Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia, de 26 de Maio de 2011 (proc. C-306/08)

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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

26 de Maio de 2011 (*)

 

«Incumprimento de Estado - Directivas 93/37/CEE e 2004/18/CE - Processos de adjudicação de empreitadas de obras públicas - Legislação urbanística da Comunidade Autónoma de Valência»

 

No processo C‑306/08,

que tem por objecto uma acção por incumprimento nos termos do artigo 226.° CE, entrada em 9 de Julho de 2008,

Comissão Europeia, representada por A. Alcover San Pedro, D. Kukovec e M. Konstantinidis, na qualidade de agentes, demandante,
contra
Reino de Espanha, representado por M. Muñoz Pérez, na qualidade de agente, demandado,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente de secção, D. Šváby (relator), R. Silva de Lapuerta, E. Juhász e T. von Danwitz, juízes,

advogado‑geral: N. Jääskinen,

secretário: R. Şereş, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 6 de Maio de 2010,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 16 de Setembro de 2010,

profere o presente

Acórdão

1. Na sua acção, a Comissão Europeia pede que o Tribunal de Justiça declare que, ao adjudicar os «programas de actuação integrada» (a seguir «PAI») em aplicação, sucessivamente, da Lei 6/1994, de 15 de Novembro de 1994, que regulamenta a actividade urbanística na Comunidade Autónoma de Valência (Ley 6/1994, de 15 de noviembre, Reguladora de la Actividad Urbanística de la Comunidad Valenciana, a seguir «LRAU»), e da Lei 16/2005, de 30 de Dezembro de 2005, que institui o Código de Urbanismo da Comunidade Autónoma de Valência (Ley 16/2005, de 30 de diciembre, Urbanística Valenciana, a seguir «LUV»), o Reino de Espanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem, respectivamente, por força da Directiva 93/37/CEE do Conselho, de 25 de Junho de 1993, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de empreitadas de obras públicas (JO L 199, p. 54), conforme alterada pela Directiva 2001/78/CE da Comissão de 13 de Setembro de 2001 (JO L 285, p. 1, a seguir «Directiva 93/37»), e da Directiva 2004/18/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de Março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação dos contratos de empreitada de obras públicas, dos contratos públicos de fornecimento e dos contratos públicos de serviços (JO L 134, p. 114).

       Quadro jurídico

       Regulamentação da União

       Directiva 92/50/CEE

2. O décimo sexto considerando da Directiva 92/50/CEE do Conselho, de 18 de Junho de 1992, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos públicos de serviços (JO L 209, p. 1), enuncia:

«Considerando que resulta da Directiva 71/305/CEE que um contrato só poderá ser considerado um contrato de empreitada de obras públicas se tiver por objecto a execução de uma obra; que os contratos públicos de serviços, nomeadamente no domínio dos serviços de gestão de propriedades, poderão, em certos casos, incluir a execução de obras; que, se essas obras forem acessórias e não constituírem o objecto do contrato, não poderão justificar a classificação do contrato como contrato de empreitada de obras públicas.»

3. O artigo 8.° da Directiva 92/50 dispõe:

«Os contratos que tenham por objecto serviços enumerados no anexo I‑A serão celebrados de acordo com o disposto nos títulos III a VI.»

4. O anexo I‑A da Directiva 92/50 tem por objectivo, designadamente, na sua categoria 12, os «[s]erviços de arquitectura, serviços de engenharia e serviços de engenharia integrados, [p]laneamento urbano e serviços de arquitectura paisagísticos, [s]erviços de consultoria científica e técnica afins, [s]erviços técnicos de ensaio e análise».

       Directiva 93/37

5. O artigo 1.° da Directiva 93/37 dispõe:

«Para efeitos da presente directiva:

a) Os contratos de empreitada de obras públicas são contratos a título oneroso, celebrados por escrito entre um empreiteiro, por um lado, e uma entidade adjudicante, definida na alínea b), por outro, que tenham por objecto quer a execução quer conjuntamente a execução e concepção das obras relativas a uma das actividades referidas no anexo II ou de uma obra definida na alínea c), quer a realização, seja por que meio for, de uma obra que satisfaça as necessidades indicadas pela entidade adjudicante;

[...]

c) Entende‑se por obra o resultado de um conjunto de trabalhos de construção ou de engenharia civil destinado a preencher, por si mesmo, uma função económica ou técnica;

d) A concessão de obras públicas é um contrato que apresenta as mesmas características que as referidas na alínea a), com excepção de que a contrapartida das obras consiste quer unicamente no direito de exploração da obra quer nesse direito acompanhado do pagamento de um preço;

[...]»

6. O artigo 6.°, n.° 6, da Directiva 93/37 impõe às entidades adjudicantes o respeito do princípio da não discriminação.

7. Os artigos 11.° e 12.° da Directiva 93/37 enunciam as regras comuns de publicidade na matéria e prevêem, designadamente, a publicação, na íntegra, dos anúncios de concursos no Jornal Oficial das Comunidades Europeias e os prazos aplicáveis à recepção das propostas e ao envio dos cadernos de encargos e dos documentos complementares.

8. Os artigos 24.° a 29.° da Directiva 93/37 enunciam os critérios de selecção qualitativa dos empreiteiros, entre os quais critérios relativos à avaliação das capacidades técnicas dos mesmos.

