Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 19 de Janeiro de 2011 (proc. 6497/10)

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Sumário:

O CCP proíbe que o modelo de avaliação estabeleça que na avaliação de uma proposta sejam utilizados dados que dependam das características de outras propostas.

 

Texto Integral:

Vem o presente recurso interposto da Sentença de fls. 321.

Foram as seguintes as conclusões do recorrente:
I- O Tribunal "a quo" ao fazer a fundamentação da Sentença indicou laconicamente: "A consideração dos factos provados baseou-se no teor dos documentos juntos com a P.I. e com a Contestação, nos documentos existentes no PA e nos depoimentos das testemunhas inquiridas".
II- O Tribunal não pode limitar-se a indicar os meios de prova analisados, descurando a sua análise crítica e a especificação dos fundamentos que foram decisivos para a formação da sua convicção.
III- A douta Sentença sob recurso incorreu em nulidade, ao desrespeitar o comando do artigo 653°-2 in fine do CPC, que obrigava o Tribunal a quo a fazer a análise crítica das provas e especificar os fundamentos decisivos para a convicção do Julgador.
IV- A contra-interessada S..........- Sociedade .................. Lda é detentora da classificação de Empreiteiro Geral ou Construtor Geral de Edifícios de Construção Tradicional - classe 4, que a autoriza a executar obras até 1.328.000 € (montante superior ao do valor da sua Proposta).
V- A habilitação de empreiteiro geral ou construtor geral adequada à obra e em classe que cubra o valor global obra, dispensa a exigência de n° 1 do artigo 31° do DL 12/2004 de 9 de Janeiro.
VI- Apresentando a contra-interessada um Alvará de Empreiteiro Geral ou Construtor Geral de Edifícios de Construção Tradicional da Classe 4 (obras até 1.328.000 €), que cobre o valor global da sua proposta (669.306,55 €), deve ter-se por habilitada para a execução da obra.
VII- Inexiste insuficiência de fundamentação da deliberação camarária impugnada:
- o segmento normativo "adequação à obra" constante do n°2 do artigo 31° do DL 12/2004, de 9 de Janeiro, foi claramente ponderado pelo Júri, que inclusivamente avaliou os Planos de Trabalho constantes das propostas em termos tais que ponderou diversamente as propostas apresentadas pelos vários concorrentes em função do item adequação; - o segmento normativo "que cubra o seu valor global igualmente constante daquele preceito, basta-se com a comparação entre o valor de obra constante da proposta e o valor máximo de obra permitido na classe evidenciada no Alvará, decorrente da Portaria n° 6/2008, de 2 de Janeiro.
VIII- Ademais, no que tange à fundamentação da deliberação de adjudicação, haverá que ler a deliberação e o Relatório Final em conjunto com o Relatório Preliminar de fls.459 a 466 do pa, notificado a todos os Concorrentes, integrando-se este naquele.
IX- Deste documento constam, explícita e pormenorizadamente, o critério de apreciação das propostas e os factores que determinaram a diferente pontuação atribuída.
X- A fundamentação é um conceito relativo, tendo em conta a natureza e a finalidade do acto praticado e a sua apreensibilidade ou compreensibilidade, por parte do seu destinatário, de modo a este último se poder aperceber dos motivos porque se decidiu num sentido e não noutro.
XI- Os destinatários da deliberação camarária de 26 de Maio de 2009 são profissionais da actividade da construção civil e, portanto, capazes de perceber os motivos por que se decidiu adjudicar à Contra-Interessada S---------- Sociedade de ---------------- Lda e não ao Consórcio Autor.
XII- A fundamentação expressa pela Câmara Municipal, mormente a que consta de tais Relatórios, quer quando avaliada em direcção ao destinatário em causa (Autor), quer quando avaliada em direcção a um destinatário normal, permite inferir as razões pelas quais a proposta foi adjudicada à dita Contra-Interessada (o itinerário cognoscitivo e valorativo do acto deliberativo), e quais os critérios e parâmetros valorados para pontuar cada um dos concorrentes e definir a respectiva classificação final.
XIII- Exigir mais do que a fundamentação externada é colocar a Recorrente perante uma exigência de "fundamentar a fundamentação".
XIV- Ao fundamentar o acto deliberatório nos termos em que o fez, não se vê como o Recorrente pode ter comprometido os princípios da transparência, igualdade e da concorrência, sendo certo que o Tribunal a quo não fundamenta em que medida tal acontece.
XV- A douta Sentença recorrida violou o artigo 659°-3 do CPC, ex vi do artigo 35°-2 do CPTA; os artigos 4°-l e 31°-2 do DL 12/2004 de 9 de Janeiro e a Portaria 6/2008, de 2 de Janeiro, fazendo ainda uma incorrecta aplicação dos artigos 123°-2 d), 124° e 125° do CPA ao ancorar nestas normas uma alegada e inexistente falta de fundamentação da deliberação da Câmara Municipal de Leiria sub júdice.

