Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 22 de Junho de 2011 (proc. 770/10)

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Sumário:

1. Nos termos do disposto no artigo 27°, n.° 3 da Portaria n.° 701-G/2008, nos casos em que o certificado digital não possa relacionar directamente o assinante com a sua função e poder de assinatura, deve a entidade interessada submeter à plataforma um documento electrónico oficial indicando o poder de representação e assinatura do assinante.
2. Porém o facto de um candidato não ter submetido à plataforma, pelo menos até à adjudicação, documento electrónico oficial apto a atestar a qualidade de quem assinou a sua proposta não deve levar à exclusão da proposta se efectivamente quem assinou a proposta tinha poderes para representar e obrigar a mesma concorrente, facto que o Júri do concurso comprovou por elementos extra concursais de que dispunha e por a empresa em causa, em momento ulterior, ter procedido à apresentação da Certidão Permanente.
3. O ónus de submeter à plataforma electrónica um documento oficial, que permita aferir dos poderes de representação do assinante, não constituiu um requisito de validade material e intrínseca da proposta mas apenas uma exigência formal.
4. O cumprimento desta formalidade legal destina-se a assegurar o cumprimento de uma exigência substantiva, a de que quem vincula a empresa à aceitação do caderno de encargos, por meios electrónicos estabelecidos na lei, tem poderes para o fazer.
5. Alcançado este desiderato legal, não se justifica excluir a proposta nos termos previstos no artigo 146°, n.° 2, al. e) do Código dos Contratos Públicos, pois este preceito impõe a exclusão de uma proposta somente quando quem assina digitalmente a proposta não tem poderes para representar e obrigar a mesma concorrente.*
* Sumário elaborado pelo Relator
  

Texto Integral:

EM NOME DO POVO

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

J..., S.A. interpôs o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, de 23.03.2011, a fls. 203 e seguintes, pela qual foi julgada totalmente improcedente a acção administrativa urgente de contencioso pré-contratual que intentou contra o Município de Oliveira do Hospital, e várias empresas, contra-interessadas, entre elas e ora Recorrida Construções I..., S.A..
Invocou para tanto que o acto de adjudicação à firma Construções I..., S.A., padece de um vício claro de ilegalidade, por violação, por parte do Município Réu, do disposto nos artigos 56° e 57°, n.°s 1, alínea a), e 4 do Código dos Contratos Públicos, bem como o previsto no n.º 3 do artigo 27.° da Portaria n.º 701-G/2008; ao decidir o contrário, em sentença recorrida incorreu em erro de aplicação daquela norma ao caso concreto.
O Município recorrido, por um lado, e a mencionada Contra-Interessada, por outro, contra-alegaram, defendendo a manutenção da sentença recorrida.
O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer sobre o recurso. Cumpre decidir já que nada a tal obsta.

São estas as conclusões das alegações do presente recurso jurisdicional e que definem respectivo objecto:
A) A sentença recorrida enferma de erro na apreciação da matéria de facto e na aplicação do direito.
B) O acto de adjudicação à firma Construções I..., S.A., padece de um vício claro de ilegalidade, por violação, por parte do Município Réu, do disposto no n.° 3 do artigo 27.° da portaria n.° 701-G/2008.
C) A proposta apresentada pela firma adjudicatária nunca deveria ter sido admitida a concurso e a sua proposta analisada, porquanto não foi apresentado pela mesma, no momento de submissão da respectiva proposta, o documento (cuja apresentação é obrigatória!) previsto no n.° 3 do artigo 27.° da portaria n.° 701-G/2008.
D) A não apresentação do documento previsto na referida Portaria não consubstancia uma mera irregularidade, porquanto a sua apresentação é obrigatória atento o disposto no n.° 3 do artigo 27º daquele diploma, porquanto inexiste outra forma de, naquele procedimento, comprovar a qualidade e os poderes de vinculação de quem assinou a proposta em crise.
E) A exigência referida, ao contrário do defendido pelo Tribunal a quo, não é, de todo em todo, uma exigência atinente com a regulamentação da plataforma electrónica, uma mera regra de funcionamento da mesma, muito pelo contrário e como ali é expressamente dito, é uma exigência formal para que se possa comprovar a identidade e os poderes de representação de quem ali submete qualquer proposta.