       Directiva 2004/18

9. Nos termos do décimo considerando da Directiva 2004/18:

«Um contrato só será considerado um contrato de empreitada de obras públicas se o seu objecto cobrir especificamente a execução das actividades previstas no anexo I, mesmo que o contrato abranja a prestação de outros serviços necessários à execução dessas actividades. Os contratos públicos de serviços, inclusive no domínio dos serviços de gestão de propriedades, podem, em determinadas circunstâncias, incluir obras. No entanto, se essas obras tiverem carácter acessório em relação ao objecto principal do contrato e forem uma consequência ou um complemento do mesmo, o facto de estarem incluídas no contrato não justifica a sua classificação como contrato de empreitada de obras públicas.»

10. O artigo 1.° da Directiva 2004/18 dispõe:

«1. Para efeitos do disposto na presente directiva, aplicam‑se as definições dos n.os 2 a 15.

2. a) ‘Contratos públicos' são contratos a título oneroso, celebrados por escrito entre um ou mais operadores económicos e uma ou mais entidades adjudicantes, que têm por objecto a execução de obras, o fornecimento de produtos ou a prestação de serviços na acepção da presente directiva.

b) ‘Contratos de empreitada de obras públicas' são contratos públicos que têm por objecto quer a execução, quer conjuntamente a concepção e a execução, quer ainda a realização, por qualquer meio, de trabalhos relacionados com uma das actividades na acepção do anexo I ou de uma obra que satisfaça as necessidades especificadas pela entidade adjudicante. Por ‘obra' entende‑se o resultado de um conjunto de trabalhos de construção ou de engenharia civil destinado a desempenhar, por si só, uma função económica ou técnica.

[...]

d) ‘Contratos públicos de serviços' são contratos públicos que não sejam contratos de empreitada de obras públicas ou contratos públicos de fornecimento, relativos à prestação de serviços mencionados no anexo II.

[...]

3. ‘Concessão de obras públicas' é um contrato com as mesmas características que um contrato de empreitada de obras públicas, com excepção de que a contrapartida das obras a efectuar consiste quer unicamente no direito de exploração da obra, quer nesse direito acompanhado de um pagamento.

4. ‘Concessão de serviços' é um contrato com as mesmas características que um contrato público de serviços, com excepção de que a contrapartida dos serviços a prestar consiste quer unicamente no direito de exploração do serviço, quer nesse direito acompanhado de um pagamento.

[...]»

11. O artigo 2.° da Directiva 2004/18 impõe às entidades adjudicantes o respeito dos princípios da não discriminação, da igualdade de tratamento e da transparência.

12. O artigo 6.° da Directiva 2004/18 estabelece a proibição de divulgar as informações que os operadores económicos comunicam às entidades adjudicantes a título confidencial.

13. O artigo 17.° da Directiva 2004/18 dispõe que, «[s]em prejuízo da aplicação do disposto no artigo 3.°, a presente directiva não é aplicável às concessões de serviços definidas no n.° 4 do artigo 1.°».

14. O artigo 24.° da Directiva 2004/18 prevê as regras aplicáveis à apresentação de variantes pelos proponentes, quando o critério de adjudicação for o da proposta economicamente mais vantajosa.

15. O artigo 53.° da Directiva 2004/18 enuncia os critérios de adjudicação dos contratos e impõe à entidade adjudicante o dever de especificar, quando a adjudicação é feita à proposta economicamente mais vantajosa, a ponderação relativa que atribui a cada um dos critérios escolhidos.

16. O anexo II‑A da Directiva 2004/18 refere, nomeadamente, na categoria 12, os «[s]erviços de arquitectura; serviços de engenharia e serviços de engenharia integrados; serviços de planeamento urbano e de arquitectura paisagística; serviços afins de consultoria científica e técnica ; serviços técnicos de ensaio e de análise».

       Legislação da Comunidade Autónoma de Valência

       Os PAI

17. A LRAU e a LUV prevêem dois regimes de execução do planeamento urbano, a saber, a actuação isolada, no caso de uma única parcela de terreno, que implica a sua edificação, e a actuação integrada, que visa a urbanização conjunta de duas ou mais parcelas em conformidade com um programa único que transforma as referidas parcelas em terrenos aptos para construção (artigo 6.°, n.os 2 e 3, da LRAU, e artigos 14.° e 15.° da LUV).

18. O PAI é o instrumento de ordenamento que regula a execução de uma actuação integrada [artigo 12.°, G, da LRAU e artigo 39.°, alínea a), da LUV]. Tem por objecto determinar o âmbito da actuação integrada e as obras que devem ser executadas, fixar os prazos aplicáveis, estabelecer as condições técnicas e económicas que regem a respectiva gestão, regulamentar os compromissos e as obrigações do agente urbanístico (a seguir «urbanista»), definindo as suas relações com os proprietários em causa e com a Administração, e determinar as garantias destinadas a assegurar o cumprimento das ditas obrigações e as sanções aplicáveis (artigo 29.°, n.° 2, da LRAU e artigo 117.°, n.° 1, da LUV).

19. Em especial, os PAI devem prever disposições específicas para atingir os objectivos indispensáveis seguintes: a urbanização do conjunto dos terrenos; a ligação e integração dos terrenos em causa às redes de infra‑estruturas, de energia, de comunicações e de serviços públicos existentes; a obtenção, a favor da Administração e a título gratuito, de terrenos destinados aos serviços públicos; a obtenção, a favor da Administração e a título gratuito, do direito de construir legalmente aplicável, destinado ao património predial público; a gestão da transformação jurídica dos terrenos em causa e a realização da repartição equitativa dos custos e benefícios pelos interessados (artigo 30.° da LRAU e artigo 124.° da LUV).