Foram as seguintes as conclusões do recorrido:
1a - A douta sentença recorrida não padece da nulidade que lhe é assacada nas conclusões I a III das alegações de recurso.
2a - O acto impugnado padece do vício de falta de fundamentação, pelo que bem andou a douta sentença ao declarar tal vício;
3a - Razão por que improcedem as conclusões IV a XV das alegações de recurso, merecendo a douta sentença inteira confirmação.
Sem prescindir:
4a - No ponto 8.1.3 do Programa de Procedimento em causa nestes autos exige-se que os concorrentes que apresentem a proposta para execução da obra concursada sejam detentores de alvará que abranja a 1a subcategoria da 1a categoria, de acordo com o estabelecido na Portaria n.° 19/2004, de 10 de Janeiro e classe correspondente ao valor da proposta;
5a - Bem como a 4a e 8a subcategorias da 1a categoria e 1a, 9a e 10a subcategorias da 4a categoria da classe correspondente ao valor dos trabalhos especializados a que respeitem, consoante a parte da proposta, podendo este alvará ser de subempreiteiro.
6a - As exigências contidas nas antecedentes conclusões 4a e 5a são de verificação cumulativa, conforme decorre da letra do ponto 8.1.3 do Programa de Procedimento.
7a - A concorrente S......., Lda. não era - e não apresentou a instruir a sua proposta - titular de alvará que abrangesse a 1a subcategoria da 1ª categoria.
8a - Pelo que a proposta apresentada por aquela concorrente deveria ter sido imediatamente excluída do procedimento em causa nestes autos.
9a - E, não o tendo sido, o acto impugnado viola, por isso, o disposto no ponto 8.1.3 do Programa de Procedimento, bem como os princípios da boa-fé, da livre concorrência, da transparência, da imparcialidade e da isenção plasmados no CPA e co-naturais a todos os procedimentos concursórios.
10a - A douta sentença deveria ter anulado ou declarado a nulidade do acto impugnado por vício de violação da lei, nos termos indicados na cláusula anterior.
11a - A aplicação do n.° 2 do art.° 31° do Dec. - Lei n.° 12/2004, de 9 de Janeiro, ao caso dos autos e a interpretação que dele foi feita no acto impugnado viola também o disposto no ponto 8.1.3 do Programa de Procedimento, pois que ali não aparece incluído o critério de habilitação estabelecido na referida norma legal, bem como os princípios gerais atrás enumerados.
12a - Por outro lado, a aplicação do n.° 2 do referido art.° 31° para poder, eficaz e legalmente, ser operada exige uma dupla condição/pressuposto: que essa habilitação seja "adequada à obra em causa e em classe que cubra o seu valor global".
13a - A expressão legal transcrita na conclusão antecedente constitui um mero conceito de direito e de carácter conclusivo que deve ser preenchido/integrado por factos concretos e objectivos.
14a - Ora, nem o relatório que suporta o acto impugnado, nem este próprio, alega factos claros e objectivos donde possa retirar-se a conclusão da pretendida adequabilidade à concreta obra concursada no presente procedimento, analisada esta nas suas características e especificidades próprias, nos trabalhos especializados que, eventualmente, exija, etc.
15a - O acto impugnado, ainda a esta luz, padece de vício de violação da lei, por errada interpretação e aplicação do n.° 2 do referido art.° 31° e por violação do ponto 8.1.3 do Programa de Procedimento;
16a - e de vício de forma por falta de fundamentação, em violação do disposto nos art.°s 124° e 125° do CPA.
Sem embargo do já alegado:
17a - Consta dos autos uma certidão emitida pela Câmara Municipal de Leiria certificadora de que o júri do presente procedimento foi designado com carácter de permanência para todos os procedimentos concursais anteriores ou posteriores ao presente.
18a - o acto impugnado viola, por isso, o disposto no art.° 6° do CPA e os princípios da transparência, da igualdade, da imparcialidade, da isenção e da concorrência previstos no art.° 1°, n.° 4 do CPP, bem como o disposto no art.° 67° deste último diploma legal.
19a - A douta sentença deveria ter declarado anulado ou declarado nulo o acto impugnado. Mas não o tendo feito, deve tal ilegalidade e invalidade ser declarada agora pelo Venerando Tribunal ad quem.

