
(10) Referia-se, assim, no pedido: "(...)Com fundamento no parecer n.º 1/95 (Diário da República, II Série de 12 de Julho de 1995) tem vindo a entender-se que os SUCH - Serviços de Utilização Comuns dos Hospitais se situam fora dos pressupostos de aplicabilidade do regime do Decreto-Lei n.º 211/79,de 12 de Julho.
No entanto, a nova disciplina de realização das despesas públicas, os princípios que enformam a actividade da Administração Pública e a própria natureza dos SUCH têm vindo a pôr em causa a actualidade do já mencionado parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República;
É o caso do parecer anexo[2], solicitado a uma entidade estranha ao Ministério da Saúde, e que conclui pela necessidade de sujeitar o SUCH ao regime legal de realização da despesa pública. Em face do exposto, e atento o teor do artigo 37.º n.º 1 alínea a) da Lei n.º 60/98, de 27 de Agosto, venho solicitar a Vossa Excelência o Parecer do Conselho Consultivo da PGR sobre a questão de saber se o SUCH se pode considerar isento da legislação em vigor para a realização de despesa de aquisição de bens e serviços ou realização de obras públicas, ou, por outras palavras se se mantém actual a doutrina do Parecer da PGR n.º 1/95 já referido."  
(11) Directivas nºs 2004/18/CE e 2004/17/CE, ambas do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de Março.
(12) Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de Janeiro.
(13) Os seus estatutos foram revistos em 2003 e em 2006. A versão actual foi publicada no Diário da República, II Série, de 29 de Dezembro de 2006.  
(14) Veja-se, a propósito, E. JIMENEZ APARICIO, in "Comentários a la Legislación de Contratos de la Administración Pública". Thomson/Aranzadi, 2ª ed. 2006, pág. 140.
(15)
Contratos típicos são, como refere J. ANDRADE DA SILVA, em anotação ao artigo 32º do "Código dos Contratos Públicos, Comentado e Anotado", aqueles que, no CCP, têm uma individualidade própria, por aquelereconhecida, que lhes estabelece o respectivo regime jurídico substancial. 
(16) Por "contratos públicos" entende a Directiva 2004/18/CE, na al. a), do nº2, do artigo 1º, que se trata de contratos a título oneroso, celebrados por escrito entre um ou mais operadores económicos e uma ou mais entidades adjudicantes, que têm por objecto a execução de obras, o fornecimentos de produtos ou a prestação de serviços , na acepção da Directiva. 
(17) Este normativo foi transposto para o CCP, para o artigo 343º, o qual, referindo-se ao contrato de empreitada de obras públicas, conte uma noção que é equivalente ao citado normativo comunitário.
(18) Cfr. RUI MEDEIROS, "Âmbito do novo regime da contratação pública à luz do princípio da concorrência", in Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 69, Maio/Junho 2008.
(19) Cfr. artigo 1º, nº2, do Código dos Contratos Públicos e o artigo 1º, nº2, al. a) da Directiva nº 2004/18/CE supra referida.
(20) Os hospitais do sector público administrativo (SPA), integrados na rede de prestação de cuidados de saúde, referidos na alínea a), do nº1, do artigo 2º, do Regime Jurídico da Gestão Hospitalar, aprovado pela Lei nº 27/2002 de 8 de Novembro, são, nos termos do artigo 2º, do DL nº 188/2003, de 20 de Agosto, pessoas colectivas públicas dotadas de personalidade jurídica, de autonomia administrativa e financeira.  
(21) Como se refere no preâmbulo do DL nº 172/2003, o Hospital de Santiago do Cacém era denominado, desde Fevereiro de 1994, por Hospital do Conde do Bracial, remontando a sua origem a 1843.
22 Lei Quadro dos Institutos Públicos, alterada pela Lei nº 51/2005 de 30 de Agosto e pelos DL nºs 200/2006 de 27 de Outubro e 105/2007 de 3 de Abril, diploma este que a republicou.  
(22) Lei Quadro dos Institutos Públicos, alterada pela Lei nº 51/2005 de 30 de Agosto e pelos DL nºs 200/2006 de 27 de Outubro e 105/2007 de 3 de Abril, diploma este que a republicou.  
(23) Cfr., designadamente, o acórdão proferido no processo C-107/98 (Teckal).