20. Enquanto a implementação das actuações isoladas pode ser pública ou privada, a de um PAI é sempre pública, podendo a Administração decidir se a gestão deste será directa ou indirecta (artigo 7.°, n.os 1 e 2, da LRAU e artigo 117.°, n.° 4, da LUV). A gestão é directa quando o conjunto das obras e dos investimentos é financiado por fundos públicos e gerido pela Administração, pelos seus organismos, entidades ou empresas públicas (artigo 7.°, n.° 2, da LRAU e artigo 117.°, n.° 4, da LUV), sem poder auferir lucro comercial (artigo 128.°, n.° 4, da LUV). Em contrapartida, no caso de gestão indirecta, a Administração delega a qualidade de urbanista num particular, que pode ou não ser proprietário dos terrenos, seleccionado de acordo com um procedimento de concurso público (artigo 7.°, n.° 2, da LRAU e artigo 117.°, n.° 4, da LUV).

       Gestão indirecta

21. No âmbito da gestão indirecta dos PAI, o urbanista é o agente público encarregado do desenvolvimento e da execução das acções de urbanização identificadas no PAI, as quais incluem, em qualquer caso, a redacção dos documentos técnicos estabelecidos nas bases, a proposta e a gestão do correspondente processo de reagrupamento de parcelas assim como o recurso ao construtor encarregado da execução do projecto de ordenamento, nos casos e de acordo com os requisitos previstos na lei. O urbanista deve financiar o custo dos investimentos, das obras, das instalações e das compensações necessárias à execução do programa, que deverá ser garantido de modo e segundo proporções suficientes, podendo o referido custo ser repercutido na propriedade dos terrenos para construção, quer por compensação em terrenos urbanizados, quer por retribuição pecuniária por parte dos proprietários dos terrenos urbanizados resultantes da actuação integrada (artigo 29.°, n.° 9, A, da LRAU e artigos 119.° e 162.°, n.° 1, da LUV). Os referidos custos incluem, designadamente, os custos das obras de urbanização e o lucro comercial do urbanista, limitado, no quadro da LUV, a 10% dos custos de urbanização (artigo 67.°, n.° 1, da LRAU e artigo 168.° da LUV).

22. Os proprietários afectados pela actuação integrada podem nela colaborar, disponibilizando o seu terreno não urbanizado e recebendo, em contrapartida, parcelas urbanizadas. Podem, em especial, participar proporcionalmente nos custos de urbanização, cedendo parte dos seus terrenos ao urbanista, ou pagar em dinheiro, como retribuição do urbanista, a sua quota‑parte dos custos de urbanização (artigo 29.°, n.° 9, B, da LRAU e artigo 162.°, n.° 2, da LUV).

23. Os proprietários que se recusem expressamente a cooperar podem requerer a expropriação com base no valor inicial dos terrenos (artigo 29.°, n.° 9, C, da LRAU e artigo 162.°, n.° 3, da LUV).

24. A Administração actua oficiosamente ou a pedido do urbanista, no uso dos seus poderes públicos, como a expropriação ou o reagrupamento forçado de parcelas, quando estes são necessários para executar o PAI (artigos 29.°, n.° 10, 66.° e 68.° da LRAU e artigos 162.°, n.° 3, e 169.° da LUV).

       Procedimento de adjudicação e de aprovação

       ─ LRAU

25. Nos termos do artigo 44.° da LRAU, o procedimento pode ser aberto por iniciativa de uma entidade pública ou de um particular, quer estes sejam ou não proprietários dos terrenos a urbanizar.

26. Por força do artigo 45.°, n.° 1, da LRAU, qualquer particular pode solicitar à Administração que submeta a informação pública uma proposta técnica de PAI que deve conter uma cópia da cédula de urbanização expedida pela Administração competente ou do seu pedido visando as condições mínimas de conexão e de integração da proposta de actuação integrada, bem como o anteprojecto de urbanização com as descrições das obras de urbanização a realizar.

27. Nos termos do artigo 45.°, n.° 2, da LRAU, a Administração pode indeferir este pedido ou submetê‑lo a opinião pública, eventualmente, com observações ou alternativas.

28. O artigo 46.° da LRAU dispõe que a publicação da proposta de PAI elaborada por um particular ou, em caso de iniciativa pública, pela Administração competente, é efectuada num jornal de informação genérica e no Jornal Oficial da Comunidade Autónoma de Valência. De acordo com a mesma disposição, na fase de informação pública, são admitidas observações ou propostas técnicas. No termo desta fase de informação pública, os proponentes podem apresentar propostas jurídicas e financeiras. As observações e as propostas técnicas são apresentadas, em carta aberta, no prazo de 20 dias a contar da publicação da proposta de PAI, e as propostas jurídicas e financeiras, em carta fechada, nos cinco dias após o termo do prazo já referido, prazo prorrogável por 20 dias.

29. O artigo 46.°, n.° 2, da LRAU indica os documentos que fazem parte, por um lado, da proposta técnica, a saber, designadamente, a descrição das obras de urbanização e, por outro, da proposta jurídica e financeira que deve incluir as regras detalhadas relativas às relações entre o urbanista e os proprietários, os eventuais acordos já existentes com estes, uma estimativa, ainda que preliminar e aproximativa, dos custos das obras de urbanização e a retribuição do urbanista, com a indicação dos índices de correcção relativamente à estimativa dos custos das obras de urbanização.