2. Foi a seguinte a factualidade assente pela Sentença recorrida:
A) Na 2.º Série, n.º 22, do Diário da República de 02 de Fevereiro de 2009 - Parte L - Contratos Públicos, o Réu Município de Leiria publicitou o anúncio do procedimento n.º 296/2009, apresentando como:
"2. Objecto do contrato:
Designação do contrato: Construção de Bloco de Aulas para a Escola do 1.º Ciclo EB 2,3 Dr. .............. - Pousos. O valor base do concurso é €806.183,63+ IVA
Tipo de Contrato: Empreitada de Obras Públicas". - Cfr. Doc. n.º2 da P.I.
B) Na II série do Diário da República n.º 27, de 09 de Fevereiro de 2009, Parte L - Contratos Públicos, foi completado o anúncio de procedimento referido em A, através da publicação da " declaração de rectificação de anúncio n.º 67/2009", onde consta o seguinte:
"17-OUTRAS INFORMAÇÕES:
Relativamente ao anúncio de procedimento n.º 296/2009, publicado na II Série do D.R. nº 22 de 02 de Fevereiro, informam-se todos os interessados do seguinte: O alvará de construção exigido deve conter a 1ª Subcategoria da 1ª Categoria da classe correspondente ao valor da proposta e a 4ª e 8ª subcategorias da 1ª e a 1ª, 9ª e 10ª subcategorias da 4ª categoria correspondente ao valor dos trabalhos especializados que lhe respeitam (...)."
C) O Programa do Procedimento no ponto 8. Apresentação dos documentos de habilitação pelo adjudicatário prescreve em 8.1 que os documentos, a apresentar para habilitação do adjudicatário no prazo de 10 dias a contar da data de adjudicação, são os seguintes:
" (...)
8.1.3 Alvarás ou os títulos de registo emitidos pelo Instituto da Construção e do Imobiliário, I.P. contendo as habilitações adequadas e necessárias à execução da obra a realizar, que deve conter:
8.1.3.1. 1.ª Subcategoria da 1.ª Categoria, de acordo com o estabelecido na Portaria n.º 19/2004, de 10 de Janeiro e da classe correspondente ao valor da proposta.
e
8.1.3.2. Da 4.ª e 8.ª Subcategorias da 1.ª Categoria e 1.ª, 9.ª e 10.ª Subcategorias da 4.ª Categoria da Classe correspondente ao valor dos trabalhos especializados que lhe respeitam, consoante a parte que cabe na proposta, podendo este alvará ser de subempreiteiro. O concorrente pode recorrer a subempreiteiros, ficando a eles vinculado por contrato, para a execução dos trabalhos correspondentes. Neste caso, deve anexar à proposta as declarações de compromisso dos subempreiteiros possuidores das autorizações respectivas". - Cfr. Doc. n.º 3 da P.I.
D) Apresentaram-se ao concurso referido em A, as seguintes empresas:
S......, Lda.
T............. II, S.A.
A................., Lda.
J.................., CONSTRUÇÕES S.A.
T.............., Lda.
JOÃO ..............M, Lda.
T..............., S.A.
CONSTRUÇÕES ........ & ........., Lda.
A........... C........., S.A.
CONSÓRCIO: M..........., S.A./ R.................. & L........, Lda.