27 O que não era tão marcado na altura em que foi produzido o parecer da Procuradoria-Geral da República acima referido.  
(24) Cfr. CLÁUDIA VIANA, no texto já citado, e o 4.º considerando da Directiva 2004/18/CE: "os Estados-membros devem velar por que a participação de um proponente que seja um organismo de direito público, num processo de adjudicação de contratos públicos, não cause distorções da concorrência relativamente a proponentes privados."
(25)
Cfr. artigos 18.º da Directiva 2004/18/CE e 25.º da Directiva 2004/17/CE.
(26) Cfr. acórdão Teckal do Tribunal de Justiça, no processo C-107/98.
(27) O que não era tão marcado na altura em que foi produzido o parecer da Procuradoria-Geral da República acima referido.  
(28) Confira-se o referido na declaração de voto de CARLOS A. FERNANDES CADILHA, no parecer citado, que, todavia, discorda da qualificação do SUCH como pessoa colectiva de utilidade pública administrativa, propendendo para a sua qualificação como associação pública
(29) Vide www.somos.pt 
(30) Como se referia nos pareceres da Procuradoria-Geral da República e vem invocado nos autos. 
(31) "Código dos Contratos Públicos", Anotado e Comentado, 2008, pág. 75.
32 Que se distinguem dos acordos in house providing, porque estes são celebrados entre uma entidade pública e um seu serviço desprovido de personalidade jurídica. Veja-se, sobre este assunto ALEXANDRA LEITÃO, "Contratos de prestação de bens e serviços entre o Estado e empresas públicas e relação´ in house´", Cadernos de Justiça Administrativa, nº 65, págs. 12 e segs..  
(32) Que se distinguem dos acordos in house providing, porque estes são celebrados entre uma entidade pública e um seu serviço desprovido de personalidade jurídica. Veja-se, sobre este assunto ALEXANDRA LEITÃO, "Contratos de prestação de bens e serviços entre o Estado e empresas públicas e relação´ in house´", Cadernos de Justiça Administrativa, nº 65, págs. 12 e segs..  
(33) Vide ALEXANDRA LEITÃO, ob. e loc. cits..
(34) In "Estudos de Contratação Pública - I", Coimbra Editora, Coimbra, pág. 54 e seg.  
(35) In "Contratos públicos ´in house´- em especial, as relações contratuais entre municípios e empresas municipais e intermunicipais", na Revista " Direito Regional e Local", nº0, pág. 34.
37 Assim, P. FLAMME, M.-.FLAMME, C. DARDENNE, « Les marchés publics européens et belges - l´ írresistible européanisation du droit de la commande publique », pág. 29 e segs.  
(36) De uma forma breve, e citando CLÁUDIA VIANA, ob. e loc. cits., diga-se que no processo Teckal, o Tribunale amministrativo regionale per l'Emília Romagna solicitou ao Tribunal de Justiça que se pronunciasse sobre a possibilidade de um contrato de fornecimento ser atribuído directamente pelo Conselho Municipal de Vianno a um agrupamento de municípios de Régio Emília, constituído para assegurar a gestão de serviços de energia e do ambiente, dotado de personalidade jurídica e com autonomia de gestão.
(37) Assim, P. FLAMME, M.-.FLAMME, C. DARDENNE, « Les marchés publics européens et belges - l´ írresistible européanisation du droit de la commande publique », pág. 29 e segs.  
(38) Vide, também, PIERRE DELVOLVÉ, «Marchés Publics: les critères des ´contrats maisons´», in Revue du Droit de l´Union Européenne, nº 1, 2002, pág. 53 e segs 
(39) Como acentua BERNARDO AZEVEDO, in "Estudos de Contratação Pública - I", Ed. Coimbra Editora, 2008, págs. 125 e 126, a interpretação restritiva dos dois requisitos, é reclamada consistentemente pelos Acórdãos Stadt Halle e RPL Lochau e Parking Brixen, em razão do seu carácter excepcional e derrogatório dos princípios gerais do Tratado, em matéria de concorrência, (com especial saliência para as regras que valem em sede de contratação pública) e seguida, igualmente, pela doutrina, cfr. SUE ARROWSMITH (n.2), PÁG. 375; BIAGIO GILBERTI (n.2), pág. 50, e, ainda, PEDRO GONÇALVES (n.14), pág. 180.