F) Salvo o devido respeito, que é muito, dúvidas não há que o documento referido naquele normativo é de apresentação obrigatória, pelo que a sua não apresentação não pode consubstanciar uma mera irregularidade, sanável a posteriori, como se veio a verificar.
G) Porquanto sem tal documento inexiste um único meio de comprovação de que a proposta era efectivamente apresentada pela firma em causal
H) Admitir-se que qualquer dono de obra pública "ultrapasse" a ausência dos documentos exigidos, de forma textual e incontornável na lei, numa fase e momento próprios, argumentando que existem nos serviços municipais, um documento fora do procedimento, que permite comprovar a qualidade de quem assinou uma determinada proposta! - é, além de tudo o mais, uma clamorosa violação do princípio da igualdade entre os concorrentes que tiverem a sorte de já ter trabalhado com este ou aquele dono de obra e todos os outros que nunca o tenham feito.
I) De resto, no concurso em causa o Júri do Procedimento usou dois pesos e duas medidas na apreciação da legalidade da apresentação de duas propostas: a da firma adjudicatária e a da firma F... & F..., Lda., com diferenças incontornáveis nas diligências "heterodoxas" para que uma fosse considerada regulamente proposta e a outra excluída!
J) Mais, as diligências do mesmo Júri ao contactar a "Construlink" e procurar nos serviços municipais documento que atestasse a qualidade de quem assinou a proposta da firma adjudicatária, já depois da decisão de adjudicação viola os princípios da legalidade, igualdade e concorrência.

A sentença fixou como provada a seguinte matéria de facto, sem reparos nesta parte:
1 - Por deliberação da Câmara Municipal do R. de 28/0912010, foi aberto concurso público urgente para a empreitada de "Construção de Centro Educativo de Nogueira do Cravo, bem como aprovados os respectivos programa de concurso, caderno de encargos e projecto, cujo orçamento ascende a 1.663.000,00 Euros;
2 - Do programa do Concurso consta, além do mais, o seguinte:
"(...)
Artigo 7°
Documentos da proposta
A proposta á constituída pelos seguintes documentos:
a) Declaração de aceitação do conteúdo do caderno de encargos, elaborada em conformidade com o modelo constante do anexo I do Código da Contratação Púbica, e que se anexa ao presente programa;
(...)
Artigo 12°
Critério de Adjudicação
O critério de apreciação das propostas será o seguinte: preço mais baixo.
3 - Por anúncio de concurso urgente nº 425/2010, foi publicado no Diário da República n.° 199, 2ª série, Parte L, de 13/10/2010, a abertura do concurso público relativo a empreitada de Construção do Centro Educativo de Nogueira do Cravo, em Oliveira do Hospital;
4 - A contra-interessada Construções I..., S.A. apresentou proposta, que integra documento do seguinte teor:
"(...)
1 - C..., portador do Bilhete de Identidade n° ... e residente em ... Nogueira do Cravo, 3400-481 Nogueira do Cravo OHP, na qualidade de representante legal de Construções I..., Lda., com número de identificação fiscal 5... e sede em ..., titular do Alvará de Construção n.° 2..., tendo tomado inteiro e perfeito conhecimento do caderno de encargos relativa a execução do contrato a celebrar na sequência do procedimento de "CENTRO EDUCATIVO DE NOGUEIRA DO CRAVO", declara, sob compromisso de honra, que se obriga a executar o referido contraio em conformidade com o conteúdo do mencionado caderno de encargos, relativamente ao qual declara aceitar, som reservas, todas as suas cláusulas.
2- Declara também que executará o referido contrato nos termos previstos nos seguintes documentos, que junta em anexo:
b) Proposta, Memória descritiva e Nota justificativa do preço proposto;
c) Declaração dos preços parciais e alvarás;
d) Declaração de preço não anormalmente baixo;
e) Lista de preços unitários (plataforma.);
O Planos de Trabalhos, Plano Mão-de-Obra, Plano de Equipamentos, Plano de pagamentos e Cronograma;
3- Declara ainda que renuncia a foro especial e se submete, em tudo o que respeitar à execução do referido contrato, ao disposto na legislação portuguesa aplicável.