30. Nos termos do artigo 47.° da LRAU, a Administração pode rejeitar todas as propostas e, eventualmente, decidir gerir directamente o PAI, ou aprovar o PAI, definindo o seu conteúdo mediante selecção de uma proposta técnica e de uma proposta jurídica e financeira de entre as apresentadas, introduzindo‑lhes as alterações parciais que considerar oportunas. Concomitantemente, a Administração pode atribuir o PAI ao proponente que tiver apresentado a proposta jurídica e financeira relativa à proposta técnica mais adequada. Esta adjudicação é feita de acordo com os critérios de adjudicação aí mencionados, entre os quais as garantias ou as possibilidades de colaboração dos proprietários em causa, para facilitar ou assegurar a execução da actuação integrada.

31. A Administração e o urbanista assinam um acordo urbanístico que inclui, nos termos do artigo 32.°, alínea c), da LRAU, os seus compromissos respectivos, os prazos e as garantias apresentadas pelo urbanista, bem como as sanções previstas no caso de não cumprimento, por este, das suas obrigações.

32. O artigo 48.° da LRAU prevê um procedimento simplificado por iniciativa de um particular.

33. Por força do artigo 67.°, n.° 3, da LRAU, os custos inicialmente previstos no PAI podem ser reavaliados no momento da aprovação do projecto de urbanização, por razões objectivas não previsíveis pelo urbanista.

       ─ LUV

34. Nos termos do artigo 130.° da LUV, o processo de adjudicação e de aprovação de um PAI pode ser desencadeado por iniciativa de uma colectividade pública ou de um particular, quer estes sejam ou não proprietários dos terrenos.

35. Por força do artigo 130.°, n.° 2, da LUV, os particulares podem fazer acompanhar o seu pedido de um documento de planificação que especifique o ordenamento detalhado ou estrutural cujo desenvolvimento é proposto e dos documentos previstos no artigo 131.°, n.° 2, alíneas a) a e), da LUV.

36. Nos termos do artigo 130.°, n.° 3, da LUV, a Administração pode indeferir o pedido do particular, dar início ao procedimento de gestão indirecta, ou decidir recorrer à gestão directa.

37. Nos termos do artigo 130.°, n.° 5, da LUV, o silêncio da Administração significa aceitação, quando a proposta apresentada pelo primeiro proponente implicar a execução de directivas de ordenamento estrutural em vigor e a Administração não responder ao pedido no prazo de três meses.

38. Nos termos do artigo 131.°, n.° 2, da LUV, a decisão de dar início ao procedimento de gestão indirecta de um PAI aprovará também as especificações particulares que regem o processo de adjudicação do PAI. Estas devem indicar se são ou não admitidas variantes, definir os aspectos para os quais os proponentes podem apresentar variantes e fixar as condições mínimas que estas devem preencher.

39. Nos termos do artigo 132.°, n.os 2 e 4, da LUV, o concurso público de adjudicação do PAI deve ser publicado, pelo menos, no Jornal Oficial da União Europeia e no Jornal Oficial da Comunidade Autónoma de Valência, independentemente do valor estimado do PAI.

40. Nos termos do artigo 133.° da LUV, as propostas apresentadas pelos proponentes incluem os documentos relativos às capacidades exigidas, à proposta técnica e à proposta jurídica e financeira.

41. Os critérios de avaliação da capacidade técnica e profissional dos proponentes são enunciados no artigo 123.° da LUV.

42. O conteúdo da proposta técnica é especificado no artigo 126.° da LUV.

43. O conteúdo da proposta jurídica e financeira é, por seu turno, especificado no artigo 127.° da LUV, por força do qual aquela deve conter os termos que regem as relações do urbanista com os proprietários em causa e, em especial, as modalidades da sua retribuição assim como informações suficientes que permitam aos proprietários conhecer as consequências económicas que para eles implica a proposta em causa. A proposta jurídica e financeira deve estabelecer, em especial, os custos previsíveis de urbanização, o lucro do urbanista e o coeficiente de troca aplicável no caso de pagamento através de terrenos.

44. O artigo 135.°, n.° 3, da LUV enuncia os critérios de adjudicação do PAI que devem ser avaliados no caso da proposta técnica.

45. O artigo 135.°, n.° 4, da LUV enuncia os critérios de adjudicação do PAI que devem ser avaliados no caso da proposta jurídica e financeira, designadamente o montante dos custos de urbanização e a proporção mínima de terrenos de construção ou direitos de edificação postos à disposição do urbanista por reagrupamento forçado, ou a proporção máxima de terrenos próprios ou dos associados que devem ser afectados ao cumprimento das obrigações especiais de edificação que decorrem da aprovação do PAI.

46. O artigo 137.° da LUV contém as disposições aplicáveis à adjudicação e à aprovação do PAI. Por força do artigo 137.°, n.° 5, da LUV, quando o PAI altera o ordenamento estrutural, a aprovação pela Administração está condicionada à autorização definitiva do governo regional.

47. O artigo 138.° da LUV exige que o contrato com o urbanista seja formalizado num documento administrativo, no mês seguinte à data de adjudicação do contrato. Este artigo enumera os elementos que dele devem constar.

48. Por força do artigo 143.°, n.° 4, alínea d), da LUV, em caso de rescisão do contrato com o urbanista, a Administração pode pedir aos proponentes que apresentaram propostas jurídicas e financeiras relativas à proposta técnica seleccionada que continuem a execução do programa e, subsidiariamente, abrir um concurso com base na proposta técnica seleccionada no termo do primeiro concurso.

49. Por força do artigo 155.°, n.os 6 e 7, da LUV, a Administração pode introduzir alterações ao projecto de urbanização que consta da proposta seleccionada quando da adjudicação de um PAI, se as alterações assim introduzidas representarem um aumento que não ultrapasse 20% do custo das obras de urbanização.