CONSÓRCIO: A E............, S.A./ B.........., Lda.
Q..........., Lda.
F......... E P............. Lda.
CONSÓRCIO: A N.........., Lda./ L.. & J..., Lda.
CONSTRUÇÕES D............, Lda.
CONSÓRCIO: A......... CONSTRUÇÕES, S.A./ I..............., S.A.
IRMÕS L......... E C..........., Lda.
J......., Lda.
P......... & F............, S.A.
C.......... & C........... - Cfr. doc.n.º4 da P.I..
E) No dia 18 de Maio de 2009, reuniu o Júri do Procedimento, para análise das propostas apresentadas com vista à execução da empreitada "Construção de Bloco de Aulas para a Escola do 1.º Ciclo EB 2,3 Dr. ............ - Pousos", que, após elaborado o respectivo Relatório Preliminar, ordenou em primeiro lugar a concorrente "S......... - Sociedade .................., Lda. " - Cfr. Doc. n.º 4 da P.I..
F) A Autora, notificada do relatório de análise das propostas referido em E apresentou exposição, em sede de audiência prévia, no dia 18 de Maio de 2009 requerendo a suspensão imediata do concurso e, em consequência, a exclusão da proposta concorrente 21, referente à contra-interessada "S......... - Sociedade de .................., Lda." - Cfr.. Doc. n.º5 da P.I.
G) No dia 26 de Maio de 2009, reuniu o Júri do Procedimento, tendo elaborado o respectivo relatório final, referindo que " o concorrente classificado em 1.º lugar neste procedimento conforme relatório preliminar, (S.......... - Sociedade de ..............., Lda.) é detentor da classificação de Empreiteiro Geral ou Construtor Geral de Edifícios de Construção Tradicional - Classe 4 e de acordo com o n.º 2 do artigo 31.º do Decreto Lei n.º 12/2004 de 9 Janeiro é suficiente a habilitação de empreiteiro geral ou construtor geral, desde que adequado à obra em causa e em classe que cubra o seu valor global", concluindo aquele Júri que "Assim, face à subcategoria exigida no ponto 8.1.3.1 do Programa de Procedimento a qual é uma das subcategorias determinantes para a classificação de Empreiteiro Geral ou Construtor Geral e atendendo ao valor das obras abrangidas pela Classe 4 (até 1.328.000euros) verifica-se que o concorrente S..........., Sociedade ......................, Lda., está legalmente habilitado à execução da empreitada pelo que se mantém o teor do Relatório Preliminar e a classificação final das propostas para efeito de adjudicação e que é a seguinte:
1.º S........., Lda.
2.º CONSÓRCIO: A N........., Lda./ L.... & J...., Lda.
(...) " -Cfr.. Doc. n.º6 da P.I.
H) A Câmara Municipal de Leiria, em 26 de Maio de 2009, deliberou adjudicar a empreitada em apreço à concorrente S.........., Lda., pelo valor de €699.306,51+ IVA - Cfr.. Doc. n.º6 da P.I..
I) A Autora foi notificada da deliberação referida em H através de ofº com a referência T-105/2008, datado de 29 de Maio de 2009. - Cfr.. fls.1 do Doc.n.º6 da P.I.