4- Mais declara, sob compromisso de honra, que:
a) Não se encontra em estado de insolvência, em fase de liquidação, dissolução ou cessação de actividade, sujeita a qualquer meio preventivo de liquidação de patrimónios ou em qualquer situação análoga, nem tem o respectivo processo pendente;
b) Não foi condenada por sentença transitada em julgado por qualquer crime que afecte a sua honorabilidade profissional.
c) Não foi objectivo de aplicação de sanção administrativa por fatia grave em matéria profissional.
d) Tem a sua situação regularizada relativamente a contribuições para a segurança social em Portugal.
e) Tem a sua situação regularizada relativamente a impostos devidos em Portugal.
f) Não foi objecto de aplicação da sanção acessória prevista na alínea e) do n.° 1 do artigo 21.º do Decreto-Lei n°433/82, de 27 de Outubro, no artigo 45.º da Lei n.° 18/2003, de 11 de Junho, e no n.° 1 do artigo 460° do código dos contratos públicos;
g) Não foi objecto de aplicação da sanção acessória prevista na alínea b) do n° 1 do artigo 627.º do Código de Trabalho.
h) Não foi objecto de aplicação, há menos de dois anos, de sanção administrativa ou judicial pela utilização ao seu serviço de mão-de-obra legalmente sujeita ao pagamento de impostos e contribuições para a segurança social, não declarada nos termos das normas que imponham essa obrigação, em Portugal
i) Não foi condenado por sentença transitada em julgado por algum dos seguintes crimes:
i) Participação em actividades de uma organização criminosa, tal como definida no n.° 1 do artigo 2º da Acção Comum n.º 98/773/JAI, do Conselho;
ii) Corrupção, na acepção do artigo 3.° do Acto do Conselho de 26 de Maio de 1997 e do n. 1 do artigo 3.º da Acção comum nº 98/742/JAI do Conselho;
iii) Fraude, acepção do artigo 1 da Convenção relativa à Protecção dos Interesses Financeiros das Comunidades Europeias;
iv) Branqueamento de Capitais, na acepção do artigo 1° da Directiva n.° 91/308/CEE, de Conselho, de 10 de Junho, relativa á prevenção da utilização de sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais;
1) Não prestou, a qualquer título, directa ou indirectamente, assessoria ou apoio técnico na preparação e elaboração das peças do procedimento.
5- O declarante tem pleno conhecimento de que a prestação de falsas declarações implica, consoante o caso, a exclusão da proposta apresentada ou a caducidade da adjudicação que eventualmente sobre ela recaia e constitui contra-ordenação muito grave, nos termos do artigo 456.º do Código dos Contratos Públicos, a qual pode determinar a aplicação da sanção acessória de privação do direito de participar, como candidato, como concorrente ou como membro de agrupamento candidato ou concorrente, em qualquer procedimento adoptado para a formação de contratos públicos, sem prejuízo da participação à entidade competente para efeitos de procedimento criminal.
6- Quando a entidade adjudicante o solicitar, o concorrente obriga-se, nos termos do disposto no artigo 81.º do Código do Contratos Públicos, a apresentar a declaração que constitui o anexo ii do referido Código, bem como os documentos comprovativos de que se encontra nas situações previstas nas alíneas b), d), e) e i) do nº 4 desta declaração.
7- O declarante tem ainda pleno conhecimento de que a não apresentação dos documentos solicitados nos temias do número anterior, por motivo que lhe seja imputável, determina a caducidade da adjudicação que eventualmente recaia sobre a proposta apresentada e constitui contra-ordenação muito grave, nos termos do artigo 456° do Código dos Contratos Públicos, a qual pode determinar a aplicação da sanção acessória de privação do direito de participar, como candidato, como concorrente ou como membro de agrupamento candidato ou concorrente, em qualquer procedimento adoptado para a formação de contratos públicos, sem prejuízo da participação à entidade competente para efeitos de procedimento criminal.
Oliveira do Hospital, 18 de Outubro de 2010
(...)"
5 - A proposta e o documento referidos no ponto anterior encontram-se assinados digitalmente, por C..., não tendo sido junto no momento da entrega da proposta documento que comprove a qualidade e os poderes de representação de quem procedeu à assinatura digital;
6 - Em 20/10/2010, o Júri do Concurso deliberou, além do mais, o que se segue:
"(...)