50. Nos termos do artigo 168.°, n.° 3, da LUV, o montante máximo dos custos de urbanização não pode ser aumentado, salvo em caso de reavaliação destes, a qual não pode implicar um aumento da parte dos custos de urbanização correspondente ao lucro do urbanista.

51. No tocante à execução das obras de urbanização, a LUV exige que esta seja confiada a um construtor escolhido pelo urbanista no quadro de um concurso público, de acordo com as regras de adjudicação dos contratos públicos. Nem o urbanista em causa nem empresas ligadas a este podem participar no referido concurso público.

52. Por força da primeira disposição transitória da LUV, os PAI iniciados antes da entrada em vigor desta, a saber, 1 de Fevereiro de 2006, são regidos pela LRAU, desde que, antes dessa data, tenham sido objecto de aprovação municipal ou desde que tenha expirado o prazo máximo para tomar uma decisão expressa sobre tal aprovação.

       Procedimento pré‑contencioso e acção da Comissão

53. Na sequência de queixas, a Comissão dirigiu ao Reino de Espanha, em 21 de Março de 2005, uma notificação para cumprir, referindo que várias disposições da LRAU relativas à adjudicação dos PAI eram, no seu entender, contrárias às Directivas 93/37 e 92/50. O Reino de Espanha respondeu a esta notificação, por ofício de 31 de Março de 2005, alegando que a adjudicação dos PAI não constituía um contrato abrangido por estas directivas. Referia‑se, além disso, ao projecto de adopção da LUV, que tinha também dado lugar a contactos e a uma troca de correspondência entre o Reino de Espanha e a Comissão.

54. Não tendo ficado satisfeita com as explicações prestadas pelo Reino de Espanha e considerando que a adjudicação dos PAI, em aplicação da LRAU, constituía um incumprimento das ditas directivas, a Comissão, em 15 de Dezembro de 2005, emitiu um parecer fundamentado, convidando este Estado‑Membro a dar‑lhe cumprimento no prazo de três semanas, a terminar a 6 de Janeiro de 2006.

55. Na sua resposta ao parecer fundamentado, com data de 26 de Janeiro de 2006, o Reino de Espanha referiu a adopção da LUV que revogou a LRAU e cuja entrada em vigor estava prevista para 1 de Fevereiro de 2006. Na sequência de correspondência trocada com a Comissão, este Estado‑Membro, por ofício de 7 de Março de 2006, formulou observações complementares.

56. Dado que persistia a alegada infracção e que tinha terminado o prazo estabelecido para a transposição da Directiva 2004/18, a Comissão enviou ao Reino de Espanha, em 10 de Abril de 2006, uma notificação para cumprir complementar, à qual este Estado‑Membro respondeu por ofício de 7 de Julho de 2006.

57. Considerando que, por um lado, a LUV e, por outro, a adjudicação dos PAI, em conformidade com a LRAU, entre 21 de Março de 2005 e 31 de Janeiro de 2006, constituíam uma violação, designadamente, da Directiva 2004/18, a Comissão emitiu um parecer fundamentado complementar, com data de 12 de Outubro de 2006.

58. Tendo o Reino de Espanha mantido a sua posição na resposta de 11 de Janeiro de 2007 ao parecer fundamentado complementar, a Comissão intentou a presente acção, na qual pede ao Tribunal de Justiça que declare que o Reino de Espanha:

─ ao adjudicar os PAI em aplicação da LRAU, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 1.°, 6.°, n.° 6, 11.°, 12.° e 24.° a 29.° da Directiva 93/37, e
─ ao adjudicar os PAI em aplicação da LUV, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 2.°, 6.°, 24.°, 30.°, 31.°, n.° 4, alínea a), e 53.° da Directiva 2004/18.

       Quanto ao pedido de reabertura da fase oral do processo

59. Por ofício de 22 de Novembro de 2010, a Comissão pediu a reabertura da fase oral do processo, alegando, no essencial, que a questão da participação financeira da Administração competente, analisada pelo advogado‑geral nas suas conclusões, constitui um elemento essencial do litígio e requer esclarecimentos complementares.

60. A este respeito, importa lembrar que o Tribunal de Justiça pode, oficiosamente ou sob proposta do advogado‑geral, ou ainda a pedido das partes, ordenar a reabertura da fase oral do processo, em conformidade com o disposto no artigo 61.° do seu Regulamento de Processo, se considerar que não está suficientemente esclarecido ou que a causa deve ser decidida com base num argumento que não foi debatido entre as partes (v., designadamente, acórdão de 8 de Setembro de 2009, Liga Portuguesa de Futebol Profissional e Bwin International, C‑42/07, Colect., p. I‑7633, n.° 31 e jurisprudência referida).

61. Em contrapartida, o Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e o seu Regulamento de Processo não prevêem a possibilidade de as partes apresentarem observações em resposta às conclusões apresentadas pelo advogado‑geral (v. acórdão Liga Portuguesa de Futebol Profissional e Bwin International, já referido, n.° 32).

62. O Tribunal de Justiça, ouvido o advogado‑geral, considera dispor, no presente caso, de todos os elementos necessários para decidir o litígio que lhe foi submetido e entende que o mesmo não deve ser examinado à luz de argumentos que não foram debatidos perante si. Por conseguinte, não há que ordenar a reabertura da fase oral do processo.

       Quanto à acção

       Quanto à admissibilidade

63. O Reino de Espanha suscita a questão prévia da admissibilidade parcial da acção, no que se refere à violação da Directiva 93/37 pela LRAU. A este propósito, o Reino de Espanha considera criticável que o primeiro parecer fundamentado tenha podido exigir que a LRAU fosse adaptada à Directiva 93/37, em vez de se referir à Directiva 2004/18, cujo prazo de transposição para o direito interno estava prestes a terminar.