J) O ofº referido em I foi recepcionado pela Autora no dia 04 de Junho de 2009.
L) A P.I. relativa aos presentes autos de contencioso pré-contratual deu entrada neste Tribunal no dia 26 de Junho de 2009, conforme carimbo aposto no rosto da referida peça processual. - Cfr. fls. electrónica1.
Ao abrigo do artº 712.1.a) do CPC mais adito a seguinte matéria de facto com interesse para a correcta decisão da causa:
M) O júri foi nomeado para "procedimento do Código dos Contratos Públicos" - doc. fls. 69.
N) Este procedimento foi o primeiro a realizar-se no Município após a entrada em vigor do CCP e e este júri só foi utilizado neste concurso - esclarecimento prestado ao Tribunal de contas, junto a fls. 211.
O) Consta do relatório preliminar do júri o seguinte:
"Da análise dos documentos Plano de Trabalhos e Memória Descritiva, relativos ao factor de adjudicação Valor Técnico, entendeu-se o seguinte.
Os Planos de Trabalho apresentam a indicação de início das actividades e duração das mesmas. No entanto verifica-se que algumas das propostas o fazem com indicação da sequência dos trabalhos com caminhos críticos e folgas e de entre estas, uma de uma forma mais pormenorizada do que outras. Assim atribuiu-se o factor de ponderação de 90% e 75% atendendo ao grau de pormenorização e adequação propostos.
Em relação à Memória Descritiva verifica-se que as propostas fazem a descrição do objecto do concurso com as técnicas e procedimentos a adoptar. No entanto, não são tidos em conta ou concretizadas as condições gerais e particulares da obra, nomeadamente a inserção urbana, a natureza e condições do terreno, a adequação às infraestruturas existentes e redes exteriores, pelo que foi aplicado o factor de ponderação de 75%. Às propostas dos concorrentes T.......... II e do Consórcio M......../R..... M. & L.......... (com uma menor pormenorização) atribui-se a ponderação de 50% atendendo ao grau de pormenorização e adequação propostos." - doc. fls. 462 do Processo Administrativo Apenso.
P) O factor preço do concurso seria analisado tendo como base a seguinte fórmula: N=Vp/VPX12, em que
N= Nota obtida no subfactor preço da proposta
Vp= Preço da proposta mais baixa
VP= Preço da proposta em análise - ponto 19 do anúncio do programa do procedimento publicado na 2.º Série, n.º 22, do Diário da República de 02 de Fevereiro de 2009.
O M. P. foi notificado para se pronunciar sobre o mérito do recurso.
O Tribunal suscitou a questão de se saber se pode ou não o método de avaliação das propostas, no critério do preço, permitir que o preço de uma proposta influencie as cotações das outras (vide ponto 19 do programa de procedimento e artº 139.4 do CCP).
O processo foi submetido à conferência sem colher vistos, por se tratar de processo urgente.