ANÁLISE DAS PROPOSTAS
EMPREITADA DE: "CONSTRUÇÃO DO CENTRO EDUCATIVO DE NOGUEIRA DO CRAVO"
Procedimento por Concurso Público ao abrigo do artigo 155 e seguintes, do CCP, aberto por deliberação da Câmara Municipal, de 28 de Setembro de 2010
Aos vinte dias de Outubro de dois mil e dez, (...), reuniu o Júri designado para o procedimento em epigrafe (...), para efeitos de proceder à análise das propostas apresentadas no âmbito do procedimento em referencia.
Apresentaram proposta os seguintes concorrentes:
(...)
Da análise formal dos documentos que integram as propostas verificam-se duas situações relacionadas com a assinatura dos documentos nos ternos definidos no artigo 27° da Portaria n° 701-G/2008 de 29 de Julho, relativamente aos concorrentes F... e F..., Lda., e Construções I..., Lda.
No caso da concorrente F... e F..., Lda., verifica-se que a assinatura dos documentos não é feita com certificado digital, mas sim com o certificado de acesso à plataforma, o qual não permite identificar o assinante, para além do facto de não dar cumprimento ao esti pulado no fé citado artigo 27° da Portaria n.° 701-G/2008 de 29 de Julho, conjugado com o disposto no n.° 4 do artigo 62 do CCP, pelo que o Júri decidiu por unanimidade propor a exclusão da referida concorrente.
No caso da concorrente Construções I..., Lda. Apesar de os documentos se encontrarem assinados com certificado digital, levantou-se a dúvida do poder de representação do assinante, no entanto considerando que:
a) se trata da proposta de mais baixo preço;
b) se encontra arquivado nos serviços municipais documento que inequivocamente comprova o poder de representação do assinante (certidão permanente da Conservatória do Registo Comercial de Oliveira do Hospital), em contratos firmados recentemente com a mesma empresa, para além do facto de que tal documentação é imprescindível à celebração do contrato, fazendo parte dos documentos de habilitação, a entregar oportunamente;
c) o princípio da proporcionalidade fixado no artigo 5º do Código do Procedimento Administrativo aconselha, atento o interesse público a prosseguir. (obrigação de adjudicará proposta de mais baixo preço, nos termos do disposto no artigo 155, alínea b) do CCP, sendo que no concurso em análise se verifica uma diferença de 104.203,49 Euros, correspondente a cerca de 10% a menos, relativamente à proposta classificada em segundo lugar) a propositura da admissão da proposta da concorrente Construções I..., Lda, atento os requisitos da adequação, necessidade e proporcionalidade, subjacentes ao referido artigo 5° e que aqui se consideram reunidos nos termos expostos.
Assim pela aplicação do critério da adjudicação - preço mais baixo - a lista ordenada fica assim constituída
Construções i..., SA. 1 045 796,51 €
J..., S.A. 1149 000,00€
L..., Lda. 1 416 185,44 €
J..., Lda. 1 441 721,50€
R..., S.A. 1 494 771,44 €
C..., SA. 1 496 815,01 €
T..., L.da. 1 504 966,86 €
C..., SA. 1 622 077,35 €
Perante este resultado, se verifica que a concorrente situada em primeiro lugar é a firma Construções I..., S.A., com a proposta no valor de 1 045 796,51 € (...), acrescido de IVA à taxa legal em vigor.
Em conclusão, estão reunidas as condições para que se proceda À respectiva adjudicação e execução do contrato.
(...)
7 - Em 26/10/2010, a Câmara Municipal do R. deliberou, por maioria, concordar com o relatório descrito no ponto anterior e adjudicar a empreitada de "Construção de Centro Educativo de Nogueira do Cravo" à firma Construções I..., SA., pelo valor da sua proposta de 1.045.796,51 € (...), acrescido de IVA à taxa legal em vigor;
8 - Em 02/11/2010, a A., a contra-interessada adjudicatária e todas as demais contra-interessadas foram notificados da decisão de adjudicação;
9 - A A. apresentou reclamação dos actos descritos em 6 e 7 deste probatório, nos termos que constam de fls. 157 a 161 dos autos (suporte físico), que foi indeferida em 23/11/2010 do modo que se transcreve:
"(...)
Tendo a Firma J..., S.A., concorrente á empreitada em epigrafe, apresentado uma reclamação quanto ao conteúdo do relatório final de Análise das Propostas e da intenção de adjudicação da referida empreitada â Firma «Construções I..., S.A., por discordarem de tal decisão, foi presente pelo Presidente da Câmara a apreciação da mesma efectuada pelo Júri do concurso público urgente em causa, constituído por deliberação de 28 de Setembro de 2010, e que a seguir se transcreve na integra.