64. No entender do Reino de Espanha, a LRAU deixou de ser aplicada desde a entrada em vigor da LUV, e a Comissão não demonstrou a aprovação de um número importante de PAI em conformidade com a LRAU, no decurso do período de vacatio legis da LUV. Além disso, o Reino de Espanha considera que, no caso de a legislação nacional e a comunitária terem sido revogadas, como sucedeu no caso presente, mais de dois anos antes da propositura da acção, deixa de haver interesse na prossecução da acção.

65. A este respeito, importa realçar que é à luz da legislação em vigor a 6 de Janeiro de 2006, data do termo do prazo fixado no primeiro parecer fundamentado de 15 de Dezembro de 2005, que importa apreciar a eventual existência do alegado incumprimento. Ora, é de notar que, nessa data, estavam em vigor tanto a LRAU como a Directiva 93/37.

66. Quanto ao momento escolhido pela Comissão para agir contra o Reino de Espanha, há que recordar que compete à Comissão, no quadro do cumprimento da missão que lhe foi confiada pelo artigo 211.° CE, velar pela aplicação das disposições do Tratado e verificar se os Estados‑Membros agiram em conformidade com elas. Se considerar que um Estado‑Membro não as cumpriu, compete‑lhe apreciar a oportunidade da propositura de uma acção contra este Estado, determinar as disposições que este violou e escolher o momento em que dá início ao procedimento por incumprimento contra esse Estado, pelo que as considerações que determinam essa escolha não podem afectar a admissibilidade da acção (v. acórdãos de 18 de Junho de 1998, Comissão/Itália, C‑35/96, Colect., p. I‑3851, n.° 27; de 8 de Dezembro de 2005, Comissão/Luxemburgo, C‑33/04, Colect., p. I‑10629, n.° 66; e de 19 de Maio de 2009, Comissão/Itália, C‑531/06, Colect., p. I‑4103, n.° 23).

67. Tendo em conta o que precede, há que julgar improcedente a questão prévia de admissibilidade invocada pelo Reino de Espanha.

       Quanto ao mérito

       Argumentos das partes

68. A Comissão entende que vários aspectos do procedimento de adjudicação e de aprovação dos PAI em gestão indirecta, previsto pela LRAU e pela LUV, são contrários, respectivamente, aos artigos 1.°, 6.°, n.° 6, 11.°, 12.° e 24.° a 29.° da Directiva 93/37 e aos artigos 2.°, 6.°, 24.°, 30.°, 31.°, n.° 4, alínea a), e 53.° da Directiva 2004/18.

69. A Comissão sustenta que a relação existente entre a Administração e o urbanista constitui, em conformidade com as Directivas 93/37 e 2004/18, um contrato público cujo objecto principal, como resulta da descrição de uma actuação integrada, é a execução de obras públicas de infra‑estruturas e de urbanização.

70. O facto de a execução física destas obras, no quadro da LUV, dever ser confiada por um urbanista a um construtor em nada altera a qualificação do contrato como contrato de empreitada, na medida em que é o urbanista que se compromete perante a Administração a realizá‑las.

71. Quanto ao carácter oneroso da adjudicação e da aprovação dos PAI, a Comissão observa que a LRAU e a LUV implementam um sistema no qual existe um contrato sinalagmático entre o urbanista e a municipalidade, em virtude do qual a contrapartida desta está em relação directa com a execução das obras públicas e a prestação de determinados serviços conexos. Por outro lado, o urbanista recebe dos proprietários dos terrenos um montante em dinheiro ou o seu equivalente em terrenos.

72. No entender da Comissão, o carácter oneroso do contrato manifesta‑se na decisão da Administração de aprovar o PAI e de seleccionar o urbanista, bem como no exercício das suas prerrogativas públicas para garantir o cumprimento das disposições do PAI aprovado.

73. A Comissão acrescenta que, quando a Administração decide gerir directamente o PAI, é ela própria que deve realizar os projectos e desembolsar os montantes necessários para as obras. Neste caso, suporta custos que repercute a seguir nos proprietários, de modo que, quando opta pela gestão indirecta, a Administração nada mais desembolsa, mas também não recebe mais nada. A Comissão conclui que, ao optar pela gestão indirecta, a Administração deixa efectivamente de receber determinadas receitas, e o facto de também não suportar determinadas despesas em nada atenua esta afirmação.

74. Por fim, a Comissão salienta, como resulta, designadamente, dos acórdãos de 12 de Julho de 2001, Ordine degli Architetti e o. (C‑399/98, Colect., p. I‑5409, n.os 77 e 84), e de 18 de Janeiro de 2007, Auroux e o. (C‑220/05, Colect., p. I‑385, n.os 45 e 57), que os pagamentos feitos por terceiros são reveladores de carácter oneroso.

75. Na réplica, a Comissão observa que o Tribunal Supremo deu uma interpretação diametralmente oposta à sustentada no caso presente pelo Reino de Espanha e que se aproxima, no essencial, da análise da Comissão.

76. O Reino de Espanha sustenta, por seu turno, que a relação existente entre a Administração e o urbanista não constitui, face ao modo de remuneração deste, um contrato de empreitada de obras públicas, mas uma concessão de serviço público não abrangida pelo âmbito de aplicação das Directivas 93/37 e 2004/18, e que, por conseguinte, a adjudicação dos PAI está sujeita aos princípios do direito primário da União.