41 Vide Autor e loc. citados na nota anterior.  
(40) Citados por BERNARDO AZEVEDO, ob. cit. pág. 126.
(41) Vide Autor e loc. citados na nota anterior.  
(42) É importante assinalar que esta influência determinante não se assemelha à influência dominante que é pressuposto da qualificação de uma determinada entidade, pública ou privada, como organismo de direito público - artigo 2º, nºs 2 e 3, do Código dos Contratos Públicos - que se basta com: (i) financiamento maioritário; (ii) controlo de gestão; (iii) designação, directa ou indirecta da maioria dos titulares de um dos seus órgãos de administração, gestão ou fiscalização, por parte de uma das entidades adjudicantes no sector público administrativo tradicional (ut Autor e loc. cits. na nota anterior).  
(43) Advogado Geral, no processo em que foi proferido o Acórdão Parking Brixen.  
(44) In "Estudos de Contratação Pública", pág. 139 e segs. 
(45) O qual consta dos estatutos, sendo que estes são alteráveis pelo órgão máximo do SUCH.
48 Procurando descortinar a relação in house entre o SUCH e o conjunto de todos os seus associados.  
(46) Não obstante e precisamente por se afirmar, a páginas 134 do Relatório de Gestão e Contas 2008, que o SUCH trabalha com "pequenas margens de negócio", para satisfazer a expectativa dos associados na melhor relação preço-qualidade.
(47) Cfr. o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça no processo C-295/05 (Asemfo/ Tragsa).
(48)
Procurando descortinar a relação in house entre o SUCH e o conjunto de todos os seus associados.  
(49) Em virtude de a mesma ter o poder de negar a homologação de uma eventual alteração dos Estatutos.
52 Assim se inter-relacionando os dois requisitos referidos no n.º 2 do artigo 5.º do Código.  
(50) Cfr. conclusões do Advogado-Geral no processo C-94/99 (Arge), do Tribunal de Justiça: a entidade só"deve ser considerada como totalmente vinculada à sua autoridade de tutela quando a relação orgânica que a une a ela se reveste de uma quase exclusividade, em benefício desta última, dos serviços que presta".
(51) Cfr., designadamente, autores citados e sufragados por BERNARDO DE AZEVEDO, no texto referenciado, e ALEXANDRA LEITÃO, no artigo também já citado.
(52) Assim se inter-relacionando os dois requisitos referidos no n.º 2 do artigo 5.º do Código.  
(53) Cfr. acórdãos proferidos nos processos C-458/03 (Parking Brixen) e C-340/04 (Carbotermo)
(54) Cfr., designadamente, acórdãos proferidos nos processos C-26/03 (Stadt Halle), C-231/03 (Coname), C-29/04 (Comissão v. Áustria), e C-410/04 (ANAV).  
(55) Para RUI MEDEIROS (no texto acima citado) esta qualificação restritiva significa, na prática, que a jurisprudência exige um terceiro requisito para que se possa afirmar uma relação in house: a inexistência de participações privadas na entidade adjudicatária.
57 Cfr. artigo 24.º dos Estatutos.  
(56) Do acórdão Stadt Halle.
(57)
Cfr. artigo 24.º dos Estatutos.  
(58) No acórdão proferido nos processos C-29/04 e C-410/04, o Tribunal de Justiça chamou a atenção para que não deve tomar-se em consideração apenas a situação num dado momento, mas a evolução que o regime das entidades consente, prevenindo, em especial, as sequências que podem redundar em expedientes violadores dos princípios.
(59) Como é o caso do "SOMOS COMPRAS, ACE", considerado como central de compras pelo DL n.º 200/2008, de 9 de Outubro.
(60) Ou mesmo de empresas privadas às quais o SUCH externaliza os serviços. 
(61) A concorrência, em princípio, é essencial a um procedimento de adjudicação de um contrato público, proporcionando que o interesse público que lhe está subjacente, venha a ser realizado e nas melhores condições técnicas e económicas. Como refere MICHEL GUIBAL, in " Memento des Marchés Publiques", 3ª ed., Le Moniteur, Paris, 2001, pág. 92, estamos perante a decorrência de três princípios fundamentais no direito da contratação pública: o da liberdade económica, o do livre acesso a essa contratação e o da igualdade de tratamento nessa mesma contratação.