3. São as seguintes as questões a resolver:
3.1. A matéria de facto não está devidamente fundamentada ?
3.2. A contra-interessada S....... é detentora de classificação suficiente para a empreitada em causa ?
3.3. A decisão impugnada está fundamentada ?
3.4. Pode o júri ser nomeado com carácter de permanência para todos os procedimentos concursais ?
3.5. Pode o método de avaliação das propostas, no critério do preço, permitir que o preço de uma proposta influencie as cotações das outras ?

4.1. Para além da fórmula que consta no final da matéria de facto, que a Juíza colocou mas que não necessitava de o fazer (com o que evitaria o lapso da menção a testemunhas, já que os factos provados têm todos origem em prova documental), à frente de cada um dos factos está discriminado o documento com base no qual o mesmo foi considerado provado (com excepção do facto referido em J., mas que cuja falta se revela irrelevante, por o facto em questão não ter qualquer interesse para a correcta decisão da causa).
Logo, não se verifica a invocada falta de fundamentação.

4.2. As várias categorias de Alvará vêm reguladas na Portaria 19/2004, que diz a este respeito, no seu artº 1:
1.o As habilitações a que se refere o n.o 4 do artigo 4.o do Decreto-Lei n.o 12/2004, de 9 de Janeiro, estão agrupadas nas seguintes categorias:
1.a Edifícios e património construído;
2.a Vias de comunicação, obras de urbanização e outras infra-estruturas;
3.a Obras hidráulicas;
4.a Instalações eléctricas e mecânicas;
5.a Outros trabalhos;
que englobam as seguintes subcategorias:
1.a categoria - Edifícios e património construído:
1.a Estruturas e elementos de betão;
2.a Estruturas metálicas;
3.a Estruturas de madeira;
4.a Alvenarias, rebocos e assentamento de cantarias;
5.a Estuques, pinturas e outros revestimentos;
6.a Carpintarias;
7.a Trabalhos em perfis não estruturais;
8.a Canalizações e condutas em edifícios;
9.a Instalações sem qualificação específica;
10.a Restauro de bens imóveis histórico-artísticos;
2.a categoria - Vias de comunicação, obras de urbanização e outras infra-estruturas:
1.a Vias de circulação rodoviária e aeródromos;
2.a Vias de circulação ferroviária;
3.a Pontes e viadutos de betão;
4.a Pontes e viadutos metálicos;
5.a Obras de arte correntes;
6.a Saneamento básico;
7.a Oleodutos e gasodutos;
8.a Calcetamentos;
9.a Ajardinamentos;
10.a Infra-estruturas de desporto e de lazer;
11.a Sinalização não eléctrica e dispositivos de protecção e segurança;
3.a categoria - Obras hidráulicas:
1.a Obras fluviais e aproveitamentos hidráulicos;
2.a Obras portuárias;
3.a Obras de protecção costeira;
4.a Barragens e diques;
5.a Dragagens;
6.a Emissários;
4.a categoria -Instalações eléctricas e mecânicas:
1.a Instalações eléctricas de utilização de baixa tensão;
2.a Redes eléctricas de baixa tensão e postos de transformação;
3.a Redes e instalações eléctricas de tensão de serviço até 60 kV;
4.a Redes e instalações eléctricas de tensão de serviço superior a 60 kV;
5.a Instalações de produção de energia eléctrica;
6.a Instalações de tracção eléctrica;
7.a Infra-estruturas de telecomunicações;
8.a Sistemas de extinção de incêndios, segurança e detecção;
9.a Ascensores, escadas mecânicas e tapetes rolantes;
10.a Aquecimento, ventilação, ar condicionado e refrigeração;
11.a Estações de tratamento ambiental;
12.a Redes de distribuição e instalações de gás;
13.a Redes de ar comprimido e vácuo;
14.a Instalações de apoio e sinalização em sistemas de transportes;
15.a Outras instalações mecânicas e electromecânicas;
5.a categoria - Outros trabalhos:
1.a Demolições;
2.a Movimentação de terras;
3.a Túneis e outros trabalhos de geotecnia;
4.a Fundações especiais;
5.a Reabilitação de elementos estruturais de betão;
6.a Paredes de contenção e ancoragens;
7.a Drenagens e tratamento de taludes;
8.a Reparações e tratamentos superficiais em estruturas metálicas;
9.a Armaduras para betão armado;
10.a Cofragens;
11.a Impermeabilizações e isolamentos;
12.a Andaimes e outras estruturas provisórias;
13.a Caminhos agrícolas e florestais.
Por seu turno, a classificação dos Empreiteiros gerais vem regulada no artº 2 do mesmo diploma, que diz:
2.o A classificação em empreiteiro geral ou construtor geral, nos termos da alínea a) do n.o 2 do artigo 12.o do Decreto-Lei n.o 12/2004, de 9 de Janeiro, depende da posse cumulativa das subcategorias determinantes, de acordo com o seguinte quadro:

A classificação em empreiteiro geral depende assim da posse cumulativa das subcategorias determinantes, nos termos deste nº 2. Ou seja, para se ter tenha a habilitação de empreiteiro geral de edifícios de construção tem de se ter as subcategorias de estruturas e elementos de betão (subcategoria 1) e alvenarias, rebocos e assentamentos de cantarias (subcategoria 4). Logo, tendo-se esta categoria, presumem-se as subcategorias necessárias para a mesma.
O empreiteiro geral está habilitado a subcontratar a execução de trabalhos enquadráveis nas subcategorias necessárias à concretização da obra, por força do artº 12.1.a) do Dec-lei 12/2004 de 09/01.
Contudo, não se presume que tem a subcategoria 8 da categoria 1, nem as subcategorias 1, 9 e 10 da 4ª categoria, exigidas pelo concurso.
Nem tem contudo de as ter, podendo para a concretização da obra subcontratar em empresas que detenham as subcategorias em causa, por força do referido artº 12.1.a) do Dec-lei 12/2004. Não é possível outra interpretação da lei, sob pena de esvaziamento de conteúdo deste artigo. Esta é aliás também a solução do concurso.
E estes alvarás dos subempreiteiros não tinham de ser apresentados aquando do concurso: só têm de ser apresentados após a adjudicação.
Logo, o concorrente detinha as habilitações necessárias para concorrer, estando correcta a decisão do júri.

4.3. Disse-se na sentença recorrida sobre esta questão:
"E, aqui, referimos que o art.124.º do C.P.A., na esteira do n.º 3 do art. 268.º da C.R.P., consagra um dever geral de fundamentação dos actos administrativos, dever que o art. 125.º do C.P.A. concretiza.
Preceitua o art. 125.º do C.P.A. - sob a epígrafe "Requisitos da fundamentação" -, nos nº 1 e 2, o seguinte:
"1. A fundamentação deve ser expressa, através da sucinta exposição dos fundamentos de facto e direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso parte integrante do respectivo acto.
2. Equivale à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto."
A fundamentação, ainda que sucinta, deve ser suficiente para convencer (ou não) o particular e permitir-lhe o controlo do acto.
Traduz-se isto em dizer que o particular deve ficar na posse de todos os elementos de facto e de direito que conduziram à decisão, ou seja, deve dar-se-lhe, ainda que de forma sucinta, nota do "itinerário cognoscitivo e valorativo" seguido para a tomada de decisão.
Só assim o particular pode analisar a decisão e ponderar se lhe dá ou não o seu acordo; também só por essa via, ele fica munido dos elementos essenciais para poder impugnar a decisão: só sabendo quais os factos concretos considerados pela Administração, ele pode argumentar se eles se verificam ou não; só conhecendo os critérios valorativos da Administração sobre esses factos, ele pode discuti-los, apresentar outros ou até valorá-los doutra forma; finalmente, só em face das normas legais invocadas, ele pode discernir se são essas ou outras as aplicáveis ao caso.
Pretende-se, pois, que fique ciente do modo e das razões por que se decidiu num ou noutro sentido."
Até aqui, estamos integralmente de acordo com tudo o que foi dito.
Diz de seguida a sentença:
"No que concerne à situação dos autos, verificamos que a fundamentação utilizada no relatório final que suporta "a deliberação tomada relativa à adjudicação em reunião de Câmara respeitante à adjudicação efectivada" é manifestamente insuficiente, nomeadamente, no que ao preenchimento da condição a que alude n.º2 do artigo 31.º do Decreto - Lei n.º 12/2004 de 9 de Janeiro citado, diz respeito, como supra referimos."
Ora, considerando o ponto G) da factualidade provada, onde se diz que "conforme relatório preliminar, (S......... - Sociedade ................., Lda.) é detentor da classificação de Empreiteiro Geral ou Construtor Geral de Edifícios de Construção Tradicional", que estamos perante a construção de um edifício escolar, a fundamentação utilizada afigura-se-nos ser suficiente e clara. É evidente que um edifício escolar, regra geral (a menos que o concurso tenha tido outra opção, o que não é o caso dos autos), será construído de forma tradicional.
Diz-se também na sentença recorrida que "da fundamentação genérica do Réu quanto às pontuações arbitradas aos concorrentes não resultam claros e evidentes os fundamentos que determinaram a diferente pontuação atribuída. Falta apurar porque razões e em função de que parâmetros foram diferentemente valoradas".
Da leitura da decisão do júri, transcrita supra na factualidade acrescentada, resulta claro que as razões foram, quanto aos planos de trabalho, que os mesmos variaram entre "o factor de ponderação de 90% e 75% atendendo ao grau de pormenorização e adequação propostos", e quanto à Memória descritiva, que foram atribuídos 75% e 50% consoante o grau de pormenorização e adequação propostos.
Não se pode pois dizer que não resultam claros e evidentes os fundamentos que determinaram a diferente pontuação atribuída.