77. De acordo com este Estado‑Membro, a Comissão confunde o PAI com o projecto de obras de urbanização, quando a execução das obras públicas não constitui o objecto exclusivo, nem sequer fundamental, do PAI. A aprovação do PAI, por meio da adjudicação, implica também o financiamento e a gestão do reagrupamento bem como a atribuição das obras de urbanização a prestadores de serviços. O urbanista é também o responsável financeiro pela execução das obras e está encarregado de efectuar as diligências administrativas necessárias para garantir a gratuidade das operações para a Administração e a repartição justa dos custos e dos lucros com elas relacionados pelos proprietários.

78. O Reino de Espanha alega também que não existe uma relação onerosa a cargo da Administração, na medida em que a remuneração do urbanista provém exclusivamente dos proprietários.

79. Antes de mais, a obrigação do proprietário de financiar os custos da urbanização e, portanto, de remunerar o urbanista não tem origem numa decisão unilateral da Administração, mas decorre da sua decisão, voluntária, de participar no reagrupamento e de poder assim dispor de novos terrenos aptos para construção.

80. Além disso, a LRAU e a LUV não prevêem nenhuma garantia de pagamento a cargo dos fundos públicos da qual se pudesse depreender a existência de um contrato oneroso entre a Administração e o urbanista, o qual é responsável perante esta mesmo no caso de incumprimento, por parte do construtor ou dos proprietários, das suas obrigações respectivas.

81. Por fim, a opção pela gestão indirecta, em detrimento da gestão directa, não implica uma contrapartida maior do que o exercício pela Administração das suas prerrogativas públicas para efeitos do reagrupamento ou da expropriação.

82. À luz destas considerações, o Reino de Espanha sustenta que o urbanista não deve ser qualificado de «adjudicatário» de um contrato stricto sensu, mas de «concessionário», dado que a sua remuneração depende da exploração no mercado dos terrenos para construção, e não de um preço fixo garantido pela Administração. Em especial, apresenta as características de um concessionário de serviços, constituindo a gestão económica do reagrupamento a função mais pertinente do ponto de vista económico.

83. Por outro lado, o Reino de Espanha alega que a tese da Comissão é contrária ao efeito útil das Directivas 93/37 e 2004/18.

       Apreciação do Tribunal de Justiça

84. A título preliminar, é de salientar que a presente acção incide unicamente sobre a adjudicação de contratos de urbanização em conformidade com as legislações adoptadas sucessivamente pela Comunidade Autónoma de Valência com base nas suas competências regionais em matéria de urbanismo, de ocupação dos solos e de ordenamento do território.

85. Em particular, a Comissão censura ao Reino de Espanha a adjudicação dos PAI, isto é, as actuações integradas que têm por objecto a urbanização conjunta de várias parcelas em conformidade com uma programação única que transforma as mesmas em terrenos aptos para construção, em aplicação, por um lado, da LRAU e, por outro, da LUV, em violação, respectivamente, das Directivas 93/37 e 2004/18.

86. As censuras formuladas pela Comissão incidem apenas sobre o procedimento de adjudicação dos PAI em gestão indirecta, que, em conformidade com a legislação em causa, implica a delegação num particular, pela entidade adjudicante competente, da qualidade de urbanista, seleccionado de acordo com um procedimento de concurso público, quer este seja ou não proprietário dos terrenos em causa.

87. A este respeito, a Comissão sustenta que os contratos de urbanização em causa devem ser qualificados de «empreitadas de obras públicas» e devem, a este título, respeitar as exigências fixadas pela Directiva 93/37 e, seguidamente, pela Directiva 2004/18. Tal resulta, no tocante às alegações formuladas contra a LRAU, do fundamento jurídico da acção restrito à violação unicamente da Directiva 93/37 e, no tocante às alegações formuladas contra a LUV, do parecer fundamentado complementar, como a Comissão salientou na sua petição e confirmou na audiência.

88. No respeitante ao conceito de «contratos de empreitada de obras públicas», na acepção do artigo 1.°, alínea a), da Directiva 93/37 e do artigo 1.°, n.° 2, alínea b), da Directiva 2004/18, há que observar que este visa os contratos a título oneroso, celebrados por escrito entre, por um lado, um ou vários operadores económicos e, por outro, uma ou várias entidades adjudicantes e que têm por objecto quer a execução, quer, conjuntamente, a execução e a concepção de trabalhos relativos a uma das actividades visadas no anexo II da Directiva 93/37 e no anexo I da Directiva 2004/18 ou de uma obra definida no artigo 1.°, alínea c), da Directiva 93/37 e no artigo 1.°, n.° 2, alínea b), da Directiva 2004/18, quer a realização, seja por que meio for, de uma obra que satisfaça as necessidades especificadas pela entidade adjudicante.

89. Por outro lado, resulta do décimo sexto considerando da Directiva 92/50 e do décimo considerando da Directiva 2004/18, lidos em conjugação, respectivamente, com o artigo 1.°, alínea a), da Directiva 93/37 e o artigo 1.°, n.° 2, alínea b), da Directiva 2004/18, que um contrato só pode ser considerado um «contrato de empreitada de obras públicas» se o seu objecto corresponder à definição dada no número anterior e que os trabalhos que são acessórios e não constituem o objecto do contrato não podem justificar a classificação deste como contrato de empreitada de obras públicas.

90. Além disso, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, quando um contrato contenha simultaneamente elementos de um contrato de empreitada de obras públicas e elementos de outro tipo de contrato público, é o objecto principal do contrato que determina qual a directiva da União relativa a contratos públicos que é em princípio aplicável (v., neste sentido, acórdão Auroux e o., já referido, n.° 37).