"- O júri do concurso público urgente relativo à empreitada em epigrafe, constituído por deliberação de 28 de Setembro de 2010 cessou funções com a apresentação da análise das propostas razão pela qual entende que a presente reclamação deverá ser endereçada à Câmara Municipal, órgão competente para a sua apreciação. Não obstante e tendo o Sr. Presidente da Câmara solicitado previamente uma apreciação da reclamação da firma J..., S.A. por parte do Júri, este deliberou, por unanimidade e nos termos a seguir expostos, pronunciar-se pela manutenção da admissão da firma Construções I..., S.A. e da classificação final constante do relatório de apreciação das propostas, datado de 20 de Outubro de 2010
O concorrente F... & F... assinou os documentos com certificado de acesso à Plataforma e não com certificado digital o que não permitiu sequer identificar o assinante, razão pela qual se entende correcta a exclusão do mesmo;
Efectivamente o n.° 4 do referido artigo 57.º determina que a declaração a que se refere a alínea c) do n.° 1 da mesmo artigo deve ser assinada pelo concorrente ou por representante que tenha poderes para o obrigar. Ora tal declaração mostra-se assinada pelo concorrente Construções I..., SA., através de certificado digital (Cartão de Cidadão) o qual não relaciona directamente o assinante com o poder de assinatura caso em que "deve a entidade interessada submeter à plataforma um documento electrónico oficial indicando o poder de representação e assinatura do assinante", conforme disposto no ° 3 do art.° 27° da Portaria nº. 701-G/2008, de 29 de Julho;
Tal como referiu o júri encontrava-se arquivado nos serviços municipais documento que inequivocamente comprovou o poder de representação do concorrente (Certidão Permanente da conservatória do Registo Comercial de Oliveira do Hospital) em contratos firmados com a mesma empresa, tendo esta igualmente disponibiliza do à Construlink, empresa que gere a plataforma electrónica de Contratação Pública, para efeitos de credenciação na Plataforma, o código de acesso À certidão permanente;
Aquando da apresentação dos documentos de habilitação foi entregue nova certidão da Conservatória do Registo Comercial que mantém tais poderes;
O Júri, tendo presente a recente Jurisprudência do Tribunal de Contas, entende que da conjugação dos princípios da transparência do igualdade e da concorrência estabelecidos no n.° 4 do art° 1 do CCP com os princípios a que se subordina toda a actividade pública, nos termos da Constituição e da Lei (nomeadamente o CPA) entre eles o da prossecução do interesse público e o da proporcionalidade resulta o interesse da Administração e de uma sã concorrência económica em considerar o maior número de propostas que, de forma efectiva, eficaz e eficiente, correspondam à satisfação das necessidades públicas;
Procurou assim o Júri não sobre valorizar aspectos formais tendo presente a necessária observância de valores fundamentais relacionados com a prossecução dos interesses públicas, designadamente a protecção dos interesses financeiros públicos;
Por outro lado, constatou-se que a Firma Construções I..., S.A., apresentou o preço mais baixo 1.045.796,51 € (Um milhão, quarenta e cinco mil, setecentos e noventa e seis euros e cinquenta e um cêntimos), portanto cerca de 10% menos do que a segunda classificada do concorrente J..., SA. 1 149.000,00 € (Um milhão, cento e quarenta e nove mil Euros) o que, em caso de exclusão, face aos critérios de adjudicação previstos no Programa de Concurso prece mais baixo, alteraria o resultado financeiro de contrato, com agravamento do respectivo valor para a entidade adjudicante:
Com o procedimento adoptado julgou-se melhor prosseguir o interesse público, como foi dito, não se considerando violado o principio da intangibilidade das propostas porquanto a proposta admitida não foi alterada na sua substância e essência e particularmente nos atributos sujeitos à concorrência (unicamente o preço);
Tratando-se de um concurso público urgente não lhe são aplicáveis as normas relativas à lista de concorrentes e consulta das propostas apresentadas (art.° 138º do CCP) que apenas por lapso do júri foi publicitada e relatório preliminar e final (art° 146° e 148°) tendo a Câmara Municipal concordado, no entanto, com a análise das propostas e consequentes conclusões, subscritas pelo júri conforme deliberação tomada em 26 de Outubro de 2010."