4.4. O Tribunal de Contas tem vindo a defender que o júri deve ser nomeado concurso a concurso, por força do artº 67 do CCP. Entende-se que desta forma o princípio da imparcialidade fica mais protegido.
A argumentação pode ter algum peso, mas não se nos afigura decisiva. É que a argumentação é reversível. Se o júri for nomeado concurso a concurso, pode-se sempre suspeitar pela possibilidade de se ter arranjado um júri especial para aquele concurso. E respeitará mais o principio da imparcialidade nomear sempre o mesmo júri, caso a caso, ou nomear previamente o júri para todos os concursos ? É defensável que nesta hipótese o princípio da transparência fica mais protegido. Aceitamos contudo que a solução óptima seja a de nomear um júri concurso a concurso, devendo a entidade adjudicante tentar que o júri vá variando ao longo dos vários concursos que lança. Mas, isto não existe enquanto imposição legal e, é duvidoso que possa ser imposto pelos Tribunais.
Analisando o caso sub-judice, considerando que estávamos perante o primeiro procedimento ao abrigo do novo CCP que aquela entidade adjudicante lançou, que o júri só foi utilizado neste concurso, não se nos afigura que neste caso concreto tenha sido violado o princípio da imparcialidade.

3.5. Nos termos do artº 139.4 do CCP, "na elaboração do modelo de avaliação das propostas não podem ser utilizados quaisquer dados que dependam, directa ou indirectamente, dos atributos das propostas a apresentar, com excepção dos da proposta a avaliar."
Quer-se com isto dizer que "o CCP proíbe ainda que o modelo de avaliação estabeleça que na avaliação de uma proposta sejam utilizados dados que dependam das características de outras propostas: o CCP parece aqui proibir a avaliação relativa das propostas, a sua comparação" (Margarida Olazabal Cabral, in O Concurso Público no Código dos Contratos Públicos, Estudos de Contratação Pública, I, pág. 207).
No caso dos autos, como o factor preço do concurso seria analisado tendo como base a seguinte fórmula: N=Vp/VPX12, em que
N= Nota obtida no subfactor preço da proposta
Vp= Preço da proposta mais baixa
VP= Preço da proposta em análise
temos de concluir que o preço de uma das propostas (a mais baixa) influenciava a cotação das demais, o que é proibido pelo novo CCP.
Assim sendo, tem de ser anulado o presente programa do concurso.

5. Conclusão: Por tudo quanto vem de ser exposto, Acordam os Juízes do presente Tribunal Central Administrativo Sul em Julgar improcedente o recurso, e, anular o programa do presente procedimento concursal.
Custas pelo recorrente.
Registe e notifique.
Lisboa, 19 de Janeiro de 2011
Paulo Carvalho
Carlos Araújo
Teresa de Sousa