91. Essa determinação deve ocorrer atendendo às obrigações essenciais que prevalecem e que, como tais, caracterizam esse contrato, por oposição às que revestem apenas um carácter acessório ou complementar e que são impostas pelo próprio objecto do contrato (acórdão de 21 de Fevereiro de 2008, Comissão/Itália, C‑412/04, Colect., p. I‑619, n.° 49).

92. No caso presente, deve observar‑se que a Comissão se limita a invocar o argumento de que os contratos de urbanização controvertidos devem ser qualificados de «contratos de empreitada de obras públicas», uma vez que o objecto principal do PAI é, na acepção do artigo 1.°, alínea c), da Directiva 93/37 e do artigo 1.°, n.° 2, alínea b), da Directiva 2004/18, uma «obra» de urbanização de duas ou mais parcelas, tendo em vista a realização de um acesso rodoviário por via pavimentada, da distribuição de água potável e de electricidade, da evacuação de águas residuais das sarjetas nos rebordos dos passeios e de uma rede de iluminação pública. A este propósito, salienta que os serviços fornecidos pelo urbanista, como a redacção dos documentos técnicos, a elaboração e a gestão do projecto de loteamento ou ainda, ao abrigo da LUV, a selecção do construtor que realizará os trabalhos, são instrumentais e acessórios.

93. Importa também observar que o Reino de Espanha rejeita a apreciação da Comissão, de acordo com a qual o PAI deve ser qualificado de «obra» na acepção das Directivas 93/37 e 2004/18, e afirma que a execução de tal obra não constitui o seu objectivo exclusivo, nem sequer fundamental. A esse propósito, este Estado‑Membro alega que o urbanista é também o responsável financeiro pela execução das obras e está igualmente encarregado de efectuar as diligências necessárias para garantir a gratuidade das operações para a Administração, bem como a repartição justa dos respectivos custos e dos lucros imobiliários correlativos pelos proprietários dos terrenos para construção que as financiam. Além disso, o referido Estado‑Membro sustenta que os contratos em causa devem ser qualificados de «concessões de serviços» na acepção do artigo 1.°, n.° 4, da Directiva 2004/18.

94. Ora, de acordo com jurisprudência assente, no âmbito de uma acção por incumprimento nos termos do artigo 226.° CE, incumbe à Comissão demonstrar a existência do incumprimento alegado, fornecendo ao Tribunal de Justiça os elementos necessários para que este verifique a existência desse incumprimento, não podendo basear‑se numa qualquer presunção (acórdão de 27 de Janeiro de 2011, Comissão/Luxemburgo, C‑490/09, Colect., p. I‑0000, n.° 49 e jurisprudência referida).

95. A este propósito, relativamente à natureza das actividades a cargo do urbanista, importa constatar que, não obstante os elementos de análise fornecidos pelo Reino de Espanha, a Comissão não procurou fundamentar as suas próprias alegações e refutar as do Estado‑Membro demandado, mediante um exame minucioso desses elementos.

96. Com efeito, não está de modo algum demonstrado que as obras de ligação e de integração dos terrenos em causa nas redes de infra‑estruturas, energia, comunicações e serviços públicos existentes constituem o objecto principal do contrato celebrado entre a colectividade e o urbanista no quadro de um PAI em gestão indirecta. Com efeito, a realização do PAI pelo urbanista abrange, como resulta designadamente dos n.os 21 e 23 do presente acórdão, actividades que não podem ser qualificadas de «obras» na acepção das directivas invocadas pela Comissão na sua petição, a saber, a elaboração do plano de desenvolvimento, a proposta e a gestão do projecto de reagrupamento correspondente, a obtenção, a favor da Administração e a título gratuito, dos terrenos destinados ao domínio público e ao património predial público da colectividade, a gestão da transformação jurídica dos terrenos em causa ou ainda a realização da repartição equitativa dos custos e dos lucros pelos interessados, bem como as operações de financiamento e de garantia do custo dos investimentos, das obras, das instalações e das compensações necessárias à execução do PAI. Também assim é quando o urbanista, como está especificado no artigo 119.°, n.° 1, da LUV, deve organizar o concurso público destinado a designar o construtor a quem é confiada a realização das obras de urbanização.

97. Por outro lado, deve observar‑se que determinadas actividades que estão compreendidas nos PAI, quer no âmbito de aplicação da LRAU quer da LUV, como as enunciadas no número anterior, parecem corresponder, pela sua natureza, às actividades visadas na categoria 12 do anexo I‑A da Directiva 92/50 e do anexo II‑A da Directiva 2004/18, relativas aos serviços mencionados, respectivamente, no artigo 1.°, alínea a), da Directiva 92/50 e no artigo 1.°, n.° 2, alínea d), da Directiva 2004/18.

98. Daqui resulta que a Comissão não provou que o objecto principal do contrato celebrado entre a municipalidade e o urbanista se enquadra nos contratos de empreitadas de obras públicas na acepção da Directiva 93/37 ou da Directiva 2004/18, o que constitui um requisito prévio para a declaração do alegado incumprimento.

99. Do que precede resulta que improcede o pedido da Comissão.

       Quanto às despesas

100. Nos termos do artigo 69.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo o Reino de Espanha pedido a condenação da Comissão e tendo esta sido vencida, há que a condenar nas despesas.

       Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) decide:

       1) A acção é julgada improcedente.

       2) A Comissão Europeia é condenada nas despesas.

 

Assinaturas

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(*) Língua do processo: espanhol.