Analisado o assunto, entre várias intervenções sobre a matéria em discussão, a Câmara Municipal deliberou, por maioria, com os votos favoráveis do Presidente da Câmara e dos Vereadores José Francisco Rolo, Graça Silva, José Carlos Mendes e Teima Martinho e as abstenções dos Vereadores Mário Alves e Paulo Rocha, não considerar a reclamação apresentada pela firma J..., S.A. e manter a decisão de adjudicação à Firma Construções I..., S.A., tomada por deliberação de 26 de Outubro de 2010.
(...)";
10 - A A. foi notificada da decisão que antecede em 15/12/2010;
11 - Em 08/11/2010, a contra-interessada adjudicatária juntou Certidão Permanente da Conservatória do Registo Comercial de Oliveira do Hospital, na qual atesta os poderes de representação de quem procedeu à assinatura digital da proposta e subscreveu a declaração de aceitação referidas no ponto 4 deste probatório, ou seja, de C..., sendo que a dita Certidão Permanente possui a data de subscrição de 15/05/2010 e é válida até 15/05/2011;
12 - A presente acção foi proposta em 02/12/2010.

Enquadramento jurídico

A Autora, ora Recorrente defende que o acto de adjudicação à Contra-Interessada e ora Recorrida da empreitada de "Construção do centro Educativo de Nogueira do Cravo" é ilegal, por violação do disposto nos art.°s 56° e 57°, n.°s 1, alínea a), e 4 do Código dos Contratos Públicos, bem como o previsto no art.° 27°, n.° 3 da Portaria, n.° 701-G/2008, de 29 de Julho, visto que a sua proposta, não obstante se encontrar digitalmente assinada, não integra o documento adequado a atestar os poderes de representação de quem assinou digitalmente.
Entende que, em vez de ter sido adjudicada a empreitada em causa à empresa Construções I..., S.A.., deveria a proposta desta ter sido excluída.
A sentença recorrida ao decidir o contrário incorreu, na sua tese, em erro de interpretação e aplicação ao caso concreto do disposto nas mencionadas normas.
Mas não tem razão, adianta-se.
A proposta de cada concorrente num concurso para celebração de contrato público deve ser instruída, para além do mais, com a declaração do concorrente de aceitação do conteúdo do caderno de encargos - artigo 57º, n.º 1, al. a) do Código dos Contratos Públicos.
Por seu turno, determina o Estipula o n.º 4 deste mesmo preceito que tal declaração deve ser assinada pelo concorrente ou por representante que tenha poderes para o obrigar.
No caso concreto mostra-se incontroverso que quem assinou os documentos da proposta e a declaração de aceitação do conteúdo do caderno de encargos foi C..., tal como ficou provado sob os pontos 4 e 5 sem que tal tenha sido questionado no presente recurso.
Também ficou provado - sem reacção da Recorrente - que esta pessoa detinha, na data em que foi apresentada a proposta, poderes para representar e obrigar a contra-interessada adjudicatária (facto alinhado sob o n.º11).
Sendo assim, como se decidiu, "é inequívoco que não ocorre qualquer falta de poderes de representação de quem apresentou a proposta e obrigou a contra-interessada através da declaração de aceitação do conteúdo do caderno de encargos".
Analisemos agora a invocada violação do disposto no artigo 27°, n.° 3 da Portaria n.° 701-G/2008, e que, no entender da Recorrente, deveria ter levado à exclusão da adjudicatária.
Na verdade este preceito determina que, nos casos em que o certificado digital não possa relacionar directamente o assinante com a sua função e poder de assinatura, deve a entidade interessada submeter à plataforma um documento electrónico oficial indicando o poder de representação e assinatura do assinante.
Vistos os factos, em particular os n.ºs 4 e 5, é claro que, como se reconhece na sentença recorrida, a contra-interessada não submeteu à plataforma, pelo menos até à adjudicação, documento electrónico oficial apto a atestar a qualidade de quem assinou a sua proposta.
Mas também como se decidiu, com acerto, esta falta não tinha de conduzir, como não conduziu, à exclusão desta proposta.
O ónus de submeter à plataforma electrónica um documento electrónico oficial, que permita aferir dos poderes de representação do assinante, não constituiu um requisito de validade material e intrínseca da proposta mas apenas uma exigência formal.
O cumprimento desta formalidade legal destina-se a assegurar o cumprimento de uma exigência substantiva, a de que quem vincula a empresa à aceitação do cadernos de encargos, por meios electrónicos estabelecidos na lei, tem poderes para o fazer.
Reportando-nos de novo ao caso concreto esta exigência substantiva foi cumprida dado que o assinante digital tinha poderes para vincular a empresa concorrente à aceitação do caderno de encargos.
Apenas não foi cumprida a exigência formal, o que não basta para determinar a exclusão da proposta nos termos previstos no artigo 146°, n.° 2, al. e) do Código dos Contratos Públicos, pois este preceito impõe a exclusão de uma proposta somente quando quem assina digitalmente a proposta não tem poderes para representar e obrigar a mesma concorrente.
Por outro lado, esta deficiência formal da proposta foi ultrapassada, sanada, quer porque o Júri comprovou os poderes de representação do assinante digital, validando a proposta da contra-interessada, quer porque, em momento ulterior, esta procedeu à apresentação da Certidão Permanente.
Como defende Rodrigo Esteves de Oliveira, em "Os princípios gerais da contratação pública", nos "Estudos de Contratação Pública" (CEDIPRE), I volume, Coimbra Editora, 2008, página 111, seguindo o entendimento anti-formalista prevalecente na nossa doutrina e jurisprudência, "...haverá uma situação de irrelevância do vício de procedimento sempre que (e na medida em que) os fins específicos que a imposição legal (ou regulamentar) da formalidade visava atingir tenham sido comprovadamente alcançados, ainda que por outra via" (na jurisprudência, seguindo este entendimento, ver os acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte, de 22.10.2010, no processo n.° 323/10.0 BECBR, citado na sentença recorrida, e de 27.01.2011, processo n.º 228 10.5 BEVIS).
E não se verifica, neste procedimento, em que o Júri se socorreu de um elemento documental externo ao concurso para se assegurar do poder de representação do assinante digital da proposta da contra-interessada, uma violação do princípio da intangibilidade da proposta.
Nos termos do preceituado no art.º 56°, n.° 1 do Código dos Contratos Públicos, a proposta é a declaração da vontade de contratar nos termos e condições constantes do caderno de encargos e inclui documentos relativos aos atributos da proposta, isto é, ao modo como o concorrente se dispõe a contratar os aspectos submetidos à concorrência pelo caderno de encargos. É o caso, como se menciona na sentença recorrida, dos aspectos referentes ao preço, elemento típico de submissão à concorrência.
Ora a comprovação, por meios electrónicos, dos poderes para representar a empresa concorrente não integra os elementos intrínsecos da proposta, sujeitos à concorrência, mas traduz, antes, um aspecto meramente formal da proposta.
Pelo que, improcede a arguida violação do princípio da intangibilidade da proposta.
Também, como se decidiu, não se verifica no acto de adjudicação qualquer violação dos princípios da legalidade e da igualdade, com o argumento de que o Júri tratou de modo diverso duas situações absolutamente idênticas.
A proposta da empresa F... & F... foi excluída porque esta não procedeu à assinatura electrónica nos termos do previsto nos art.°s 26° e 27° da Portaria n.° 701-G/2008, ou seja, não procedeu à assinatura da proposta com certificação digital, o que não permitiu, sequer, a identificação do assinante da proposta para efeitos do preceituado no artigo 57°, n.° 4 do Código dos Contratos Públicos, como se expõe na sentença recorrida.
Em bom rigor, como se decidiu, esta proposta não foi sequer assinada, o que constitui motivo, substantivo, de exclusão nos termos deste último preceito, não sendo sanável.
Situação que não se confunde com a da proposta da empresa adjudicatária, a qual, como se disse, apresentava uma mera deficiência formal que foi sanada.
Conclui-se, pois, que também por esta via não padece o acto de adjudicação de qualquer vício invalidante.

Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em negar provimento ao recurso jurisdicional, mantendo a decisão recorrida.
Custas pelo Recorrente.

Porto, 22 de Junho de 2011
Ass. Rogério Martins
Ass. José Augusto Araújo Veloso
Ass. Antero Pires Salvador